CAPÍTULO 9

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Pov Priscila

Escutou vozes na sala. Foi isso que a acordou. Não tinha ideia de que horas eram ou em que dia estava. Adorava quando isso acontecia. Sentia-se um espírito livre, que podia dormir sempre que sentisse sono, sem obrigações com a vida. A luz escura lá fora indicava que ou estava muito cedo, ou era noite. Apostaria seu dinheiro na segunda opção. Uma gargalhada a fez sentar na cama. Sentiu o corpo dolorido e mexeu o pescoço lentamente de um lado para o outro e passou a mão pela nuca. Sábado.

Hoje era sábado.

Há algumas horas, ela e Luiza haviam finalmente terminado de pintar por cima de todo o verde do apartamento. Era um dia de comemoração. Priscila andava realmente cansada, alternando entre o próprio trabalho e o segundo turno, empunhando pincéis. Elas não eram boas na tarefa, o que era o motivo da demora para concluírem. Várias vezes precisaram repintar paredes inteiras. Mas conseguiram. Priscila nunca duvidou que seria um sucesso.

Saiu do quarto e foi em direção às vozes. Estava preparada para encontrar com Maycon, o melhor amigo de Valentina, que morava no quarto andar. Melhor amigo depois dela, é claro. É importante que a hierarquia esteja clara.

Mas o que encontrou não foi o amigo desajeitado de Valentina. Ela estava com uma mulher, sentada na mesa que quase nunca usavam. Priscila passou os olhos pelos notebooks abertos. Valentina levantou os olhos para Priscila e disse um oi rápido. Priscila voltou o olhar para a segunda ocupante. Era ridiculamente linda. Tinha uma beleza exótica, diferente.

Descobriu que o nome dela era Maya, de acordo com a apresentação rápida de Valentina, e que elas trabalhavam juntas. Priscila deu alguns passos até a cozinha, encheu um copo com água e recostou-se no balcão, onde poderia fazer contato visual com a tal da Maya. Ficou lendo nas entrelinhas se existia a possibilidade de Valentina estar ficando com ela. Nada indicava isso. Sem toques casuais, sem olhares prolongados, sem a versão sensual de Valentina. Elas paravam de falar para digitar por um tempo considerável e voltavam a conversar animadamente em sincronia.

Fazia duas semanas que a paz reinava por ali. Sem brigas, portas batendo, ou rostos da cor de tomates. Priscila sabia que Luiza e Valentina estavam se evitando, e sinceramente achava que a ideia era boa. Apesar de gostar da diversão que era ver as duas interagindo, se é que dava para chamar aquilo de interação, ela temia que a bomba estourasse a qualquer hora. Luiza estava tendo problemas com o divórcio, ao que parecia a ex dela recusava-se a assinar qualquer papel e a coisa toda ia durar mais que o previsto, o que deixou Luiza à beira de um ataque de nervos.

A batida na porta lhe tirou dos devaneios. Andou rapidamente até lá para atender. Luiza estava parada com uma garrafa de vinho na mão levantada e um sorriso estampado no rosto.

— O que acha de comemorarmos? — falou, com a voz alegre. — Podemos pintar as paredes de vermelho, com esse colega aqui. — Deu alguns tapinhas na garrafa.

O olhar de Priscila se iluminou. Ela precisava de álcool. Todo ser humano depois dos vinte precisa.

— Acho uma ótima ideia. — Priscila voltou-se para Valentina. — Não me espere para o jantar.

Quando tornou a olhar para Luiza, ela parou. Ah, isso ia ser ótimo. Afastou o corpo para o lado, permitindo que Luiza visse Maya sentada ao lado de Valentina. Priscila tinha uma teoria e queria ver se estava certa. Estava sem o celular para gravar, mas decidiu que olharia com atenção a cena, para relembrar mais tarde. Concentrou-se.

O sorriso de Luiza havia desaparecido assim que viu Valentina. Quando Maya entrou em foco, ela abaixou o braço em um movimento brusco. Valentina estava com os olhos fixos em Luiza, e assim que viu a agressividade do gesto, empertigou o corpo. Maya começou a falar sem tirar os olhos do computador.

Eu soube que é vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora