13 - O canto da sereia

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Na tarde seguinte, James e Mise lutavam para carregar o último engradado de cerveja da distribuidora até o porta-malas do Chevette

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Na tarde seguinte, James e Mise lutavam para carregar o último engradado de cerveja da distribuidora até o porta-malas do Chevette.

Por conta da diferença de altura, o pastor tinha que fazer o dobro de esforço para que as garrafas não tombassem para seu lado, enquanto a pirata tentava inutilmente se abaixar para encontrarem um meio termo. 

Quando finalmente colocaram o engradado no carro, Mise limpou as mãos na calça e elogiou:

— Bom trabalho, pastorzinho. Se for excomungado, já tem um emprego de estivador garantido.

— Obrigado, mas eu não faço ideia do que um estivador faz. — Ele riu pelo nariz, fechando o porta-malas.

— São funcionários dos portos. — A pirata explicou, usando James como para-vento ao acender um cigarro. — Eles carregam e descarregam as mercadorias dos navios. 

Achando graça do comentário, ele enxugou o suor da testa e se apoiou na lataria quente ao lado da pirata, esperando o carro arejar. 

Naquele instante, com os pulmões cheios de fumaça aromática e a pele começando a arder por conta do sol, James se sentiu vivo pela primeira vez em tempos. 

Previa que sua alegria efêmera seria massacrada pela culpa assim que ficasse sozinho,  e por isso se angustiava com o retorno à igreja.

Artemísia também não tinha pressa em voltar. Aceitara a tarefa de comprar cerveja estrategicamente para não ter que ajudar as tias com os preparativos da festa de Miguel, e além disso, precisava admitir que sentiu falta da companhia, e principalmente das risadas, do pastor. 

Não sabia ao certo o que acontecera com ele na última semana, mas a verdade é que odiava vê-lo daquela forma, isolado e constantemente à beira das lágrimas. Mesmo sem entender o que o afligia, aparentemente distraí-lo estava sendo efetivo. 

Por esse motivo, no instante em que viu o sorriso dele vacilar, Artemísia se colocou em movimento. Atirando a bituca no asfalto, ela deu a volta no veículo e abriu a porta do passageiro.

— Lado errado. — James avisou, divertido, e provocou: — Bebeu algumas garrafas do terceiro engradado? Achei ele bem mais leve do que os outros.

Mise soltou uma gargalhada, afirmando:

— Não importa o quão bêbados estejam, piratas nunca confundem bordo e estibordo. — Ela se sentou e flexionou as pernas, apoiando as botas no porta-luvas. — Hoje você fica no comando, pastorzinho.

— O quê? — James perguntou pela janela do motorista, apavorado. — Eu vou bater seu carro!

— Arr, isso não vai ser um problema em alto mar.— Ela brincou pela janela, insistindo: — Assuma o timão, pastorzinho, ou a tempestade vai nos alcançar. 

Sem saber se aquilo era uma metáfora ou não, James olhou por cima do ombro. Os morros que circundavam Mondaí realmente estavam embaçados por uma cortina diáfana de chuva, e a brisa, repentinamente fria, roubava o calor de sua pele.

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