Bom dia, Alice.

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                       Acordo, meus olhos lutam para conseguir se manter aberto. Se fecham e se abrem, esse processo dura por alguns segundos. Percebo o quarto branco, com um apito constante que incomoda meus ouvidos. O lençol também branco jogado sobre mim, não sentia minhas pernas. Estava repleta de faixas pelos meus braços e tronco, era o que eu conseguia ver.

            Eu me sentia morta, de novo. Falhei com Solene, com meu pai, com minha mãe, e comigo mesma. Mas principalmente com Antony, a criança que despencou em explosão logo à minha frente.

—Ela acordou! - Escuto um grito em comemoração. — Venham ver ela acordou!

As vozes ecoam em meu ouvido, e parecem se difundir ao apito do aparelho ao meu lado.

—Eu estou viva? - Pergunto com dificuldade, quase como gaguejando. Rouca, e com a voz baixa.

—Sim você está. - A voz se aproxima de mim, era um médico. Acariciava meu cabelo, e minha testa.

—Como? - Pergunto.

—Você foi salva, por um milagre. - Mesmo usando máscara consigo perceber seu sorriso pelos seus olhos semicerrados.

Olho a cadeira ao meu lado, em esperança de ver minha mãe. Mas não, a cadeira de visitas está vazia. – Onde ela está? – Pergunto a mim mesma, olhando em volta da sala.

Tento me levantar, ficar sentada. Mas o médico impede antes mesmo que pudesse fazer um mínimo movimento:

—Nem pensar. - Olha diretamente para meus olhos. — Totalmente de repouso. Acabou de acordar de um coma, senhorita.

—Minha mãe... Onde ela está? - Pergunto, tossindo um pouco.

Ele parecia me olhar com pesar, com tristeza, com pena. Olhava profundamente para meus olhos – O que havia acontecido com ela? – Pergunto para mim mesma, curiosa.

—Responda-me. - Mando.

Um outro médico parece se aproximar de mim, abre meu olho com força e aponta uma lanterna para ele. Vejo uma enfermeira puxar meu dedo, e fura-lo com um aparelho.

—Alguém está me ouvindo? - Pergunto, com dificuldade.

Nada, ninguém me responde. O tempo passou, estou com um soro grudado ao meu braço. Olhando para a porta, inquieta. – Será que ela morreu tentando me salvar? – Pergunto a mim mesma, e antes mesmo que pudesse responder, começo a me culpar excessivamente.

—Aqui, este é o quarto. - O médico para em frente a porta, apontando para mim. Parecia estar falando com alguém, apressado.

"É ela! É minha mãe!" Penso. Meus olhos logo se enchem de alegria, esperando que ela passe pela porta. Mas não, passa uma outra mulher, desconhecida. Nunca a tinha visto na vida, mas ainda sim, ela me amava: Por que?

—Eu fico tão feliz que está viva! - Senta ao meu lado.

—Por que? - Pergunto, confusa.

—Não poderia deixar a salvadora dos meus filhos morrer, sem nem sequer agradecê-la. - Seus olhos pareciam cheios de gratidão.

Ela é a mãe de Luís e Yara? Por que viria me visitar? Uma outra mulher entra pela porta, atrás dela, um homem. Seguravam caixas de presentes. Não conhecia nenhum deles.

—Eu gostaria muito de poder te abraçar agora. - A mulher

que acabou de chegar, olha para mim.

"Os pais de Marcos." Penso, tenho a certeza. Deixam os presentes no pé da minha cama, e vejo Luís, Yara e Marcos entrarem pela porta. Yara estava com os braços enfaixados, Marcos segurava um inalador portátil enquanto andava, e Luís com sua perna esquerda enfaixada também. Mas ainda andavam e falavam perfeitamente.

—Vocês... - Meus olhos se enchem de lágrimas novamente.

—Eu agradeço a você, de coração. Alice, conte com nossa família para tudo.

