Trinta e seis

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Maraisa
7 meses depois
15 de Novembro de 2007

Já faz 9 meses desde que descobri que estava grávida. Parece que foi em outra vida. Hoje é dia 15 de novembro, e tudo ao meu redor parece um reflexo embaçado do que um dia eu imaginei. As coisas entre mim e Marília, que começaram como uma tempestade de paixão, agora se transformaram em um silêncio que grita. Nos últimos três meses, tenho visto a distância crescer entre nós, e não há nada que eu possa fazer para evitar.

Marília se afasta cada vez mais, e nossos diálogos, antes carregados de carinho, agora são discussões veladas, silêncios desconfortáveis. Não é que o amor tenha acabado de uma vez, mas ele se perdeu em algum lugar entre as fraldas, as noites mal dormidas e as expectativas não atendidas. Já não reconheço mais o brilho nos olhos dela quando me olha, e talvez ela também já não encontre o mesmo em mim.

Hoje, eu finalmente tomei coragem para enfrentar a verdade que venho adiando por tanto tempo. Com o coração apertado, preparei tudo. Eu precisava fazer isso por mim, por ela, e principalmente pelas meninas.

— Marília, precisamos conversar.- disse, tentando manter a voz firme enquanto ela olhava para mim com aquela expressão cansada.

Ela não precisou de muitas palavras para entender. No fundo, nós duas sabíamos que esse momento chegaria. Comecei a falar sobre como as coisas mudaram, como não éramos mais as mesmas, e como nossos caminhos pareciam se desencontrar a cada dia. Marília ouvia em silêncio, os olhos fixos em mim, mas não havia mais lágrimas, nem gritos. Só uma aceitação amarga.

— Eu acho que precisamos seguir em frente, cada uma de um jeito. E... sobre as meninas... Amanda é tão apegada a mim quanto Natália é a você.- minha voz quase falhou nesse momento. — Acho que seria melhor se cada uma de nós ficasse com uma delas, pelo menos por enquanto.

Ela concordou. Não sei se foi alívio ou dor o que vi em seus olhos, mas sei que essa decisão era o que precisávamos. Amanda, minha pequena Amanda, ficará comigo. Ela sempre foi mais colada em mim, e talvez essa separação seja menos dolorosa assim. Natália ficará com Marília, e sei que ela a amará como sempre fez.

Nós duas nos separamos hoje, não como inimigas, mas como duas pessoas que entenderam que a vida tomou rumos diferentes. E agora, enquanto embalo Amanda para dormir, sinto um vazio, mas também um peso sendo tirado de cima de mim.

Se foi a decisão certa? Só o tempo dirá. Mas hoje, sinto que não havia outro caminho a seguir.

A noite caiu sobre a casa como um cobertor pesado. Amanda dorme tranquila em meus braços, sem saber das mudanças que aconteceram hoje. Olho para o rostinho dela, tão sereno, e me pergunto como vou explicar tudo isso quando ela for mais velha. Como vou contar que, em um momento, decidi que o melhor para ela e para a irmã era que cada uma ficasse com uma das mães? E que, mesmo amando-as profundamente, eu e Marília não conseguimos nos manter unidas?

Depois que Marília saiu com Natália, o silêncio na casa ficou quase insuportável. Cada canto, cada móvel, parece guardar um pedaço do que éramos, lembranças que não sei se quero manter ou esquecer de vez. As pequenas risadas de Natália, os passos de Marília indo e vindo pelo corredor... tudo isso agora faz parte de um passado que, por mais recente que seja, já parece distante.

Amanda se mexe em meu colo, e eu a coloco com cuidado no berço. Fico ali por um tempo, olhando para ela, sentindo uma mistura de alívio e tristeza. Sei que fizemos o que era necessário, mas não consigo evitar a sensação de perda. Perdi Marília, mas mais do que isso, sinto que perdi uma parte de mim, uma parte que acreditava em finais felizes, apesar de tudo.

Caminho até a sala, onde as coisas de Marília já não estão mais. Ela foi rápida em tirar suas coisas, em deixar o espaço que antes era nosso. Me sinto sozinha, mas ao mesmo tempo, mais leve. Foi uma decisão difícil, mas era a única que fazia sentido. Eu precisava pensar em Amanda e em mim, e Marília em Natália e em si mesma.

o que uma mentira pode fazer?Onde histórias criam vida. Descubra agora