CAPÍTULO 9

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Pov Luiza

— Isso é loucura, é loucura, é loucura... — Repito sucessivamente para mim mesma, tentando me acalmar. Mas minhas mãos não param de tremer, meu coração está batendo tão acelerado que eu sinto uma dor forte no peito. — É loucura, é pura loucura.

Ando até o sofá e me jogo nele. Coloco a minha mão esquerda contra o meu peito, na esperança de que esse simples ato faça o meu coração se acalmar. Porém é inútil. Minha mente é bombardeada novamente pelas palavras daquela mulher. Ela dizendo que foi contratada para me matar. O nome de Bernardo saindo de sua boca. Toda aquela história. "Eu não posso acreditar, porque é simplesmente loucura", porém ela soou tão sincera. "Merda".

Me levanto do sofá com a intenção de pegar o meu celular. Porém o telefone fixo está mais perto. O alcanço e com apenas dois toques consigo fazer uma chamada para o número de Igor que está salvo na discagem rápida. O homem atende mais rápido ainda. Ele sabe que só uso esse telefone em caso de extrema urgência.

I: O que foi Luiza? — Seu tom voz é preocupado.

A forma com que meu coração está batendo faz com que eu sinta dificuldade em falar o que quero. "Será que eu estou morrendo?"

I: Luiza? — O homem diz o meu nome ainda mais aflito. Eu tento respirar fundo para conseguir falar. — Estou subindo aí.

L: NÃO. — Essa simples palavra sai como um grito que estava preso na garganta. — Preciso que faça algo por mim. Algo muito importante.

I: É claro. Do que precisa? — ele pergunta.

L: Sabe a mulher com quem eu subi agora a pouco?

I: Sim.

L: Ela deve estar saindo do prédio agora. Preciso que a siga, que não a perca de vista.

I: Por quê? O que está acontecendo Luiza? — O homem pergunta preocupado.

L: Sem perguntas, apenas faça. — Ordeno em um tom nada amigável e desligo.

Acho que nunca fui tão rude com Igor e por isso vou me desculpar quando estiver menos nervosa. Mas agora preciso focar em me acalmar e apenas confirmar que essa história maluca não passa de uma invenção. Bebo outra dose e alcanço os papéis que a mulher me entregou. Me sento no sofá e leio cada página devagar e com toda a minha atenção. As coisas escritas aqui, minhas manias, fobias, alergias... Coisas que só alguém muito próximo poderia saber. "Ela poderia estar me vigiando, poderia ter pagado para algum funcionário meu falar coisas sobre a minha vida, sobre os meus hábitos." tento me fazer acreditar. "Bernardo não faria isso" repito e repito para mim mesma na minha cabeça. Em uma das páginas tem dados de pagamentos, valores e contas. Um milhão e trezentos mil dólares e quanto vale a minha vida, ou melhor dizendo a minha morte. Bebo mais uma dose. Já perdi a conta do quanto bebi, a garrafa estava cheia quando comecei e agora está quase vazia. Ainda assim não me sinto bêbada, ou relaxada ou calma.

Estou lúcida e aproveito a minha lucidez para pensar. Existe um jeito de descobrir a verdade, que é até bem simples apesar da hora da noite avançada. Se essa história for real, tenho certeza de que Bernardo não tiraria tanto dinheiro de sua conta pessoal, aliás, nem sei se ele tem tanto dinheiro em sua conta. Ele também não poderia fazer isso com a nossa conta conjunta. O gerente do banco me avisaria de uma movimentação de dinheiro tão grande assim, apenas por precaução. Ele sempre liga, as vezes apenas para oferecer novos e diferentes investimentos. No dinheiro das indústrias Campos Bernardo não teve acesso nem quando fazia parte da diretoria. Então só sobra o dinheiro da sua campanha. E como a minha empresa é uma das maiores financiadoras dessa campanha, recebemos prestações de conta. Tio Eddy fez questão disso, apesar de que no começo eu disse que não era necessário. Ele apenas disse que isso seria uma mera formalidade, já que Bernardo era minha família.

Tio Eddy cuida das indústrias Campos, como mãos de ferro e olhos de rapina. Atento a tudo o que pode ser benéfico ou prejudicial a empresa. Ele cuidou pessoalmente do meu acordo nupcial. O que fez de Bernardo apenas o meu marido e um simples funcionário, ao invés de dono e acionista. Pego o meu celular e procuro o nome dele na agenda. Aperto chamar. Já e quase meia noite e mesmo assim o homem atende rapidamente.

