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Mel
Permaneci sentada no sofá, as duas senhoras estavam de pé sobre mim, a sensação delas era que qualquer movimento que eu fizesse iria desconcertar e cair no chão de novo. Naquele momento o ódio dominou meu corpo, ódio de mim, ódio dele e de tudo

Ódio de mim por ter acreditado que desta vez seria diferente, como acreditei que seria nas outras dezenas de vezes. Ódio de mim por ter me envolvido com o tráfico por ele. Ódio em ter sido criada por um viúvo alcoólico. Ódio em ter passado pela minha cabeça que minha vida voltaria a ser como antes

Ódio dele por ter encostado em mim. Ódio dele por ter me humilhado de todas as formas mis baixas possíveis. Ódio dele de ter dito que sou uma vergonha para a pessoa mais importante que já passou pela minha vida, minha mãe, meu anjo

Minha vontade era ir pra bem longe, onde ele não pudesse encostar um dedo em mim. E esse lugar existia;

Lá em cima.

Levantei e senti uma pontada em minha barriga, o chute. Levantei minha blusa tentando não encostar em minha pele, me debrucei e um grande hematoma já estava formado, assim como aquele em meu olho

- Misericórdia - uma das senhoras suplicou e desmaiou nos braços da outra

- Onde vai filha - ela abanava a senhora com as mãos

- Não posso ficar aqui - pressionei os lábios e fui em direção a porta

- Deus todo poderoso proteja essa menina de todos os males da rua - ela estendeu uma das mãos em minha direção

Ao passar pela porta fui norteada de olhares, desde crianças a idosos de cadeira de rodas. Virei o rosto e segui reto

Subi o morro com a mão pressionando a barriga, que doía. Dessa vez não haviam os vigias de fuzil e muitos bares estavam fechados. Cruzei umas esquinas, queria ir longe, o mais longe possível. Avistei um bar, vazio

Ao entrar um sino tocou acima de minha cabeça, me apoiei no balcão e um senhor de cabelos castanhos, com um pano de prato sobre o ombro me examinou, balançando a cabeça negativamente

- Uma gelada - ele rapidamente abriu uma pra mim, sentei com dificuldade em uma das inúmeras mesas do estabelecimento

Comecei a beber, queria que a dor passasse e meus pensamentos fossem embora. Quanto mais pensava, mais eu bebia. Estava na terceira garrafa, mas a dor continuava e os pensamentos pareciam se multiplicar

O sino tocou novamente, não deu tempo nem de levantar a cabeça, dois homens, de mais ou menos uns trinta anos se apoiaram nas cadeiras ao meu lado
De imediato um arrepio tomou conta de meu corpo, e uma sensação ruim também, algo dizendo que eu precisava sair de lá

- Pode sentar aí contigo? - olhei em volta, as inúmeras mesas, e olhei pra frente, sem saber o que dizer ou fazer. Os dois me encaravam com um sorriso medonho

- Claro. Senta aí - senti uma pontada, mas não na barriga, no peito

- Opa - eles se sentaram, cada um de um lado meu, me fechando

- Acham que rola de da um teco aqui - falei na tentativa dos dois acharem que era viciada

- Demoro - eles riram se entreolhando

- Vambora. Só chegar lá - um deles se levantou e pegou uma carreira com o velho

Os dois começaram a cheirar enquanto me olhavam, tentava ao máximo parecer que estava entrosada, mas o medo já tinha tomado conta de mim

- Vamo lá pra casa? - o homem da direita esfregou as mãos, olhando a todo tempo pro da esquerda

- Não posso, meu pai deve estar preocupado comigo

- Perigoso ir embora essa hora em. Daqui a pouco tá amanhecendo e tu vai mais tranquila

- Não - senti minha respiração pesar. Um deles pôs uma arma na mesa disfarçadamente

- Sabe como anda a violência né - o outro a ajeitou, a apontando pra mim

- Perigoso. Bora lá - eles começaram a girar a arma na mão - a gente aproveita e faz uma festinha nós três

- Eu só vou ao banheiro antes - respirei fundo e agarrei minha bolsa

Sentei rapidamente na privada e tentei ligar pra Maria Luiza, eram quatro da manhã
Liguei cinco vezes, cinco vezes caixa postal
"Não deixa recado, eu não escuto"

- Malu, malu eu fiz uma besteira, olha eu to aqui em cima, com uns caras muito estranhos, uns caras que eu nunca vi na vida Malu. Por favor me tira daqui, por favor

Abaixei a cabeça e comecei a chorar, de novo
Me encontrei sem saída, limpei as lágrimas e sentei com eles novamente

AMANTESOnde histórias criam vida. Descubra agora