CAPÍTULO 18

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Pov Luiza

— Nunca duvidei. — Luiza respondeu, tentando esconder o contentamento que sentiu ao ouvir aquilo. Ela precisava muito daquela pausa. Estava tendo dificuldade para assimilar o que acabou de acontecer. O beijo lhe causou falta de ar, que lhe causou tontura. Ou a tontura era consequência do beijo. Colocou as duas mãos no rosto de Valentina para a impedir de se afastar. Ficaram um tempo com os rostos colados, observando as respirações acalmarem vagarosamente. Fitou os olhos verdes em sua frente, que brilhavam intensamente enquanto a encaravam em resposta. Não podia acreditar que tinha feito aquilo. Não podia acreditar que demorou tanto. Suas pernas estavam voltando a recuperar a firmeza que perdera quando sentiu a língua de Valentina dentro de sua boca. A singularidade daquele beijo e tudo que o acompanhou sacudiu Luiza de dentro para fora. A justificativa que usou para tomar a decisão de beijá-la era que quanto antes fizesse isso, antes tiraria do caminho aquela vontade avassaladora de querer Valentina. Agora viu que nunca esteve tão errada sobre algo em toda a sua vida. Queria mais, muito mais. Suas mãos deslizaram do rosto dela e passaram pelo pescoço, tocando os ombros definidos e bronzeados. Sentiu o corpo de Valentina tensionar-se com o toque e dar um leve saltinho quando a voz de Priscila irrompeu na sala.

— Mas olha só que maravilha. — Falou alto, da porta. — Antes era uma batendo a porta na cara da outra. Agora, nem fechar a porta, fecham. Gostei do estilo tudo ou nada. Só para ter certeza, está rolando um clima aqui ou estão brincando de encarar de novo?

Valentina afastou-se para olhar Priscila de frente.

— O que você acha? — Perguntou.

— Em uma situação normal? Colocaria minhas fichas na primeira opção. Se tratando de vocês duas? — Riu ironicamente. — Acho que você está tentando sugar todo o ar da sala para que ela morra sufocada. Acertei?

— Para ser sincera — Luiza falou — ela me deixou mesmo sem ar. Me deu até vertigem. Coisa de louco.

— Nunca se sabe o que esperar de vocês. — Deu um passo para trás. — Vou deixá-las voltarem para a competição de quem morre primeiro. Caso precisem de ambulância, sabem onde me encontrar. Tenho um aparelho de inalação no meu quarto. Sejam decentes uma vez na vida e fechem a porta. Os vizinhos não precisam ver essa baixaria. Obrigada. — Priscila desapareceu da vista.

Valentina voltou a olhá-la.

— Eu acho que já vou indo? — Falou, incerta. Deixou a brecha para que Luiza a preenchesse. Atenciosa da parte dela.

Não tinha nada que ela quisesse menos do que ver Valentina partir, mas achou que seria uma boa ideia ter um tempo para pensar e processar o que tinha acabado de acontecer. Tirando o fato de que não conseguiria manter as roupas no corpo se Valentina ficasse, e não estava disposta a ser mais uma que ela beijava e levava para a cama logo em seguida. Ah não, Valentina teria que merecer, pensou malevolamente.

— Tudo bem. — Luiza concordou. — Eu não quero atrapalhar seu trabalho atrasado, e também estou cansada. — Sorriu e puxou Valentina para perto. — Mas não vai sair sem me dar um beijo de boa noite.

Valentina parou a alguns centímetros dela e olhou-a nos olhos. "Acho difícil que eu consiga dormir sem seu beijo novamente", ela falou baixinho, seus lábios encostando suavemente nos de Luiza. Ouvir aquilo fez seu coração saltitar alegremente. Não conseguia imaginar que aquela versão de Valentina existia. Sua pose predatória havia sumido, sua postura firme e confiante tinha se desinflado e Luiza via apenas uma mulher encantadoramente linda e sincera na sua frente. A visão inesperada de uma Valentina amável e doce fez com que Luiza quisesse entregar-se de corpo e alma automaticamente.

Quando Valentina ameaçou beijá-la novamente, Luiza colocou as mãos em seu peito, afastando-a.

