I want a coffee - 5

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L

[Jane's POV]

ouis tinha-se ido embora pouco tempo depois. Após alguns minutos de conversa e de uma grande caneca de chocolate quente, ambos concordámos que seria melhor voltar para casa.

Não estava lá ninguém, como era habitual. A minha mãe desaparecia, de vez em quando, apenas por algumas horas, provavelmente para beber ou simplesmente vaguear na rua. Ela voltava sempre, pois apesar de toda aquela tristeza que afundava o seu coração, ela sabia que eu precisava dela. Tornara-me muito independente, desde o momento em que o meu pai desaparecera. O facto de crescer sem pai ajudou-me a perceber que a vida é o que fazemos dela, e o meu pai optou por desperdiçá-la. Não sabia os motivos por ele me ter deixado, a mim e à minha mãe, mas talvez porque eu não tinha sido algo planeado na vida dele e ele optou por escolher o caminho mais fácil e deixar as responsabilidades de lado. Talvez já tivesse construído uma família noutro lugar, esquecendo-se daquela que deixou para trás. Essa era uma das razões pelas quais eu era uma pessoa firme e forte. Queria demonstrar à minha mãe que eu não era como o meu pai, eu não iria abandonar a minha família por razão alguma, pois mesmo com todos os sacrifícios, havia momentos que valiam a pena, e era desses momentos que nós tínhamos de viver.

A minha mãe era enfermeira, no entanto despediu-se após o meu pai nos deixar. Passava os dias num centro, onde convivia com outras pessoas que sofriam de depressão ou doenças terminais. Muitas vezes, para além de terem sessões com psicólogos, distraíam-se um pouco com atividades normais do quotidiano, como jogar ás cartas, dar passeios pelo jardim, jogar xadrez ou desenhar em livros.

-Jane? - Ouvi. Ela estava em casa. Suspirei de alívio.

-Estou aqui. - Falei alto, pousando a minha mala em cima de uma velha cadeira, encostada à parede. A minha progenitora apareceu, fazendo-me encará-la. A sua imagem causou-me um peso no peito. Estava deveras magra, com as maçãs do rosto salientes e umas olheiras enormes. A sua roupa ficava-lhe larga por cima do seu corpo franzino e os seus cabelos, atados no cimo da sua cabeça, realçavam a sua clavícula. -Como estás? - Perguntei, sabendo que ela não me iria responder. Despi o meu casaco e pendurei-o atrás da porta enquanto a minha mãe se sentava no pequeno e fedorento sofá. -Comeste alguma coisa hoje? - Ela negou, abanando a cabeça. Suspirei, vestindo o casaco novamente.

-Onde vais? - A sua voz era fraca e trémula. Peguei na minha mala e abri a porta, sentindo a brisa gelada vinda da rua.

-Vou comprar qualquer coisa para o jantar. - Não me agradava a ideia de a deixar sozinha àquelas horas, mas ela tinha de comer.

Sentia que os nossos papéis andavam trocados. Eu é que me responsabilizava pelas suas refeições, pelo tempo que passava na rua e a que horas chegava a casa, o que fazia enquanto estava fora. Eram raras as vezes que mantínhamos uma conversa ou que ela me perguntava como tinha sido o meu dia. Ainda não tinha tido a coragem, pois sentia uma grande empatia pela minha mãe, mas por vezes tinha vontade de a agarrar pelos ombros e perguntar-lhe como é que um homem é capaz de mudar a vida de alguém daquela maneira. Ela tinha-me a mim. A sua filha. Eu não era mais importante do que o seu marido? Sim, não duvido que tenha sido deveras doloroso habituar-se a uma vida onde as questões pairam no ar e as respostas parecem estar demasiado longe e fora do alcance. Mas eu fazia um esforço. Porque é que ela não fazia o mesmo? Eu sabia que ela estava a tentar, mas a sensação de impotência agravava-se a cada dia que passava.

Caminhava a um ritmo acelerado para que pudesse chegar rapidamente a casa, procurando qualquer estabelecimento aberto. Lembrei-me do supermercado em que Louis trabalhava, e como não ficava muito longe, fui até lá.