E: Luiza? Aconteceu alguma coisa? — Seu tom de voz é sério e prestativo. Mas não preocupado. Você nunca liga tão tarde.

L: Me desculpa a hora, eu só não ia conseguir esperar até amanhã. Ainda está na empresa? — Pergunto intuindo que a resposta seja sim. Já faz alguns anos que não consigo diferenciar se Eddy é um homem viciado em trabalho ou se simplesmente não gosta de voltar para a sua casa enorme onde encontra a sua esposa troféu, incrivelmente fútil.

E: Estou sim, apenas adiantando uma documentação importante para uma reunião que terei amanhã. — Ele confirma o que eu já sabia e ainda se explica. Como se me devesse satisfação. Como seu eu fosse brigar com ele por ser um homem dedicado. Eu poderia dizer "Trabalhar demais ainda vai te matar Tio Eddy" mas meu humor não está tão bom para isso. Meu humor não está tão bom para nada. Só estou fazendo essa ligação porque preciso dos documentos que só ele pode conseguir a essa hora da noite.

L: Preciso que me envie a prestação de contas da campanha de Bernardo. — Sou direta. — Pode fazer isso? Pode me enviar agora?

E: O que está acontecendo Luiza? — Ele questiona. — É um pedido estranho. Não só por causa da hora, mais também porque você foi a primeira a dizer que isso não era necessário.

Forço um pequeno riso. E agradeço por ele não conseguir me ver.

L: Você está certo, algo está acontecendo, mas eu não posso falar. Preciso ver essa papelada agora mesmo. A campanha do Bernardo está em risco. — Falo com um tom de voz aflito para ser convincente.

E: Entendi. — O homem não muda a sua entonação, sua voz segue séria como em toda conversa. Como em quase todas as conversas que tem. — Vou precisar de um tempo para encontrar esses documentos no meu computador, pois Kyra já foi embora. Mas vou te enviar por email assim que conseguir.

L: Muito obrigada. Muito obrigada mesmo. Não ligaria tão tarde se não fosse coisa de vida ou morte.

E: Eu sei Luiza.

O homem desliga o telefone e eu penso sobre a frase que usei. "Caso de vida ou morte" se ele soubesse de toda a história talvez também sentisse vontade de rir. Ou talvez eu esteja rindo por causa da quantidade de bebida que tomei. A lucidez que surgiu dentro de mim para que eu fizesse essa ligação sumiu e o álcool me deixou tonta. Preciso comer algo se quero ficar acordada para ver esses documentos. Aposto que Tio Eddy vai precisar ligar para Kyra, sua doce e atenta secretária, para conseguir me enviar esse email.

Ando até a cozinha cambaleando e pego a primeira fruta que encontro, uma maçã. Como ela rapidamente. Abro a geladeira e as minhas opções são mínimas. Por ser o meu "lugar" não tenho nenhuma funcionária fixa que fique aqui. Uma faxineira vem a cada três dias para limpar. E nas noites que passo aqui costumo pedir ou trazer comida da rua. É muito tarde para pedir alguma coisa. Então decido não pedir nada. Faço ovos mexidos com bacon. E bebo com um pouco de suco de laranja. Não sou uma boa cozinheira porque não costumo cozinhar. Mas fritar coisas é muito fácil então os meus ovos ficam razoavelmente bons. Me sinto mais sóbria após comer. Checo os meus emails e ainda não tem nada lá. Então vou tomar um banho quente e colocar uma roupa confortável.

Depois de uma longa hora, Eddy manda uma mensagem avisando que já enviou o que eu pedi para o meu email. Volto para a sala onde está o meu notebook e me sento no sofá. "Não vai ter nada lá, toda essa história é uma loucura, toda essa história é uma loucura" repito como um mantra. Até conseguir finalmente abrir a documentação. Respiro fundo algumas vezes para ter coragem de rolar a página. Tudo o que eu preciso fazer e ler atentamente cada nome, de cada conta e cada descrição de como os gastos da campanha tem sido feito. E quando os nomes que estão nos papéis que a desconhecida maluca deixou não estiverem lá, a minha confirmação de que essa história não é real vai me deixar mais tranquila.

— Não é possível. — Falo tão baixo que só consigo me entender, por que a minha mente começa a gritar "NÃO É POSSÍVEL, NÃO PODE SER VERDADE".

Mas é. Está tudo aqui. Bernardo contratou alguém para me matar. Ela estava falando a verdade.

Em outra vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora