1 - De volta para casa

2.4K 213 23
                                    

- Alicia. – chamei sentindo o desespero tomar conta de mim. Ela não podia estar apagando outra vez. – Alicia, acorde, pelo amor de Deus.Era uma tortura cada vez que ela apagava. Era como a ver morrer outra vez. Eu sentia todo o meu corpo reagir ao estado dela. Meus olhos perdiam o foco querendo verter as mesmas lágrimas que havia vertido naquele dia da batalha, minhas mãos tremiam ao se agarrar ao corpo dela e eu senti meu coração se comprimir de uma forma que eu nunca achei que fosse possível antes dela aparecer.Ela havia mexido com todo o meu mundo, colocando tudo de cabeça para baixo e me deixado louco. Antes de ela aparecer, tudo estava certo, organizado, cada coisa em seu lugar. Eu tinha minha vida, meu emprego, um status bom perante o maior Rei das Dimensões, tinha Clara. Era a vida que qualquer outro desejaria ter, e eu tinha tudo, até o momento que aquela princesa loira dos olhos esmeraldas surgiu na minha frente acompanhada do Príncipe. Depois que ela surgiu na biblioteca usando aquele vestido rosa e com os cabelos levemente cacheados, eu sabia – de alguma forma eu soube imediatamente – que ela me levaria à ruína. E levou. Nunca, em nenhum envolvimento com nenhuma das mulheres que passaram pela minha vida, eu pensaria em sacrificar minha vida por elas. Talvez Clara fosse a que chegou mais perto nesse aspecto, mas ela sempre havia sido como uma amiga que às vezes rolavam alguma coisa, nunca tinha existido amor de verdade – eu nem sabia que era capaz de sentir isso até que Alicia apareceu na minha vida. - Guilherme. – chamou a voz de Clara me arrancando dos meus pensamentos. – O que vamos fazer com ela? - Esperar que ela acorde. – instrui e ajeitei o corpo da mulher que eu amava no meio da cama enquanto o sangue manchava minhas mãos e tudo envolta. - Ela vai acordar? – perguntou o homem que Alicia chamava de Ka. - Ela tem que acordar. – respondi sentindo todo o desespero que eu sempre sentia quando a via naquele estado.Clara tocou meu braço como uma forma de conforto e olhei para ela deixando transparecer tudo o que eu estava sentindo. Ela era uma das poucas pessoas que entendia o que se passava por dentro de mim. Às vezes, eu achava que Alicia tinha certa dificuldade em entender isso, mas nós éramos tão diferentes que essa confusão era habitual.Senti, a prima da minha futura esposa, apertar meu braço de leve e depois levantar da cama. Ela fez sinal para que o novo bibliotecário fosse com ela e os dois saíram do quarto me deixando a sós com uma Alicia desmaiada e sangrando de uma forma assustadora. Tentei não olhar para a imagem dela, mas era impossível desviar os olhos. Mesmo sangrando e parecendo morta, ela continuava linda. A única coisa que me mantinha calmo naquele momento, era o movimento minúsculo do seu peito subindo e descendo enquanto ela respirava. Eu me agarrei a esse movimento e me obriguei a sair da cama.Caminhei por toda a extensão do quarto que havia sido meu por quase uma vida toda. Pouca coisa havia mudado ali, o novo dono do quarto não tinha muitos pertences espalhados no quarto, mas quanto a isso, eu também não tinha. Olhei para a cama outra vez e senti um sorriso começar a tomar conta do meu rosto, mas não era pela cena que ocupava ela naquele instante, era por uma lembrança que já parecia fazer séculos.A primeira vez em que eu havia levado Alicia ali. Ela estava tão calorosa, tão receptiva naquela noite, que eu lembrava com perfeição de cada detalhe, até daqueles que eu queria esquecer, como sua expressão quando a mandei sair do quarto.Ela havia ficado tão confusa, e então, chocada, até que veio a pior de expressões de todas, a de magoa, eu pude ver nos seus olhos a magoa que ela havia ficado de mim, eu senti em suas palavras a raiva que ela havia ficado quando percebeu de uma vez o que estava acontecendo. Como eu havia desejado ler a mente dela para saber o que se passava naquela cabecinha confusa.Eu pude ouvir os passos do lado de fora do corredor e parei de andar. Ninguém poderia saber que eu estava ali, seria o fim de tudo. Esperei que os passos parassem de ecoar pelo corredor e então voltei a sentar na cama. A quantidade de sangue já estava diminuindo, isso queria dizer que ela acordaria a qualquer hora, rezei para que ela abrisse aqueles olhos verdes o mais rápido possível. Passei a mão pelos seus cabelos curtos e senti a textura macia sob a minha palma. Eu sempre havia sido obcecado por aquele cabelo, na verdade, eu era obcecado por toda aquela mulher.A respiração mais forte e o peito subindo e descendo mais rápido me informou que ela estava prestes a acordar. Agarrei sua mão ensanguentada sobre os lençóis e esperei. Lentamente, ela começou a abrir os olhos e esperei até que ela se localizasse. Era sempre assim, quando ela acordava parecia não saber direito o que aconteceu por alguns segundos, e então seus olhos se iluminavam em reconhecimento e o alivio tomava conta de mim. - Alie. – falei acariciando sua mão fazendo-a virar os olhos na minha direção. – Como você está? - Como se tivesse apanhado de um lutador. – respondeu sentando e sorrindo para mim. - Você bateria mais forte que um lutador. – brinquei sorrindo de volta. - Provavelmente. – concordou rindo e se inclinou na minha direção. – Ainda não acredito que você está aqui. Você só pode estar ficando louco. - Você tem me evitado por semanas e quando Clara me ligou desesperado porque você desmaiou sangrando em cima dela, vim para cá assim que pude. – respondi. - Você não devia ter vindo. – repreendeu novamente. - Não se preocupe, nada vai acontecer. – respondi passando a mão pelo seu rosto. - Você sempre diz isso. – murmurou fechando os olhos enquanto eu acariciava seu rosto. Ficamos um momento em silêncio, apenas na presença um do outro, eu podia sentir todo o meu corpo despertando e querendo agarrá-la e possuí-la naquela cama mesmo, mas eu não faria isso, não enquanto ela estivesse coberta de sangue e parecesse tão frágil. Mais frágil que o normal. - Você está bem? – perguntei fazendo-a abrir os olhos. - Acho que não estou me sentindo muito bem. Devo estar cansada. – respondeu se inclinando mais na minha direção até ter sua cabeça deitada no meu peito. Passei meus braços envolta dela e a aconcheguei melhor contra o meu corpo. - Acho que você deveria descansar um pouco. –propus quando senti que ela começava a deixar seu corpo amolecer contra o meu. - Fique comigo. – pediu com a voz baixa e era impossível negar qualquer coisa quando ela usava aquele tom. - Estou aqui. – respondi passando as mãos pelos seus cabelos. - Fique o resto do dia. – pediu já um pouco sonolenta. - Eu ficarei. – concordei ignorando os riscos que eu corria ao ficar ali mais tempo do que devia. Eu faria qualquer coisa para tê-la todos os momentos entre os meus braços como ela estava agora.

Coração de Sangue - livro 2 da série Coração AzulOnde histórias criam vida. Descubra agora