Capítulo 9

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Flórida

Convento St. Augustine, 1761

A noite foi longa e perturbada para as duas garotas, especialmente para Ava que não parou de se remexer na cama a noite inteira, graças aos pesadelos que a perseguiam há semanas.

Ava acordou um pouco assustada com um movimento abrupto em cima da cama. No momento em que seus olhos se abriram, avistou Emilly encolhida no canto da cama, assustada. Os fios de cabelo, antes bem arrumados, estavam desgrenhados e seu rosto parecia cansado e sonolento, como se não tivesse dormido nada.

- Emilly, você está bem?

A jovem Phillips permaneceu em silêncio, encarando um espaço vazio do quarto, alheia ao que a amiga falava. Ava então sentou-se, temendo que algo tivesse acontecido com Emilly, que não a respondia e parecia nem ouvi-la.

Receosa, levou sua mão ao ombro da loira que assustou-se com o toque gélido. Os olhos azuis da mulher mais pareciam dois oceanos banhados por lágrimas, pequenas gotas de água salgada que desciam pelo seu rosto delicado.

- Emilly, o que aconteceu?

Mais uma vez Ava ficou sem resposta. Estava preocupada, jamais vira sua amiga assim; Emilly sempre foi feliz e a mais espirituosa entre as duas. Ava não sabia o que fazer, como agir em uma situação como aquela.

Olhou para os lados, viu aquela coberta sobre os cacos de vidro no chão, recordando-se da noite passada e o motivo de terem dormido juntas. Só então descobriu a causa do comportamento estranho de Emilly;

- Está assim por que dormimos juntas?

O silêncio reinou sobre elas, podendo-se ouvir apenas o cantar dos pássaros que acabavam de acordar para mais um dia. Quando se preparou para falar mais uma vez, Emilly apressou-se em enxugar as lágrimas e, vendo que a amiga ia sair da cama, Ava afastou-se um pouco dando-lhe espaço.

Algo estava muito errado, isso estava claro como os raios de sol que começavam a despontar no horizonte ainda distante, mas Ava se recusava a forçar Emilly a falar algo que a incomodava.

A jovem de olhos azuis encharcados, agora prendia o cabelo loiro que descia até o ombro - obra do pai raivoso - e preparava-se para sair do quarto o mais rápido que conseguisse. Vendo isso, Ava logo ficou de pé, tomando cuidado para não se machucar no vidro quebrado, e correu até a porta antes que Emilly pudesse alcançar.

- Me deixa sair, por favor, Ava.

O tom de voz de Emilly soou rouco e um pouco choroso, mas continha uma certa autoridade que surpreendeu Ava. Mas não o suficiente para ceder passagem para a outra.

- Está louca?! E se alguém te vir saindo do meu dormitório a essa hora e falar para a madre?

Emilly pareceu pensar um pouco, assentindo logo em seguida. Não seria idiota para sair agora, tendo em vista que havia gente já circulando pelo convento. Era uma obrigação as freiras acordarem antes do nascer do sol para que assim pudessem ter momentos de comunhão com Deus.

Ava queria saber o que estava acontecendo, mas permaneceu quieta enquanto Emilly voltava a sentar na cama. Os segundos que pareciam intermináveis viraram minutos longos e silenciosos, como uma névoa espessa que as impossibilitava de terem uma conversa decente.

De repente, uma batida alta na porta fez Ava quase pular no lugar com o susto. Por um momento ela acreditou que a pessoa que as assustou na noite anterior tinha voltado, mas então a voz da Irmã Tereza soou doce e calma do outro lado da porta:

- Senhorita Feyler, querida, acorde! Temos muito o que fazer hoje.

Nenhuma das duas respondeu a mulher e logo seus passos seguiram para além do corredor. Alguns segundo depois outra batida na porta, mas dessa vez no quarto vazio de Emilly:

Filha Do MalOnde histórias criam vida. Descubra agora