O que aconteceu naquela noite.

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Pensamos, não haveria jeito, ou esperávamos até meia noite e levávamos uma bronca enorme de nossos pais, que poderiam até chamar a polícia, ou poderíamos passar pela frente do Pedro, e ele descobriria que fomos nós que fizemos tudo:
- Ana, a gente precisa sair.
- Você é louca? Ele vai saber de tudo.
- E quem disse que ele já não sabe? - questionei.
Ela deu de ombros, não iria fazer nada que pudesse me prejudicar, mas ou era uma opção ruim, ou outra, então ela sussurrou de volta:
- Vamos fazer assim, vamos atravessar a rua, pelo canto, onde ele não vai nos ver, vamos ir andando até o outro sobrado, e vamos fingir que saímos de lá, e podemos andar até sua casa fingindo que só estávamos lá naquela casa conversando com alguém ou sei lá.
- É a única opção mesmo - disse eu.
Atravessamos a rua e nos escondemos perto da garagem do vizinho da casa do Pedro, saímos de lá com os braços dados e conversando alto, para não levantar suspeita de que estivéssemos escondendo algo.
Olhei de relance para o outro lado da rua, o Pedro tinha se levantado e estava vindo até nós, cochichei pra Ana:
- Ferrou.
Ele chegou e veio perguntando:
- Posso falar com você Bia?
Eu e Ana nos olhamos, seria melhor deixar ele sem falar comigo, ou falar com ele mesmo que isso poderia doer?. Ana não me deixou decidir, me empurrou e disse:
- Ah, ela vai, não estávamos fazendo nada mesmo.
Ai caramba, eu nem tive tempo de pensar? E se eu falasse algum tipo de bobagem? Estragasse tudo mais do que está estragado? Bom, ele me puxou de canto e começou a falar meio enrolado:
- É... Tudo bem?
- Tudo, e com você?
- Tudo ótimo.
Ficamos quietos por um tempo, quebrei o silêncio:
- Era isso? Me perguntar se eu estava bem?
- Ah, não, vim perguntar se foi você - ele disse isso e a princípio eu não entendi, se fui eu o que?
- Não sei do que você está falando,se eu fiz o que?
Ele levantou a mão, que segurava o coração, todo pintado, sem o embrulho agora.
- Pedro, você acha que eu gosto de você?
- Acho - ele olhou bem para mim, e percebi o quão profundo eram os olhos dele, eram castanhos assim como seu cabelo, mas algo me atraía, tinha um fraco por coisas que me sugavam como um buraco negro - Por que? Você não acharia?
- Não, eu não gosto de você, que bobagem- falei com a voz um pouco tensa, e no final dei uma gargalhada totalmente voluntária, mas saiu forçada demais pro meu gosto.
Ele então abaixou a cabeça e perguntou:
- Então se eu pisasse nisso daqui você não sentiria nada?
- Parece que eu gosto de você? Então se enganou, e pisa, tanto fez assim como tanto faz Pedro.
- Ah é? Então você gosta de quem? - Ele riu, não Beatriz, ele quer que você se entregue, ele é um otário. Pensei, e numa resposta de imediato falei algo que não devia ter falado:
- Do Bernardo.
Me belisquei discretamente, e olhei para o Pedro que comentou:
- Sai dessa, eu sei quando alguém está mentindo.
- Desculpa, por acaso você é doutor? Agora me dá licença.
- Então não foi você?
- Não - repeti.
Então ele foi um completo otário, jogou o coração no chão e pisou em cima, esfregou a sola do sapato sobre o que eu tinha feito e dado pra ele, e no final agiu como se nada tivesse acontecido, me segurou pelo braço, me puxou e disse muito baixo:
- Você não se importa não é? Não foi você que fez.
Me soltou, e eu tive todas as oportunidades pra voltar pra Ana para poder chorar, mas fiquei ali, paralisada com o que eu havia visto, ele foi egoísta, se achou o máximo e ainda quis fazer com que eu fosse a boba do coração de papel machê, o sentimento que estava crescendo era uma raiva incontrolável capaz de falar alguma coisa para o Pedro que faria eu me arrepender depois, lancei:
- Você é a pessoa mais estúpida que eu conheci na minha vida.
E com essas palavras eu ousei virar as costas, e após isso, eu não me lembro do que realmente aconteceu, num baque surdo, eu cai no chão, enquanto o Pedro voltava pra sua casa, Ana veio atrás de mim, caída no asfalto, chorando, essa era a Beatriz do momento, e não me orgulho nada disso.
Pedro não olhou pra trás.

Aquele cara.Onde histórias criam vida. Descubra agora