Capítulo 8 - O Lado Vazio do Sofá (Rodrigo Alarcon)

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Eu sabia que isso eventualmente aconteceria. Ela não ficaria solteira para sempre. Ela encontraria o amor novamente. Eu não sei porquê estou surpreso. Ele não é um idiota. Seja lá o que ele fez a ela ou ela a ele, sabia que poderia ser resolvido. O amor resolve tudo, não é? Pena que só não resolveu para nós. Olhando para essa xícara de café fria, eu lembro da música cantada no jantar. De tantas músicas cantadas nessa noite, entre a peça há alguns dias e o jantar, essa música do café é a única presente nesse momento. Propício, já que agora estou aqui sozinho, com uma xícara fria de café pela metade e a outra à espera do líquido quente que seria bebido por um certo alguém. Igual a música.

Mesmo sabendo que ela não vem, eu estou aqui. Mesmo sabendo que ela está com ele, eu estou aqui. Mesmo se passando dias desde aquele fatídico dia em que fui obrigado a pôr um ponto final mais definitivo em nossa história. O que eu estou esperando? Por que eu corro atrás? O que eu tenho a dizer a ela? O que adiantaria ela vir aqui, se eu não sei o que dizer a ela? Sem machucá-la com a minha amargura de saber que ela está seguindo um passo enorme para longe de mim. Eu nem tenho esse direito.

Não fui eu quem deu o primeiro passo?


***


Pouco tempo depois a peça terminou, ela exibia o mais lindo sorriso que tinha, mas esse sorriso dela para ele fez o meu sequer aparecer. A plateia aplaudiu de pé, afinal a peça era muito bonita, mesmo para mim que entendo pouquíssimo. Ela foi chamada para ir ao palco e se dirigia junto com seus colegas, não sem antes olhar para cima e piscar para onde ele estava. Mas não sei se ele viu, ele estava vindo a seu encontro.

A essa altura o sorriso que permanecia já não era tanto para ele. Ela falava do quanto estava feliz com essa peça, com a turnê. Apresentava uma a uma as pessoas envolvidas no projeto e é impossível não admirar essa mulher. Ela deu a palavra ao Sérgio e olhava fixamente para um ponto. Sua respiração mudou, parecia ansiosa, seus olhos se encheram de lágrimas. Um sorriso lindo escapava, mesmo ela tentando prendê-lo, mordendo os lábios. Sérgio parou de falar e todos olharam para ela. Tomei coragem para virar para direção que ela olhava, assim como todos estavam fazendo. E nesse momento eu senti meu coração cair.


***


Afroxo o aperto que dava na caneca sem perceber. Minha mão estava esbranquiçada, mas eu nada sentia. Eu ainda estou nesse estado em que não consigo aceitar. Eu sei que não tenho o que aceitar, afinal, eu dei o ponto final há três anos. A culpa é minha. A culpa é minha se eu não consigo aceitar o fim desse relacionamento e que a saudade seja tão difícil de estancar. Não com ela aqui. Com eles aqui.

Levanto quando vejo no relógio que já passa das três da manhã. Jogo fora o café do meu copo, assim como o da garrafa, antes que eu me afogue novamente nessas xícaras de café. É melhor eu voltar para o quarto e dormir.

Que desperdício de café

Se ela não volta mais

Ouço ao fundo Iolanda me chamar e eu quero ir até ela, mas não consigo. Eu sigo aqui, preso no chão, em frente a eles, mas ninguém me vê. Ela não me vê. Ela sorri, mas não é para mim. Ela anda na minha direção, mas não é para mim. Ela estende a mão, mas não chega na minha. Ela diz "eu te amo", mas não é para meus ouvidos.

– Leal, acorda! – Acordo desnorteado, olhando tudo à minha volta. Foi um pesadelo, só isso. Um pesadelo. – Ei, dorminhoco! Fiquei preocupada. Tudo bem que chegamos tardíssimo ontem, mas não achei que fosse dormir tanto assim.

Tempos Modernos - A VoltaOnde histórias criam vida. Descubra agora