Está frio, de uma manhã quente e fresca fomos jogados em uma noite fria e de ventania. Aqueço minhas mãos nas axilas, tão focada na estrada de pedras encolhida pelas casas que acabo me distraindo do meu corpo sendo congelado pelo tempo. Ele esfrega as mãos ao meu lado, sinto sua respiração se desdobrar em um vapor úmido, estamos quase grudados, mas isso não parece estar ajudando tanto.
— Faça assim — murmuro, insinuando com meus braços. — As axilas se mantém quentes, é o melhor a se fazer caso você não queira perder seus dedos.
Ele acena, logo imitando minha técnica. Passamos as últimas horas desvendando um plano para invadir o palácio, citei ideias loucas para cacete, discutimos e chegamos num final que não nos causássemos tantos problemas. Ele aceitou, contudo, não podemos ir longe demais – mortes e fugas fora de questão.
Não há como passar dos portões, guardas nos deteriam em pouco tempo, e a chance de acabarmos em estacas e mortos seria enorme. E se fossemos como eles? E se fossemos nobres? Bem vestidos e exaustos depois de uma longa viagem noturna, brutalmente atacados e implorando por ajuda nos portões do palácio? Duvido que neguem, é a chance perfeita de invasão.
— Está demorando...
Continuo em silêncio. A esta hora todos estão dormindo, um ou outro cão late nas redondezas, o breu é levemente iluminado com pontos de luz das lamparinas espalhadas nas paredes e sacadas. Subimos num terraço de uma carpintaria, ficamos escondidos esperando o anoitecer. Demos sorte, coincidentemente as entradas da Capital foram trancadas temporariamente por causa do acidente mais cedo no Festival, suspeitaram de novas ocorrências na tentativa de atrapalhar a apresentação dos Herdeiros Dourados. Restou apenas uma ao bloco norte, onde Melissa atravessará exatamente a meia-noite em sua carroça ao palácio, e estaremos a esperando ansiosamente. As asas de Uzuli batem abafadas e ele sai em meio a escuridão, eles chegaram, logo ouvimos o estralar das rodas da carruagem e trotes de um cavalo nas pedras. Me ergo tentando uma visão melhor do momento, o som se aproxima ecoando ao longo da estrada solitária.
— É agora? — Okali sussurra.
Não eu murmuro. Só há uma chance, uma chance que não podemos perder por nada. Faço-o se manter atrás de mim, antes que coloquemos o plano em ação. O som se torna mais alto e conseguimos enxergar a carruagem bronzeada na esquina, o tempo parece mais lento cada vez que ouço os trotes do cavalo branco. Tão calmo que noto o vapor fugindo da minha respiração. Clac! Uma pedrinha choca contra o teto da carruagem, logo outra e mais outra, a última capta a atenção do cavalo, que volta o trajeto. Eu e ele ficamos em transe, não mexemos um músculo sequer.
De repente, uma chuva delas bate com força no teto marcando buracos fundos, o cavalo empina assustado e assistimos o pequeno homem descer furioso checando o céu escuro. Ele segura o próprio chapéu enquanto procura o barulho estranho, aceno para Okali e descemos do terraço. Nos esgueiramos entre as sombras das casas silenciosas, torneamos a carruagem sem que sejamos vistos, me mantenho escondida na traseira e Okali rapidamente sobe no teto. Ele se ergue com suas asas inteiramente abertas para o pigmeu que tropeça assustado no chão, ele tenta um grito reprimido quando o puxo para trás. Calma, calma... Murmuro, puxando meu saco de moedas e cuidadosamente enfiando entre as mãos dele, fecho seus dedos e tento passar um recado sutil — Fique com isso, corra para longe e não pense em abrir a boca para ninguém. Se eu souber, tenha certeza que voltarei para você.
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𝐾𝐻𝐴𝐿𝑌𝐴 O Jogo Das Três Rainhas✅️
Fantastik- Você é uma garota estranha, e eu gostaria de te virar do aveso - ele sussurra no meu ouvido, tão perto que sinto sua pele queimar. Meus nervos crescem quando o sinto roçar os lábios no meu pescoço. Não posso fazer isso, não pretendo enterrar meu...