4. Família

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Depois de encontrarmos a garota morta, gritei para os policiais, que entraram logo em seguida.

- O que houve?! - Perguntou o policial Thompson.

- Eu não sei! Acabamos de entrar no quarto e encontramos ela assim - disse pra eles.

- Quem? O que...

- Jack. Olha isso... - o policial Jackson interrompeu Thompson.

Agora os dois olhavam para a garota debruçada sobre a mesa com uma poça de sangue ao seu redor, que agora caía no chão. Estávamos os quatro embasbacados.

- Que droga, cara... - policial Jackson estava com as mãos na cabeça, Thompson se aproximou do corpo para averiguar a provável causa da morte, logo achou.

A lateral do pescoço estava com um corte de pelo menos cinco centímetros de profundidade. Na verdade, parecia mais um rasgão que um corte.

- A jugular foi cortada. Perdeu muito sangue - ele chegou a conclusão.

- Eu... Eu vou chamar o papai - eu disse.

- Vá. Rápido. - Disse o policial Thompson.

Mapa e eu saímos correndo em direção a caminhonete do meu pai. Liguei o carro ainda com as mãos trêmulas e dei ré antes de virar o carro e seguir de volta pra casa a toda velocidade.

Chegando lá, encontrei a viatura do meu pai do lado de uma van. Descemos do carro e partimos em direção ao portal de entrada. Ao entrarmos, vimos que meu pai estava com visitas.

Eram um homem e uma mulher de meia idade de pele caucasiana e cabelos negros.

- Jason? Saiu cedo, onde esteve? - Perguntou meu pai. - Estes são o senhor e a senhora Johnson. A senhora Johnson é irmã da falecia senhora Peterson, da família que foi, hum, encontrada morta na floresta.

- Infelizmente... - dizia a senhora Johnson. - Mas nossa sobrinha sobreviveu, graças a Deus.

Um nó enorme se formou minha garganta, olhei para Mapa que estava do meu lado, ela já tinha lágrimas nos olhos. Claro que eu lembro da única vez que vimos uma pessoa morrer antes do dia de hoje, éramos apenas aspirantes em treinamento. Nosso colega de esquadrão em uma organização de metamorfos chamada Alcateia fora morto cruelmente na nossa primeira missão, toda a equipe foi dissolvida. A morte era uma coisa horrível, ela chegava sem avisar, sem pedir permissão. Apenas tomava o que alguém tinha de mais importante e ia embora.

- Pai, podemos conversar em particular? - Perguntei. Meu pai mantinha uma expressão calma no rosto, mas já imaginava que ele estivesse se perguntando mentalmente: "O que ele aprontou agora?"

- Claro, filho - ele disse, e então virou-se para o senhor e a senhora Johnson. - Me dão licença um instante? Já volto para levá-los até sua sobrinha.

O nó apertou mais ainda antes de me dirigir com meu pai até a cozinha. Ele estava calmo, mas, como sempre, havia uma certa expressão de seriedade em sua face. Eu conseguiria mentir pra qualquer pessoa sobre qualquer coisa, menos para o meu pai. Ele não acreditaria se eu soubesse que o que eu falava era mentira.

Eu me apoiei de costas na bancada com as mãos pra trás, havíamos deixado Mapa com o senhor e a senhora Johnson na sala, o que, com certeza, foi tão desconfortável pra ela quanto pra mim, talvez mais.

- Então... Sobre o que quer falar? - Ele me perguntou, com os braços cruzados.

Engoli em seco antes de falar.

- Hoje... Eu e a Mapa fomos visitar a garota, a Letícia no hotel na rodovia que você sempre coloca as pessoas que... Bem, são de fora e acontece coisas muito ruins. Os policiais Jackson e Thompson estão lá agora...

- Pelo amor de Deus, Jason, o que você fez? - Meu pai agora começava a ficar irritado.

Um nó se formou forte em meu peito e minha garganta ficou seca, irritada, meus olhos começavam a lacrimejar.

- Eu não fiz nada, eu só... Queria saber se podia ajudar de alguma forma, sabe? Me tornar amigo dela... Pai... Meu Deus! Foi horrível! - Esfreguei os olhos.

- Do que está falando? - Ele me perguntou.

- Quando eu entrei no quarto, ela tava debruçada sobre a escrivaninha, parecia que estava desenhando ou escrevendo uma carta, não sei.

- E daí?

- E daí que ela não se mexia, não respirava e o lápis estava caído do lado dela... E então...

- E então o quê?! - Ele estava tão impaciente que segurou meus braços com força.

- A escrivaninha se encheu de sangue. Ela estava morta! Com sua jugular rasgada! - Ele me olhava estarrecido. Parecia atordoado, ele soltou meus braços e botou as mãos na cabeça.

Andou de um lado para o outro com as mãos na cintura, ainda não havia tirado a farda de policial, mas seu distintivo dourado de xerife estava em cima da mesa.

- Você tem certeza disso? - Ele perguntou.

- Absoluta - respondi.

- Tem certeza de que ela morreu?! - Ele gritou.

- Eu já disse que sim! - Gritei de volta.

Nessa hora, percebemos que a senhora Johnson estava na porta da cozinha, nos observando boquiaberta. Se ela estava com uma cara de choro antes, imagina agora. Acabou de saber da pior maneira que sua sobrinha sobrevivente de um ataque de animal fora assassinada no quarto do hotel onde estava com escolta policial.

Meu pai automaticamente abaixou a guarda, o que me deu a oportunidade de sair da cozinha, mas não de prestar minhas condolências aos Johnson. Eu e Mapa seguimos para o meu quarto e tudo o que eu queria era extravasar a raiva e frustração. Expulsar a dor que começava a assolar meu peito.

- Mas que droga! Que droga, Mari! Nunca vamos conseguir pegar esse cara! - Exclamei em voz baixa.

- Talvez devêssemos acionar a Alcateia - ela disse.

- O que? Por que? - Perguntei, quase indignado.

- Bom, eles nos treinaram, formaram nossa antiga equipe. Poderiam nos ajudar nesse...

- Eles nos expulsaram por uma coisa que não foi culpa nossa! Você acha isso justo? Acha que precisamos mesmo da ajuda deles?

Mapa ficou calada depois disso, ficamos nos encarando por algum tempo, um minuto, talvez, não contei. Mas depois ela relaxou os músculos e se sentou na minha cama.

- Certo... Vamos fazer do seu jeito - ela suspirou ao concordar comigo e eu me sentei ao lado dela na cama. Fiquei encarando o nada enquanto ela voltava a falar depois de um tempo. - E agora? O que faremos?

Eu continuava parado, pensativo. Claro que ouvi a pergunta dela, mas não tinha como responder, não tinha o que responder e eu odiava não ter uma resposta ou solução para alguma coisa. Fiquei assim até admitir interiormente e falar em voz alta depois de suspirar mais uma vez:

- Eu não faço a menor ideia.

O Caçador - Crônicas dos Metamorfos (Vol. 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora