o que uma mentira pode fazer?

Linha de chegada 🏁

Maraisa

Estou dirigindo, mas é como se minhas mãos estivessem agindo por conta própria. O volante treme sob meus dedos, e eu sinto a tensão acumulada no meu corpo. Cada quilômetro que percorremos parece me trazer mais perto de algo que eu não sei como enfrentar. Natália. Minha filha. Minha pequena, que eu não vejo há tanto tempo.

Olho pelo retrovisor e vejo Amanda dormindo, a cabecinha caída de lado na cadeirinha, os cachos pretos se mexendo levemente com os solavancos do carro. Ela dorme tranquila, completamente alheia ao que está por vir. Eu me pergunto se ela vai entender. Como vou explicar que ela tem uma irmã gêmea que ficou longe dela todo esse tempo? Como vai ser quando Natália finalmente a ver? Será que vão se reconhecer?

A cada pensamento, sinto meu peito apertar mais. Bato a mão no volante de novo, um gesto nervoso que não consigo controlar. O som seco me faz perceber o quanto estou tensa, mas não consigo relaxar. Eu não sei o que esperar desse reencontro. Natália... Será que ela vai se lembrar de mim? Ou sou apenas uma sombra distante no passado dela?

Do meu lado, Maiara está inquieta. Ela treme as pernas sem parar, um reflexo claro da ansiedade que também a consome. De vez em quando, ela olha para mim, mas não diz nada. Eu sei que ela está pensando em Dulce, a namorada que vai encontrar daqui a pouco. Mas também sinto que ela está preocupada comigo. Minha irmã sempre me entende, mesmo quando não falo nada.

— Você tá bem? — Maiara pergunta de repente, a voz baixa, quase como se não quisesse me perturbar mais.

— Não sei — admito, batendo os dedos no volante. — Eu só... eu só não sei como vai ser, Maiara. E se ela não me reconhecer? E se... — Minha voz falha, o medo de ser rejeitada por Natália crescendo dentro de mim.

Maiara estende a mão e aperta meu braço, um gesto silencioso de apoio. — Vai dar certo, Maraisa. Vocês são mãe e filha. Isso não muda.

Queria tanto acreditar nela. Mas a realidade é que três anos é uma vida inteira para uma criança. Três anos longe de Natália... e agora? Como vou conseguir ser mãe de novo, depois de tudo?

A estrada parece interminável, e o peso das emoções torna o ar no carro quase sufocante. O aeroporto está logo à frente, mas para mim, é como se o caminho até lá fosse uma eternidade. Cada metro me aproxima de algo desconhecido, de um futuro que eu não sei como enfrentar.

Seguro o volante com força, tentando respirar fundo. O tempo para pensar acabou.

Chegamos ao estacionamento do aeroporto, e tudo parece acontecer em câmera lenta. As luzes frias do terminal contrastam com o calor sufocante da ansiedade no meu peito. Desligo o carro, mas não consigo soltar o volante imediatamente. Meus dedos estão rígidos, presos, como se o simples ato de sair do carro fosse um passo para um destino que eu não estou pronta para enfrentar.

Amanda, ainda sonolenta, murmura alguma coisa e se aninha no meu colo quando a pego da cadeirinha. Seus braços pequeninos me envolvem de forma automática, a cabeça pesada descansando contra meu peito. O cheiro dela, de xampu infantil e pele limpa, deveria me acalmar, mas só aumenta o nó na minha garganta. Ela está tão tranquila, tão inocente, e eu carrego essa tempestade dentro de mim.

Maiara, ao meu lado, está igualmente exausta. Ela não diz nada, mas se aproxima e deita a cabeça no meu ombro, respirando fundo. Sinto o peso dela, e é reconfortante de uma maneira estranha. A presença dela me lembra que não estou sozinha nessa, mesmo que o que me espera com Natália pareça um fardo tão pessoal, tão meu.

— Vai dar certo, Maraisa — ela murmura de novo, quase como um mantra. Mas desta vez, sua voz é mais suave, sem a força que ela tenta colocar nas palavras. Eu sei que ela também está nervosa. Não tanto quanto eu, claro, mas o suficiente para buscar conforto do meu lado.