Capítulo 20

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A dor e vergonha não se insinua, ela consome como um incêndio de cinco alarmes. Foi esse peso que mantinham Anna pressionada contra a cama enquanto as sombras no seu quarto se estendiam com o esmaecimento da luz da hora dourada. A escuridão ajuda, mas não o suficiente para fazer qualquer tipo de diferença.

Depois de Joel ter saído, de ter escutado o clique da porta que ele fechou lentamente atrás dele. A percepção do que realmente estava acontecendo, começou a pesar em sua mente. Como se estivessem jogando pedras em Anna, deixando tudo mais pesado ainda sobre ela. Seu rosto queima, seu coração dispara. Ela sentiu isso, como um membro fantasma pairando sobre ela, uma faca fantasma em formato de amor, apunhalando-a nas costas.

O machado pendurado sobre sua cabeça está sendo segurado por ela e mais ninguém.

Ela fica lá, olhando para o teto, em uma imagem despresível, enquanto as lágrimas rolam pelo seu rosto sem previsão de parada, desconfortável consigo mesma, envergonhada, e se sentindo desprezível, culpada por ter pensado que ao menos uma vez, as coisas saíram diferentes. Ela quase sorri, ao pensar que se seu pai estivesse aqui, neste momento as palavras que ele profeririam seriam as cruéis "eu te avisei".

Ela fica deitada em sua cama até que seja tarde o suficiente para que a casa fique em silêncio, e depois para que as luzes do sol de um novo dia que dançaram sobre o quarto por lugares diferentes conforme o dia passa, sem nem ao menos ter sequer se movido, ainda encolhida na mesma posição da noite passada, até que o quarto estivesse escuro novamente. Então, e somente então, ela se força a se mover. Ela vai até o banheiro e toma banho, dizendo silenciosamente a si mesmo que foi um lapso temporário de julgamento. Foi um episódio psicótico. Foi uma alucinação, não há como ele ter realmente feito isso, realmente pedido isso. Deve ter sido imaginação, mas então ela sente a dor em seu peito, o aperto em seu coração e se amaldiçoa novamente por ter sido tão ingenua, por ter se entregado ao ponto de ter ficado tão vulnerável.

Uma semana se passa e ela quase consegue se convencer de que foi um sonho. Anna faz o seu melhor para lavá-lo dela, lavar todo o encontro, todo o erro, e jura a si mesma nunca mais pensar nisso. Ela se consola com o pensamento de que ele deve se sentir horrível também, certamente. Aterrorizado pela culpa. Mas o diabo em seu ombro, aquela coisa cruel dentro dela riu de sua ingenuidade, praticamente gritando para ela espernear e fazer uma bagunça, porque ele não se sente culpado, ele provavelmente está roncando, seu corpo agradavelmente cansado sem nenhuma preocupação no mundo, enquanto ela mal existiu em dias. Como se, se ela se movesse muito, deixaria pedaços do seu corpo espalhados pela casa, porque ela estava se sentindo despedaçada.

Anna conseguiu evitar qualquer interação, tanto com Joel, quanto com qualquer outro ser humano. Seu cérebro, no entanto, se fragmentou e cada fragmento tem seu papel. O primeiro a mantinha sã, ele fazia o melhor para garantir que ela se concentrasse em qualquer coisa, menos no evento que ela não relembrará. O outro o convence de que as coisas quase se consertaram desde... bem, isso.

Anna espera, se dando o tempo necessário - ou que ela acreditou ser necessário - para se recompor, ela sabia que ninguém viria arrancá-la de casa pela sua pele, mesmo que Clark tenha ligado incansavelmente, mesmo que Tommy tenha batido tão forte na porta por três dias seguidos, que ela poderia pensar que a porta já havia sido arrancada, mas ele ainda mantinha o respeito em não entrar sem a permissão dela. E mesmo que ela estivesse mal respirando, que os lençóis seguiam agarrados nas garras dos seus dedos, que sua frequência cardíaca diminuísse constantemente, ela sabia que ficar ali se remoendo de dor e ira, não iria resolver.

Ela nunca seria capaz realmente de cumprir com sua promessa estando ali. Sua mente repetia para si as mesmas perguntas, "será que Sarah está bem?", "o que ela deve estar pensando?", "ela sente minha falta?", "será que há negativos que ela precise revelar?". Ao mesmo tempo, ela prometeu para si mesmo, que, não havia como desrespeitar o pedido de Joel como pai, para que ela se afastasse da filha. Talvez pudesse ser crime?! Ela não sabe. Mas que, independente, se Sarah a procurasse, ela estaria ali.

Before the Last - JOEL MILLEROnde histórias criam vida. Descubra agora