Marilia
Eu ando até a janela do meu escritório e olho para fora, onde uma pequena tenda está montada no jardim lateral. Levo o copo à boca, sorvendo um gole do meu uísque, conferindo a movimentação do buffet que minha avó contratou de última hora. Rio levemente recordando-me da expressão de puro choque em seu rosto quando a visitei hoje pela manhã, convidando-a para a cerimônia no final da tarde. Meus planos eram fazer isso em um cartório mesmo, sem alardes, apenas a Maiara, eu e pronto. Dona Angelica Mendonça fez seu costumeiro show de chantagem emocional e acabei cedendo com a condição de que fosse um jantar íntimo. Os convidados são, minha avó festeira, Chris, Maraisa e a intrometida da Lígia, porque seria deselegante deixá-la de fora, sendo sócia da minha única amiga e advogada da minha empresa.
Não contei nada para minha avó. Ela não entenderia. Basta deixá-la feliz como está desde o momento em que lhe dei a boa nova. Mesmo tendo ficado compreensivelmente desconfiada por eu nunca ter mencionado nada antes, seu desejo pelo primeiro bisneto suplantou tudo o mais. Não apresentei a Maiara ainda. Ela saiu bem cedo para um spa, sugestão da nova personal stylist. Chegou ainda há pouco e está se preparando em seu quarto. Minha avó está coordenando o jantar pessoalmente. Ela sempre adorou organizar um evento. As festas de dona Angelica sempre foram as mais disputadas na sociedade paulistana. Lembro-me de muitos jantares em sua casa quando eu e Chris íamos passar as férias. Era com ela que passávamos as férias, não com nossos pais. Surpresos? Não fiquem, meus pais eram dois fodidos egoístas que nunca deveriam ter tido filhos. Nos víamos muito pouco. Essa foi a razão de eu não derramar uma lágrima sequer quando morreram. Eles eram como desconhecidos para mim. Não tinha porque fingir o contrário.
— Obrigado por não exigir que eu vestisse a porra de um terno, Mari. — a voz jocosa de Chris me faz olhar de lado. Ele está saboreando seu uísque também, olhando a tenda lá fora. Usa uma de suas jaquetas de couro escura. Pelo menos essa é mais social e colocou uma camisa branca por baixo, mesclando sobriedade com sua irreverência. Seu olhar escuro gira para mim e seus olhos estreitam ligeiramente, me analisando. — ainda dá tempo de voltar atrás com essa loucura, irmã.
— Ela não vai voltar atrás. É teimosa demais para isso, Chris. — a voz da Maraisa soa do meu outro lado e eu a olho, bufando.
— Verdade, Mara. — Chris a provoca com o apelido e minha amiga grunhe. — Onde está Lígia? Não estava na interminável lista de convidados? — ironiza. Chris é tão idiota.
Maraisa ri um pouco e toma um gole da sua bebida também.
— Ela preferiu não vir. Está estudando um caso complicado que pegamos nessa semana.
— Ainda bem. — eu digo sem nenhum constrangimento. — Não estou no clima para os comentários ácidos dela.
Chris ri e Maraisa bufa.
— No seu caso, é sinceridade, Marilia. — rosna, defendendo a mulher implicante.
— Que seja. — eu bufo, tomando o último gole e caminhando de volta para a mesa, depositando o copo vazio. — Conseguiu terminar o contrato para a companhia dos gregos? — pergunto, ajustando minha roupa calmamente.
Ouço o bufo de Chris às minhas costas e me viro para encará-los.
— Só você mesmo para estar falando de negócios poucos minutos antes de se casar, Mari. — meu irmão balança a cabeça e vira seu copo.
— Esse casamento não tem nenhuma importância, Chris. — dou de ombros. — Para mim é um contrato como qualquer outro que terei que assinar.
Chris grunhe, andando para perto e deposita seu copo vazio sobre a mesa também.