01, floricultura

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LUANA NARRANDO

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LUANA NARRANDO

Essa é a primeira vez em São Paulo que eu duro mais de cinco dias em um emprego, e, para ser sincera, estou surpresa.

A forma de conviver e conversar com as pessoas aqui é bem diferente da roça em que cresci. Muitas vezes estou falando do jeito normal e as pessoas acham que estou sendo grossa.

Talvez o ritmo acelerado da cidade grande tenha um impacto nisso, mas estou tentando me adaptar. Até agora, tenho me dado bem nesse lugar.

Atualmente, estou trabalhando numa floricultura perto de um centro de vendas em Guarulhos.

O trabalho é tranquilo, e gosto de passar as horas entre flores, mesmo que o movimento nem sempre seja grande.

— Bom dia! — vejo minha colega de trabalho, Manuella, passar pela porta da loja. — Nossa, peguei um trânsito do caralho para chegar aqui.

— Imagino, hoje o dia está agitado — digo, sem tirar a atenção do desenho que estou fazendo no meu caderno.

— Já atendeu alguém hoje?

— Ninguém. Não existe amor em São Paulo, ninguém mais é romântico e compra flores — digo em tom de piada, arrancando risos de Manuella, que vem até o balcão e se senta ao meu lado.

— Aff, sua negatividade trouxe um cliente — a loira revira os olhos e aponta com a cabeça para a janela. Olho e vejo um garoto de cabelos grandes e cacheados vindo em direção à loja. — E você que vai atender.

Solto um suspiro, deixando o caderno de lado e me levantando para recepcionar o garoto.

— Bom dia! Como posso ajudá-lo?

— Bom dia, moça! — ele diz sorrindo, olhando ao redor da loja, como se estivesse encantado. — Queria fazer uma surpresa para minha mãe e dar flores para ela.

— Hm, você tem alguma preferência?

— Não, e é para isso que eu preciso da sua ajuda. Você tem alguma para me recomendar?

— Olha, tenho várias, mas gosto bastante de girassol — digo, andando até a prateleira com alguns buquês, e ele me segue. — Não tenho tanta certeza, mas minha avó sempre dizia que o girassol reflete felicidade, energia e lealdade.

— Caramba, gostei! Vou comprar um girassol, então! — ele diz, olhando para mim com um sorriso sincero. — Qual desses buquês você acha mais bonito?

— Eu acho todos lindos, escolhe um você — respondo, observando as opções que temos à frente.

— Eu não sou mulher, né? Aí preciso de uma opinião feminina — diz, me fazendo rir. — Qual você mais gostaria de receber?

— Ah, então esse aqui — aponto para um dos buquês.

— Pode pá, vou levar esse — diz sorrindo, e sua animação é contagiante.

Pego o buquê com cuidado e dou a volta no balcão.

— Vai querer mais alguma coisa? — pergunto, vendo que ele segura um cartão na mão, então presumo que será a forma de pagamento. — Débito ou crédito?

— Crédito — responde, e começo a mexer na máquina para processar o pagamento.

— Nossa, que desenho bonito! Foi você que fez? — o garoto diz, focado na página do meu caderno, e eu desvio o olhar da máquina por um momento.

— Foi sim — respondo, sorrindo e voltando minha atenção ao pagamento.

— Caramba, você é muito talentosa!

— Obrigada! — agradeço, entregando a máquina para ele fazer o pagamento e ajustando alguns detalhes do buquê que haviam se soltado.

— Pronto — ele diz, retirando o cartão, e eu entrego o buquê cuidadosamente em suas mãos. — Obrigado pela ajuda!

— 'Magina, tenha um bom dia.

— Você também! — ele responde em tom alto, saindo da loja.

Solto uma risada baixa enquanto me sento de volta na cadeira e retomo meu desenho.

— Nunca vi você sorrir tanto atendendo alguém — Manuella diz, saindo do fundo da loja, e eu sorrio.

— Ai, ele era tão bonitinho... Acho que estou apaixonada — encosto minha cabeça no balcão, e Manuella me dá um tapa de leve no braço.

— Apaixonada... — ela ri. — Você é emocionada, isso sim — diz, e nós duas rimos juntas.

Algumas horas depois, a loja está tranquila novamente. Mas, ao contrário de antes, meu humor desabou. Acabei de atender uma cliente que fez questão de me humilhar. Segurei as lágrimas até ela sair da loja, mas agora não consigo mais.

Viro de costas, pegando minha bolsa e guardando todos os meus pertences que estavam espalhados.

— O que você está fazendo? — Manuella me olha confusa, e eu a encaro, deixando as lágrimas finalmente caírem.

— Eu acabei de ser humilhada. Não vou ficar mais aqui.

— Você não pode sair mais cedo, a Vanessa vai me matar.

— Posso sim. Não vou mais voltar, de qualquer forma.

— Luana, como você vai viver assim em São Paulo? Qualquer coisa te afeta!

— Não sei, Manuella, eu realmente não sei — digo, virando-me para ela novamente. — Mas não sou obrigada a ficar nesse inferno de lugar, até porque não é a primeira vez que isso acontece.

— Tá bom... Quando chegar em casa, me manda mensagem — ela faz um toque de mão comigo, e eu concordo, saindo do local.

Enquanto caminho pelas ruas movimentadas de Guarulhos, sinto um misto de alívio e tristeza. São Paulo é um lugar desafiador, e às vezes sinto que não pertenço a ele.

Mas, mesmo que tenha momentos como esse, onde o peso da cidade parece demais para suportar, sei que há também pequenas alegrias, como o sorriso sincero de um garoto comprando flores para a mãe. Talvez, um dia, eu encontre o meu lugar aqui.

O NOSSO AMOR A GENTE INVENTA, Barreto mcOnde histórias criam vida. Descubra agora