Não conseguia escutar direito o que falavam, só agora percebo que meu ouvido esquerdo não funcionava mais. A explosão me ensurdeceu?

—A quanto tempo estou em coma? - Pergunto.

—Há 2 dias, exatamente. - O homem fala, acariciando o cabelo de Marcos.

—Estavamos aguardando você acordar. - A mãe de Marcos fala.

—Sabem onde minha mãe está? - Pergunto.

—Sim, perguntamos ao médico onde estava sua acompanhante. - A mãe de Luís e Yara me conta. — Parece que ela voltou ao tratamento.

Minha mãe nunca havia seguido o tratamento de câncer, achava inútil e que somente faria perder tempo da vida que poderia aproveitar com outras coisas. Ela até frequentava o hospital, mas não fazia 100% do tratamento. No máximo uns 40%.

—Sério?! - Minha feição demonstra minha felicidade, e por mais que a voz tentasse ter um tom alto, a minha garganta impedia com uma forte queimação.

—Não querendo atrapalhar. - Uma enfermeira permite quase entrar por completo na sala, se encostando na porta. Segurava uma pequena agenda juntamente de uma caneta. — Mas infelizmente o tempo de visita acabou.

—Ah... - A mãe de Marcos parece chateada.

—Muito obrigada, de verdade. - Agradece a mãe de Luís com Yara, e se dá as costas quase como empurrando as crianças para fora da sala juntamente de seu marido.

A mãe de Marcos que ainda está na sala me olha com um sorriso gracioso, e do seu bolso puxa um pequeno chocolate. Deixa em cima do lençol que cobria meu corpo. Com um piscar de olhos duradouro e gracioso, que parecia falar mais do que qualquer fala, ela me dá as costas, e se retira.

Agora sozinha na sala, consigo observar um pouco mais os detalhes. As cortinas, o ar condicionado e uma televisão na parede. Meus olhos se encontram com uma garota, aparenta ter no máximo uns oito anos. Parecia olhar para mim encantada, com um olhar de pura inocência. Ela não possuía nenhum tipo de cabelo, ou sobrancelha. – De alguma forma me fazia lembrar da minha mãe. – Ainda a olho, e acabo soltando um sorriso, quase como um cumprimento.

—Oi. - Ela fala gentilmente, parecia me olhar profundamente. — Eu vi você na televisão. - Parecia animada.

Não consigo impedir uma pequena risada escapar.

—Sério? - Pergunto.

—Sim! - Se anima um pouco mais. — Você é a mulher maravilha né? - Pergunta, se referindo a como me chamam.

—É... Acho que sim. - Encaro o chocolate em cima de mim, o pego. Encaro diretamente a embalagem. — Você quer? - Pergunto.

—Não. - Começo a abrir a embalagem. — Não precisa. - Paro de abrir.

—Eu não perguntei se precisa. - Jogo ele na cama dela, e por incrível que pareça, minha pontaria acerte diretamente o seu lençol. — Perguntei se queria. - A lanço um outro sorriso gentil, ela retribui.

—Muito obrigada! - Parece abrir entusiasmada a embalagem, como se tivesse ganhado ouro puro dentro de uma embalagem de chocolate.

—Qual o seu nome? - Pergunto.

—Cecília.

—O meu é... - Antes que pudesse dizer algo sou cortada pela doce voz da garota.

—Alice. - Parecia estar com o nome na ponta da língua. — Alice Emerson. - Sorri.

—Uau, sinal que estou muito famosa! - Brinco.

Ela solta pequenas risadas e observo uma garota entrar na sala, eram quase a mesma pessoa, mas a garota parecia mais velha

—Como está se sentindo? - Se senta na poltrona ao lado dela. — Trouxe uns livrinhos para lermos antes de te colocar para dormir.

—Oba! - Parecia mais animada. — A mulher maravilha está aqui. - Aponta para mim.

—A mulher maravilha? - Pergunta, se virando para mim. — Entendi. - Se vira para Cecília novamente, não parece ter ido com minha cara.

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