— Eu preciso ser sincera com você. — Falou, sorrindo, mas o tom era sério. — Sei que o que vou falar não é nada convencional e totalmente entendo se sua reação for qualquer uma, menos a normal. — Valentina a olhou com dúvida. — Eu quero muito isso. Nós duas. Você. Mas eu sei do seu histórico e isso me assusta. Eu me separei há poucos meses e o motivo foi traição, como você sabe. Eu não quero ser uma diversão para você. Quer dizer, eu até seria, se não achasse que talvez houvesse algo mais. Da minha parte. — Mas o que ela estava falando? Por que estava dizendo essas coisas? — E nós sabemos que para isso virar uma bagunça, não é necessário muito esforço. — Obrigou-se a ficar quieta antes que se comprometesse mais.

Valentina olhou de um lado para o outro, tentando recuperar-se da surpresa. Respirou fundo e pegou uma mão de Luiza.

— Você não é uma conquista para mim, Luiza. — Sua voz era suave, o que Luiza aceitou como um presságio bom. — Desde que te conheci eu vivo em uma montanha russa. Eu penso em você o tempo todo. No começo te odiando e depois... — Não completou a frase. — É inegável que você mexe comigo e você sabe disso. É impossível não saber. Eu não tenho como me desculpar pelo passado, mas posso te provar que as minhas intenções são honestas. — Olhou para o teto enquanto pensava. Depois de alguns segundos estalou a língua. — A partir de hoje, eu virei todos os dias para ouvir a sua voz e olhar para esses olhos lindos que você tem. Sem beijos, sem contato físico, sem nada que você possa julgar como "charme irresistível usado em conquistas vazias". Tudo bem assim? — Perguntou.

Luiza não esperava por isso. Estava pronta para receber viradas de olhos, nariz torcido ou fala impaciente.

— Hãn, acho que sim. — Respondeu, franzindo a sobrancelha.

Valentina deu um beijo na ponta do nariz dela.

— Mas acho que um último beijo não faria mal, não é? — Luiza perguntou.

— Acabou de ter o seu beijo de boa noite. — Deu um peteleco fraquinho com a ponta do indicador no nariz arrebitado de Luiza. — Quando quiser um beijo de verdade, vai ter de pedir. — Passou os lábios suavemente pelo pescoço de Luiza, fazendo um arrepio passar por ali. Afastou-se rapidamente e foi para a porta. Antes de fechar, parou e olhou para trás. — Preciso dizer que seu beijo — colocou a mão no coração — é de matar qualquer um. — Abriu um sorriso enorme e a porta fechou-se com um barulho suave.

Luiza sentou-se no sofá, sorrindo bobamente para as próprias mãos. Nada convencional, ela sabia. Duas mulheres com mais de trinta anos fazendo esse tipo de coisa? Não se importava. O que lhe importava era que ela foi casada com uma mulher por anos e ela jamais a fez sentir como Valentina fazia. Desde o início, ter Valentina por perto era como estar no vigésimo andar de um prédio e ver uma onda gigante se aproximando. Ela chegava e levava tudo com ela. O controle de Luiza, o bom senso, ο juízo e a maturidade, aparentemente.

Luiza estava acostumada a viver segundo as regras, afinal era uma representante da lei. Era uma pessoa contida, sem exageros, presa às normas sociais e com uma inclinação para ser controladora. Seu casamento nunca foi uma loucura avassaladora que carregava tudo que encontrava pelo caminho. Ele não era assim porque não era o que Luiza queria. Ela sempre procurou por relacionamentos que lhe trouxessem estabilidade, firmeza, e que soubesse o que esperar. Olha só até onde tudo isso a trouxe.

Forçou-se a parar de sorrir, deu um longo suspiro e foi para o banheiro. Enquanto escovava os dentes, seus pensamentos estavam em como Valentina mostrou-se diferente do que era normalmente. Aquela era a verdadeira Valentina? Se fosse, Luiza gostava ainda mais dela.

A verdade é que passou a tarde toda pensando em como Valentina reagiria se ela simplesmente se jogasse no colo dela e a beijasse. Cada vez que imaginava isso, era mais difícil resistir ao desejo. Sua imaginação passou de como seria o beijo, para como seria tocar o corpo dela por baixo da blusa branca e da calça cinza. Foi um longo dia.

Deitou-se na cama, mas o sono não veio. O que chegou para fazer companhia foi a lembrança da boca de Valentina na sua, seu cheiro, seu toque, sua voz. E a vontade enlouquecedora de ter mais daquilo tudo.

Eu soube que é vocêOnde histórias criam vida. Descubra agora