Louis estava na caixa, a atender os clientes. Acenei-lhe e ele sorriu brevemente. Estava prestes a pegar nalguns alimentos para levar para casa, quando o meu melhor amigo me fez sinal para parar.

-Sim? - Questionei, ao observá-lo vir até mim e deixar o cliente com as compras a meio.

- Espera um pouco. Não te vás embora. - Disse ele rapidamente, virando costas. Sorri fracamente para o cliente irritado que tinha ficado à sua espera e desejei internamente para que Louis não demorasse muito.

Apareceu com um saco de compras no exato momento em que eu me preparava para ir à sua procura.

-O que é isso? - Perguntei, enquanto ele me entregava o saco.

-Penso que isso chegue para o resto da semana. - Eu esbocei um pequeno sorriso ao espreitar para dentro deste. Havia latas de atum, frascos de salsichas, carne congelada e uma variedade de comida.

-Mas Louis, eu posso comprar - Ele interveio, pondo um dedo à frente da minha boca.

-Eu sei que podes, mas também não me custa nada oferecer-te qualquer coisa. Agora tenho de ir, manda cumprimentos meus à tua mãe. - Deixou um pequeno beijinho na minha testa e correu para o seu posto de trabalho. Antes de me ir embora, olhei para Louis e gritei:

-Essa farda fica-te a matar.

Ele riu-se. E o cliente também.

(...)

Estava a regressar a casa, já era de noite e estava demasiado frio. Senti uma mão tocar-me nas costas, e o primeiro pensamento que voou na minha mente foi que talvez o Louis tivesse ido atrás de mim porque se tinha esquecido de me dizer algo. Virei-me encarando o rapaz. Não era Louis, nem qualquer outra pessoa que eu pudesse estar à espera de encarar.

-O que queres, Cara-De-Camelo? - Perguntei, ao dar de caras com o jovem que aparecia sempre nos piores momentos. Ele fez uma expressão confusa. – Eu não sei o teu nome. – Justifiquei-me.

-Podes tratar-me pelo que tu quiseres. – Não sorriu, de todo. Apenas encolheu os ombros com uma expressão indiferente. – Tu trabalhas num restaurante, não é? Podes dar-me um café?

Embora ele não se direcionasse a mim de uma forma totalmente rude, não pude evitar pensar que o rapaz que se encontrava à minha frente estivesse embriagado ou sob qualquer outro tipo de efeito que não lhe permitisse agir com lucidez. No entanto, ele não apresentava quaisquer sinais de embriaguez. Estava só a ser....estranho.

-Já viste que horas são? Nem sequer estou no meu turno de trabalho. – Tentei responder-lhe da maneira mais calma que eu conseguia, mas mesmo assim fui um pouco agressiva.

-É apenas um café.

-E eu sou apenas uma miúda a querer ir para casa. Não sou tua empregada. – Esbocei um sorriso sínico e continuei o meu caminho, apertando o meu casaco contra mim. As luzes dos candeeiros não pareciam ser suficientes para iluminar a rua, envolvida num silêncio assustador. Só se ouviam os meus passos e o saco de plástico a roçar nas minhas pernas que se moviam aceleradamente.

Uns ruídos soaram atrás de mim e, com o coração aos pulos, olhei para o caminho deserto que eu já havia percorrido.

Continuando o meu percurso, acelerei o passo, tentando chegar a casa o mais depressa possível.

Após os sons começarem novamente, corri até chegar à rua da minha casa, mas sendo agarrada por alguém, comecei a gritar, deixando o saco com comida cair ao chão.

Os meus gritos foram abafados por uma mão forte, tapando-me a boca, enquanto os meus braços eram agarrados por um braço musculado. As luzes eram fracas, fazendo com que eu não pudesse encarar a cara do indivíduo. Sussurrou perto do meu ouvido:

-Shh, não te vou fazer mal. – Era impossível eu sentir-me melhor com aquela afirmação. Os meus batimentos cardíacos voltaram ao normal quando eu percebi de quem vinha aquela voz.

-Então – Disse ele -, já me queres dar o café?


24 Days - H.S - AU - A REESCREVEROnde histórias criam vida. Descubra agora