Minha escola era pequena. Menor ainda, a cantina. Vendia alguns lanches comuns, mas nunca fora do cardápio. Apesar de tudo, eram caros. Eu trazia meu lanche de casa diariamente até que um dia me atrasei e decidi comprar.
O ticket da cantina era feito de um papelão medíocre com uma folha sulfite cobrindo-o com o preço impresso. Aparentemente, feito à mão. Comprei meu lanche, mas ainda pensava no ticket: "Até eu poderia fazer um desses...".
Na semana seguinte eu fiz um idêntico ao da cantina no valor de um real. No momento pensei que dessa maneira nem precisava gastar mais dinheiro na cantina, bastava fazer mais cartões iguais àquele.
Estava chegando o momento de comprar o lanche desmerecido com aquela farsa em mãos. Mas senti um desconforto estranho e mesmo assim repetia com um desdém forçado: "É só um real". A aflição me envolvia. Se era medo de ser descoberta ou o conhecimento do erro que cometeria, eu não sei. Sei que a cada passo, estava mais perto.
Por Deus! Quanto exagero. Era só um real! Quando a atendente perguntou, para meu alívio e desespero, qual escolheria. Apontei e ela o trouxe para mim enquanto a outra mão estava estendida para receber o ticket. Estava prestes a ganhar o lanche de graça.
Eu tinha o oficial no meu bolso, o mesmo que eu usei para conseguir fazer o falsificado, mas a sensação de entregar o outro, imaginei, seria mais emocionante.
Eu tive consciência do meu erro minha e para minha surpresa lhe respondi: "Eu fiz este ticket em casa. E este aqui é para pagar o lanche. Fique com este como presente".
A moça sorriu, agradeceu e os guardou.
Retribui o sorriso.
* * *
Estava com umas amigas à tarde na escola, uns meses depois. Todas concordamos em comprar balas e eu fui a encarregada por ter o dinheiro necessário.
Pedi à atendente certa quantidade de balas e lhe dei o resto dos trocados que eu tinha no bolso. As balas foram contadas e postas na bancada em uma quantidade menor da qual eu pedira. Não tinha dinheiro o suficiente para todas nós.
Embora estivesse olhando triste para a moça, falava comigo mesma: "Tudo bem, eu fico sem mesmo". A moça, que mais tarde descobri ser a dona do estabelecimento, me olhou com piedade e incluiu mais cinco balas no monte.Eu sorri, agradeci e as guardei.
Ela retribuiu o sorriso.
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Contos, Romances e Narrativas
Historia CortaA bondade ultrapassa os sentidos do próximo quando estes jamais conseguiram ser conquistados sozinhos. Foi um sonho ou real? Quem foi Mia? E as cores faiscantes? Onde moravam? Questões implícitas através da realidade, a fome e o que esta é capaz de...