Onze

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A chama se espalha em todas as direções, consumindo o que puder alcançar, levando sua herança para as gerações seguintes


Meu pai?! O príncipe pensava horrorizado, recuando um passo enquanto se recusava a acreditar que seu pai, Héres, portador d'A chama, terceiro de sua linhagem, rei dos libertos e senhor da grande montanha, havia sido infiel. Era a primeira vez, pelo menos que fosse sabido, que um portador d'A chama tinha um bastardo. O rei era para o povo como um exemplo a se seguir, o mais próximo que conseguiam chegar de seus deuses.

— Isto é mentira! Uma traição contra a coroa. — Por mais um instante ele hesitou, esperando uma confirmação por parte de sua mãe, mas logo retomou sua postura arrogante. — Perderá tua cabeça por isto, sua...

— Cala-te, Héres. — Com a voz firme a rainha trouxe novamente o silêncio à sala — Não tomaremos decisão pautada em ira.

— Mas isto é... — Foi calado pelo gesto de sua mão, erguendo a destra ordenando silêncio.

— És jovem, tens muito a aprender antes de quaisquer ordens.

Sob as palavras da mãe o príncipe engoliu o orgulho e escondeu um pouco da raiva que sentia, relaxando o punho que segurava o punho da espada.

Quípor já respirava com mais tranquilidade, demonstrando o quão adaptáveis eram os aríni, mesmo situações complicadas. O rapaz receava o que poderia vir a seguir, mas se esforçava para parecer calmo e atento aos diálogos.

— Sua majestade, se me permite. — Lorde Rígoris avançava um passo em direção ao grupo — Imagino que seja necessário trazer um oráculo. — Havia no rosto do lorde um sorriso sutil.

— Precisamos chegar a tanto? — A fala da rainha veio após um suspiro longo — Achas mesmo que é verdadeiro?

— Posso não ser o mais hábil em muitas áreas, porém, nenhum artefato com tamanho refino escapa dos meus olhos.

Stella observava receosa a rainha caminhar em sua direção, com seu filho se apressando para caminhar pouco atrás, servindo como uma espécie de guarda costas. Era mais alta que a mulher, ainda assim, havia algo a mais nela, algo que não estava curiosa para descobrir. Os olhos esmeralda mapeavam o rosto e os cabelos da jovem, quase como se buscassem alguma falha ou truque barato, embora só tenha percebido ali mais semelhanças com seu marido do que seus próprios filhos carregavam.

— É um belo pingente, quem o deu a você? — Sob o incômodo que sentia, tentou manter a voz mais amena possível. — Pelo que sei, tua terra não é famosa por confecção tão "delicada".

Você não sabe muito da minha terra, então. Stella engoliu em seco e mordeu a boca para impedir a resposta que poderia piorar a situação, cerrou os punhos e se forçou a responder de forma firme e direta. — Não foi feito pelos aríni.

— Ora, então como poderia ter contigo algo tão raro? — Era um esforço interno para a rainha manter uma postura serena com tanto a se pensar, e aos poucos ficava perceptível seu incômodo. — O que busca aqui, criança?

— Foi deixado para mim, só isso, eu não pedi por ele. — Stella buscava algum conforto apertando o pingente entre os dedos. — Meu pai saberá o que fazer.

Ora sua... — O príncipe Héres novamente tentava se manifestar, e novamente era calado pelo gesto de sua mãe, já impaciente.

— Então vens até a minha casa, fruto de uma "aventura" do rei, carregando consigo um insulto à minha família e espera que a recebamos de braços abertos? — As palavras atingiam Stella como u balde de água fria.

Não havia mais respostas, pelo menos a jovem não conseguia pensar em mais nada no momento, sequer conseguia segurar as lágrimas que acumulavam em seus olhos.

— Lorde Rígoris. — O olhar da rainha deixava Stella e se perdia num canto vazio da sala, antes de dar as costas para a jovem e retornar em direção ao trono. — O oráculo.

Após uma mesura pomposa, Rígoris se apressou para fora da sala, sumindo pelos corredores, e as sentinelas novamente surgiram, trazidas pelo simples estalar de dedos da rainha.

O capitão prontamente se curvou, junto de seus soldados.

— Sir. Trevor, acomode nossos... convidados, assegure que serão bem tratados.

— Sua graça. — Com um sinal rápido as sentinelas já haviam se dividido em grupo de três, separando os jovens e os levando pelos corredores labirínticos do palácio.

Alguns criados abriam caminho para o grupo de sentinelas passar, muitas vezes observavam Stella e sussurravam entre si, claramente deduzindo que se tratava de mais uma bastarda, e seria a diversão dos próximos dias descobrir de quem seria. Stella sequer percebia, sua mente se perdia em dúvidas sobre o tal Oráculo, e se seria o bastante para que finalmente a levassem até seu pai, por mais que duvidasse ser bem recebida após a pequena reunião com a rainha.

Quípor, por sua vez, não deixava passar nada, tentava memorizar o caminho que faziam e até mesmo os rostos dos criados, talvez fosse necessário no futuro, e quando após um lance de escadas desembocou num pequeno jardim, o rapaz se surpreendeu. Não era tão grande quanto se imaginaria num palácio, mas extravagante o bastante para deixar de lado outros detalhes.

— Deverão esperar aqui. — Sir. Trevor apontou alguns bancos e mesas de mármore ao centro do jardim com um gesto.

Sem muita opção, ambos os jovens se sentaram, agora acompanhados de apenas uma sentinela, deixada para vigiá-los por ordem do capitão. Jamais se acostumariam com o desconforto de ver as sentinelas desaparecendo num piscar de olhos, como se houvesse alguma cortina invisível que as cobrissem, mas certamente era menos incômodo do que a espera pela qual passariam, sem ideia de quando, ou se, sairiam.

Coroa Sangrenta - Aço e FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora