VINTE E CINCO

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Precipitei-me subitamente na madrugada, quando Pedro entrou cambaleando e esbarrando nos móveis do quarto, antes de cair na cama com roupa e tudo. Um odor pungente de perfume adocicado floral, misturado a suor e bebida alcoólica invadiu minhas narinas, o que tirou um pouco o meu sono. Aparentemente, ele não passou o dia todo trabalhando, como era de se imaginar. Nas poucas horas em que estive na presença dele, percebi uma alma livre, aquela energia de quem ama uma agitação, lembrando-me um pouco o Guilherme antes de começarmos a namorar.

Odeio fazer essas comparações entre os dois, mas, de certa forma, eles se parecem.

Toda essa situação dificultosa para o meu sono forçou meu cérebro a recordar uma memória: certa noite, Guilherme retornou para casa visivelmente embriagado, deixando-me perplexo com sua conduta negligente e descontrolada. Enquanto eu estava na sala, testemunhei seu comportamento agressivo, caracterizado por palavreado de baixo calão e uma postura quase primal. Em um momento de desespero, ele se lançou em minha direção, desabando em lágrimas enquanto desabafava sobre uma decepção amorosa que o dilacerava por dentro. O desabafo foi acompanhado por um choro copioso, externando como nunca antes a força da dor emocional que enfrentava dentro de si. Madruguei com ele em meu colo, roncando mais que um trator, e entendi a fragilidade das pessoas; inclusive, as que aparentemente parecem mais fortes são as mais machucadas. Guilherme sempre foi uma rocha, pouquíssimas vezes o vi se entregando ao choro ou desabando, mas hoje enxergo que ele simplesmente internalizou todas as suas mágoas sem demonstrar seu lado mais frágil.

Toda essa postura de reprimir a dor, na verdade, é como acender uma bomba-relógio dentro das pessoas, e Guilherme finalmente explodiu naquele dia. Especialmente para os homens, essa pressão pode ser ainda mais opressiva devido ao machismo arraigado na sociedade, que insiste que homens não devem chorar nem demonstrar fraqueza. "Homens não sentem dor, homens não compartilham suas mágoas ou desconfortos." Gradualmente, essa cultura de suprimir emoções e rotular o que é ou não aceitável sentir ou expressar corroeu o bem-estar psicológico de uma geração inteira. Guilherme é um exemplo disso, mas, felizmente, ao longo do tempo, ele começou a se abrir mais comigo, percebendo que não há vergonha alguma em derramar lágrimas, e que é até mais saudável chorar do que descontar tudo em atos raivosos.

Então, fico me perguntando se Pedro também passa por esses mesmos problemas e começo a me dar conta de que simplesmente estou pensando em outros problemas para esquecer o dia tenso que tive. Essa meditação faz com que eu feche os olhos brevemente e, quando os abro, vejo Pedro se arrumando novamente com uma feição cansada. Um bocejo escapa de sua boca antes de ele notar meu olhar atento:

— E aí, Tiagão! — chuta de leve meu braço, arrancando um riso sonolento de mim. — Acorda ai, mano, que a gente vai dar uma volta, conhecer umas pessoas... Quero que conheça a minha "mina".

— Como consegue estar tão animado de manhã depois de ter bebido todas, Pedro? — bocejei e me sentei no colchão, usando toda a minha força de vontade.

Meu caderno está lá na mesa de cabeceira, meio esquecido, mas agora parece o momento certo para dar uma olhada nele. Levanto pensando em escovar os dentes e, quem sabe, tomar um banho antes de começar a estudar.

É o que eu faço.

Saio do banheiro, ainda secando o cabelo, e me preparo para pegar o caderno, quando, de repente, Pedro surge e arranca o caderno da minha mão, jogando-o em cima do guarda-roupa dele. Fico ali, meio chocado, pensando em como vou conseguir pegar meu caderno de volta, já que sou mais baixo que ele e não há nenhuma cadeira por perto para me ajudar. Pergunto em um fio de voz:

— Por que fez isso...?

Pedro cruzou os braços, parando ao meu lado, ostentando um sorriso de criança arteira prestes a fazer alguma coisa errada. Segurou meu ombro, dando um apertão amigável, antes de dizer:

Amor Entre Ondas - Histórias Baianas • Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora