Questions - 22

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Talvez estivesse a alucinar, ou a ter um sonho. Mas tudo aquilo parecia tão real que era díficil para mim acreditar que de facto não era verdade, que nada daquilo tinha acontecido, que Charles não estivera naquela sala, que Niall não falara com ele e que eu não estava imóvel, sem me conseguir mexer. Mas na verdade, estava. A minha espinha parecia estar dormente, como se ela não existisse. Estava deitada de barriga para baixo quando dei por mim a gritar de dores, sentindo a minha cabeça andar á roda e alguém pegar-me ao colo. Sem mais forças restantes, continuei com os olhos fechados e mantive-me quieta, sem espernear ou fazer barulho. Tudo aquilo era demais para a minha cabeça. Era tudo demasiado realístico embora parecesse tudo um sonho.

Senti o meu corpo relaxar quando tocou na água quente, estava dentro de uma banheira enorme, com o corpo apenas coberto por uma simples bata, parecida a um lençol. Se estivesse num bom estado, provavelmente estaria a espernear, a gritar por socorro, sem saber quem me tocava ou despia. Mas a verdade é que eu parecia não existir naquele momento, como se fosse impossível processar tudo o que acontecera. Era tudo demasiado complexo para caber na minha mente. Então eu acordei e reparei em Harry, que delicadamente me pousara na água quente e esperava por uma resposta. Assenti com a cabeça quando ele tocou no meu ombro, com intuito de me despir. Estava á espera de ter roupa interior, mas nem isso tinha. A vergonha e o embaraço pareciam não me afetar naquele momento, estava confortável e ao mesmo tempo chocada pelas minhas próprias ações. A bata que antes cobria o meu corpo acabara por desaparecer, e Harry olhava para mim, como se não soubesse o que fazer. Mantive-me imóvel, sem oferecer resposta, e ele pegou numa esponja com sabão e esfregou suavemente as minhas costas. Só me dei conta das lágrimas que escorriam pela minha cara quando o rapaz de olhos verdes olhou para mim, com uma certa preocupação no rosto.

"-Estaria errado se perguntasse o que se passa, certo?" - Perguntou, sem esperar resposta. Ele sabia perfeitamente a razão das minhas lágrimas e seria irónico se eu lhe explicasse o porquê de estar naquele estado.

Harry desviou o meu cabelo para o ombro e passou as mãos pelo meu pescoço, como se examinasse cada pequeno detalhe do meu corpo pequeno. O seu olhar continuava penetrado no meu corpo, á procura de pormenores, á espera que eu o enxotasse e o mandasse embora. Porém, isso não aconteceu. Não sabia o porquê, e dadas as circunstâncias parecia algo absurdo, mas eu não me sentia mal, de todo. Estava confortável, embora as lágrimas não parassem de cair.

"-Harry," - Eu chamei, mesmo sabendo que este já me olhava. "-Vocês vão matar-me?" - A minha voz falhou e perguntei a mim mesma se ele me tinha ouvido. O corpo de Harry vacilou com a minha questão, baixou o seu olhar e parou de repente.

"-E-Eu não sei, Jane." - Acabara por dizer, encarando-me. "-Eu não sei mesmo." - Baixei a cabeça e senti um aperto no coração, queria fugir, esquecer tudo aquilo. O medo consumia-me a cada minuto que passava e eu duvidava que pudesse aguentar durante muito mais tempo.

"-Eu tinha um vida perfeita, Harry." - Afirmei, com a voz estranhamente firme. O rapaz continuara a passar as mãos pelas minhas costas, não sabia se por um ato de conforto, ou se porque de facto tinha recebido ordens para tal. Sabia que o magoaria com as palavras que iria dizer, mas magoada estava eu, e não era pouco. "-E tu simplesmente arruinaste tudo. Sentes-te feliz por isso?"

O seu rosto era inexpressivo, embora eu soubesse que ele estava surpreendido pelas minhas palavras diretas.

"-A culpa disto não é toda minha, Jane. Metade do que estas pessoas fazem eu não faço a mínima ideia do porquê." - Falou, desviando uma madeixa de cabelo que lhe havia caído para os olhos. "-Eu sei que te deves sentir horrivelmente mal, mas não podes por a culpa toda em cima de mim."

"-Então culpo quem, Harry?" - O meu tom de voz aumentou, involuntariamente, e dei por mim quase a gritar. "-A culpa é minha? Tu e esse Charles trazem-me para este sítio horrível, abrem-me as costas sem qualquer método, apenas o fazem e não pensam nas dores que estou a sentir, nas questões que tenho para fazer, nas respostas que procuro, mas por mais que tente não encontro nenhuma. Oiço vozes a dizerem que existem mais fases de tratamento. O que raio é isto? É alguma brincadeira?" - Não conseguia controlar-me, estava prestes a explodir. Precisava de libertar tudo o que havia guardado durante aqueles dias. "-E o Niall, Harry? O que tem ele a ver com isto?" - Ouvi-o engolir em seco.

Não houve respostas, tal como eu esperava. Harry permaneceu em silêncio e os únicos sons audíveis eram as respirações pesadas e a água a chapinhar. Ele levantou-se silenciosamente e pegou no meu corpo, sem qualquer dificuldade. Caminhou comigo até á cama e deitou-me nela, sem proferir quaisquer palavras. Pousou a bata ao meu lado para que mais tarde eu a vestisse, e acabei por fazê-lo naquele instante.

"-Precisas de dormir, Jane." - Disse, quase num murmúrio. "-Amanhã falamos." - Não protestei. Talvez porque estava demasiado cansada.

(...)

Acordei com alguém a mexer-me no braço, sentindo o meu corpo vacilar. Quando abri os olhos, a primeira coisa que vi foi Harry, sentado numa cadeira junto á minha cama com o olhar preso em algo incerto.

"-Harry?" - Chamei-o, arqueando as palavras de modo a que soassem o mais firme possível. Num sobressalto, encarou-me, como se não estivesse á espera que eu falasse.

"-Bom dia." - Esboçou um sorriso, não muito grande nem muito pequeno, o suficiente para que eu soubesse que algo que se passava.

"-O que estás a fazer aqui?" - Perguntei, elevando o meu tronco e arrependendo-me logo a seguir devido ás dores que sentia nas costas.

"-Eu vou tirar-te daqui, Jane." - Disse ele, passando as mãos pelo cabelo enquanto se levantava. Estava perplexa, sem saber o que dizer.

"-C-Como assim?" - Interroguei, sentindo uma estranha curiosidade atingir-me.

"-Vou tirar-te daqui, Jane. Vou salvar-te." - Não era possível raciocinar naquele momento. Na noite anterior ele deixara-me com inúmeras questões e agora quer fugir comigo? Ou deixar-me fugir sozinha? "- Agora despacha-te antes que eles nos apanhem." - Como se soubesse e tivesse noção das dores que sentia (ou apenas porque gostava de me agarrar), Harry pegou-me ao colo e caminhou até á porta.

E para onde íamos agora? 


24 Days - H.S - AU - A REESCREVEROnde histórias criam vida. Descubra agora