O dia da purificação

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Aquele era um grande evento para Panda, o único momento que ela esperava ansiosamente. O dia da purificação.

Não via a hora de terminar suas tarefas para poder ver o início da revoltosa. Por conta dessa ansiedade tudo parecia andar lentamente. O pequeno portão parecia estar mais difícil de ser aberto e consequentemente mais difícil de ser fechado.

O corredor parcamente iluminado pelas sancas com o fogo da vida parecia ainda mais comprido e inóspito. Todas as vezes que andava por aquele túnel cinza pensava em seguir aquela sanca, não soube enumerar as vezes que pensou em explorar cada centímetro dela até chegar ao fim.

A sanca era uma enorme serpente de latão colocada estrategicamente na parede para que o fogo branco pudesse iluminar os corredores, parecia nunca ter fim, mas Panda sabia que tinha que ter um lugar aonde ela terminava, porém sua imaginação não conseguia ser tão criativa, nada lhe vinha à mente quando pensava no que podia encontrar no final daqueles corredores.

Apesar da curiosidade, ela nunca conseguia encontrar coragem ou disposição para esse feito, já que sempre a vontade de finalmente descansar depois de um turno duro a impedia de seguir sua curiosidade sobre o final da serpente de fogo branco.

O trabalho para crianças na idade de Panda não era tão duro, ainda assim lhe comia totalmente a energia, e ela sempre voltava quase pendendo de sono quando era finalmente dispensada.

Já para aqueles que iniciavam seu turno de verdade era cruel, esses realmente sofriam e Panda só teria seu turno de verdade quando ganhasse sua décima quinta vela.

Panda não gostava muito de pensar nisso, ainda faltava algumas velas para começar seu sofrimento, seu único pensamento de todos os dias era chegar logo na sua toca, pois era chamado assim por todos.

A colônia era organizada de forma simples, cada corredor mal iluminado que cortava o corredor principal era chamado de setores que nada mais eram do que buracos cavados diretamente na rocha para os que tinham sorte ou na terra para os mais desventurados que viam o fim de uma rocha e ainda assim precisavam achar seu canto por ordem dos Piromantos, pois eram eles que sempre determinavam a direção que a colônia deveria seguir em seu crescimento.

Cada buraco distribuído pelos setores era chamado pelos coloniados de toca e todas essas tocas eram lotadas de moradores.

Como todos sabiam a sanca com o fogo branco era colocada pelos Piromantos para dar aquecimento e alento ao povo da colônia.

Muitos se sentiam agradecidos por isso, entretanto, Panda ouvia muitas vezes reclamações sobre aquela prisão, eram reclamações sussurradas febris e rápidas, como se tivessem medo de serem ouvidos e castigados.

Ela não conseguia entender o motivo de tanto medo, nunca tinha visto os Piromantos cometendo algum ato de crueldade na colônia, também pensando nisso, ela não se lembrava de tê-los visto muitas vezes.

Mas não tinha como confundi-los, pois eles cobriam todo o corpo com mantos negros inclusive o rosto vivia coberto por um capuz.

Panda ainda se lembrava de uma vez ter conseguido furtar uma imagem de um deles no dia da Purificação, não perdeu a oportunidade de olhar com atenção para ver como eram por baixo do manto. Para sua decepção não viu nada, somente um rosto encoberto por um pano negro. Também viu foi um par de olhos tão frios e sem vida que era como se nenhum sentimento restasse ali.

Panda levantou os ombros chegando à mesma conclusão quando pensava sobre eles, não eram interessantes, eram apenas homens altos demais para o normal da colônia e mais limpos que todos os moradores da colônia.

Pensando nisso se lembrou da cerimônia de purificação e acelerou o passo. Ainda estava longe de começar, mas ela queria ver as águas chegando revoltadas e ameaçadoras. Águas que depois de muito balançar dentro da vala ia se acalmando devagar até ficar silenciosa aguardando os corpos que ela limparia e purificaria de toda a sujeira.

Sem contar que sempre tinha esperança de conseguir encontrar algo interessante que era trazido com aquelas águas. Uma infinidade de coisas estranhas já havia sido encontrada por seus colegas. Davi que era uma volta mais novo que ela, tinha lhe mostrado seu achado na última cerimônia, e ainda lhe dava inveja ao lembrar.

Era uma garra de uma criatura que segundo os idosos da colônia, eram dragões em sua idade adolescente. Panda teve que segurar o riso quando ouviu aquilo.

Dragões eram histórias dos loucos da colônia, e dragões adolescentes só podia ser história dos loucos e caducos como aqueles anciãos que por vezes nem mesmo conseguiam comer sozinhos. Panda não acreditava em nada dessas histórias, não podia negar que era mesmo bem grande aquela garra, mas ela só conseguiu encontrar uma solução para aquele mistério.

Uma galinha gigante havia ciscado em algum lugar no passado, nas terras ermas acima deles quando ainda se era habitável e o tal do sol ainda brilhava em um tal de céu.

Nisso a coitada podia ter ciscado algo duro demais e com isso podia ter perdido uma unha, então aquelas águas com sua fúria devia ter passado arrancando tudo abaixo de si e trazido àquela unha para ser um motivo de conversa para os mais velhos e seus contos antigos. Era essa a explicação, ela tinha certeza e não aceitava outra coisa.

O som da movimentação e agitação das pessoas estava aumentando, sussurros e barulhos de passos estavam por todo lado, o que a deixou mais ansiosa, não queria perder aquela visão tão diferente do habitual. Se perdesse, só poderia ver novamente dali a dois turnos.

Esse pensamento a fez andar ainda mais rápido. Praticamente estava em uma corrida, só não saía em disparada pelo corredor por ser proibido. Os corredores da colônia eram estreitos e poderia haver acidentes.

Depois de infinitas viradas tanto para a direita como para esquerda, ela começou a escutar o barulho da água. Pelo som abafado sabia que ainda não tinha chegado à vala, mas estava próximo e uma agitação crescia dentro dela. Pensou consigo que era uma pena ainda ter que enfrentar a fila da oferenda antes de poder brincar.

Parou atrás de um homem encurvado, via apenas suas costas com a túnica manchada de sangue seco, sentiu o cheiro de inflamação característico naqueles que iniciavam seu turno. O homem andava com dificuldade quando a fila seguia, e isso deixava claro que os ferimentos eram graves. Panda estava acostumada com o cheiro pútrido e os gemidos dos mais velhos, fazia parte de seu pequeno mundo, sua atenção era na fila, queria pegar logo as coisas e seguir para a vala.

Logo chegou à primeira oferenda, essa era para pegar o minúsculo pedaço de sabão oferecido pela serva branca, a única que usava branco e eram chamadas de madres, em sua maioria eram mulheres de meia idade de aparência bondosa, porém com um olhar frio e maldoso.

Uma mistura estranha para Panda, pois era como se elas tivessem sido boas no passado e agora seus olhos brigassem com seu coração as fazendo ter duas aparências distintas. E a ação automática da madre de enfiar a mão no cesto e estender para o próximo da fila não ajudava muito a descobrir qual parte ganhava, se a bondade de seu rosto ou a maldade nos seus olhos.

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Olá pessoal e assim começa espero que gostem desse primeiro capítulo, Não sou escritora sou amadora que ama contar histórias então perdoem se verem erros, e agradeço imenso se votarem e comentarem para eu saber como estou indo. boa leitura e espero que gostem ♥


Sanoar 1- Crianças Herdeiras-(DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora