Na terça fomos almoçar juntas depois da aula em um dos restaurantes da universidade. Clara depois teria que ir para a escola e eu tinha coisas da pesquisa para terminar e ficaria o dia inteiro em casa. Ela pediu uma salada e eu, um bife mal passado com purê de batata. Só que, quando o bife chegou, eu fiquei olhando para ele fixamente e o cheiro que vinha do prato não me parecia agradável.
- O que foi, amor? – perguntou Clara. - Alguma coisa errada?
- Eu não consigo comer – falei, surpresa.
- Está passando mal? – perguntou, preocupada.
- Não – falei, assustada. – Eu me sinto bem e ainda assim não consigo comer – falei, um pouco desesperada, enquanto ela ficava em silêncio. – Eu não consigo cortar nem comer o bife! – Meu desespero aumentou.
- Calma, Alex...
- Clara... Eu amo carne! E eu não consigo comer essa carne! O que está errado comigo?
- Não tem nada de errado – sorriu, doce, mas eu não estava doce.
Eu gosto de beber, mas não bebia mais toda semana. Eu gostava de sair, mas não saía mais todo dia. Eu não gostava de trabalhar, mas planejava ser professora na escola. O que estava acontecendo comigo? "Eu gosto de carne! Mas não consigo comer o bife! E não sei porque... só não consigo".
- Quem é essa pessoa? Quem é essa pessoa que não consegue comer um bife?
- Alex, é só um bife!
- Não! – falei um pouco mais alto. – Não é só um bife! É tudo! Eu não sei mais quem é essa pessoa que eu me tornei.
- E quem você acha que você é? – falou calma, mas séria. – Alguém que sai toda noite, fica bêbada, come carne e bebe Coca-Cola? É muito limitante pensar que você seja apenas isso, não acha?
Eu não respondi.
- Você é um espírito imortal, Alex! Você é mais que esse corpo carnal. Você é mais que a Alexandra.
Eu não conseguia ouvir mais o que ela dizia. Um desespero sem tamanho começou a me invadir. Era medo. Eu sabia. Eu havia admitido que a Clara era a mulher da minha vida e comecei a ter medo de toda a bagagem que ela trazia e das responsabilidades. E se eu não estivesse pronta para crescer ainda?
- Eu tenho que ir... – falei e saí correndo de lá.
Queria ir para longe do bife, longe da Clara, longe de todo mundo! Cheguei em casa e fiquei assistindo televisão. Ignorando as mensagens e ligações de Clara. Minha cabeça estava explodindo porque o que eu mais queria era atendê-la, ir abraçá-la, ir para a escola, mas... Cadê a Alex?
- Voltou para casa! – falou Paloma, animada. – Fica se enfurnando lá na terra do nunca com a Princesa-sóbria e esquece dos amigos! Vai ter uma social lá no João, partiu?
- Partiu! – disse, mesmo querendo dizer que não, que tinha pesquisa, que tinha a Clara, que eu realmente não estava afim de ir, mas neguei minhas vontades e disse sim, porque eu queria fugir, ir para longe.
Lucas e Paloma ficaram felizes que estava saindo com eles e sem a Clara. Assim que chegamos, comecei a ingerir todo álcool que via pela frente.
- Assim que se faz! – gritou Lucas.
- Alex voltou! – comemorou Paloma depois de eu ter tomado a quinta caipirinha.
Eles contavam histórias que eu não achava graça e eu bebia mais tentando procurar o motivo para rir, mas não funcionava. Já nem conseguia tocar violão de tão bêbada. Peguei o telefone para ligar para Clara, mesmo sem saber o que dizer.

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Apesar de ser lua cheia
RomanceAlexandra tem vinte e três anos e não gosta de responsabilidades. Tudo o que ela quer é continuar vivendo de bares, festas, boates, bebidas e mulheres. Tentando adiar sua formatura em Letras e o dia em que terá de começar a trabalhar, Alex decide fa...