4 - Falhas

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Alicia ainda estava da mesma forma de quando eu havia chegado ao castelo e isso já fazia quase uma semana, seu estado não melhorava, apenas ficava pior. Seu coração estava diminuindo o ritmo e Damen teve que cobri-la com um feitiço que a manteria respirando mesmo que seu pulmão não quisesse fazer mais o trabalho sozinho. Eu havia passado a semana toda ao seu lado enquanto Damen reunia tudo que era preciso para trazer Thales de volta e ela também. Clara mantinha um pé atrás com toda a história, mas havia prometido se manter quieta. O que estávamos prestes a fazer, provavelmente, nos mandaria direto para a guilhotina sem ao menos um julgamento antes. Eu já estava ferrado aos olhos da lei de Fantasiverden, uma falha descoberta e minha morte estava garantida. E Damen não estava em uma situação muito diferente depois do que houve na batalha. Ele apenas estava vivo e não tinha enfrentado um julgamento porque Alicia havia intervindo.Quando Eric entrou no quarto correndo para o lado de Alie na cama, levantei-me indo encontrar Damen na porta. Eu sabia que ela estava inconsciente, mas não sabia o quanto essa inconsciência estava tomando conta da sua mente e queria evitar que quando ela acordasse, corresse o risco de se lembrar de algo que eu falara com Damen.- Você conseguiu? – perguntei empurrando-o para fora e fechando a porta. - Está tudo pronto. – respondeu e paramos de falar quando ouvimos os passos de alguém se aproximando.- Vocês conseguiram? – perguntou Clara parando ao nosso lado.- Vamos fazer isso hoje à noite. – respondeu Damen e pude sentir quando Clara se retesou ao nosso lado.- Vai dar tudo certo. – acalmei-a.- Acho que vocês deveriam fazer tudo essa noite. Trazer o corpo de Thales, fazê-lo viver outra vez e então matá-lo, apenas para não dar tempo que algo aconteça com o corpo dele.- Eu também acho. – respondi virando a cabeça na direção de Damen esperando que ele se manifestasse.- Como vocês quiserem. – concordou.***Era noite quando nós começamos a nos aproximar do que um dia foi o castelo do maior vilão de Fantasiverden. O castelo de Thales era enorme e arrepiante, ainda mais com a tempestade que estava vindo de trás dele. Ajeitei Alicia nos meus braços enquanto subíamos as escadas que levariam a porta principal. Quando Damen abriu a porta, empurrando-a com o ombro, pude sentir meu queixo cair.Pelo lado de fora o castelo era assustador, parecia velho e pronto para cair aos pedaços a qualquer momento, porém, por dentro nada parecia velho e nem indicava que alguém tão perverso havia morado ali. Todo o castelo - pelo menos a parte que eu pude ver - tinha mobílias claras e limpas, não parecia estar fechado o tempo que havia ficado.Damen me indicou um divã e me dirigi para deitar o corpo desacordado de Alicia. Ouvi Clara fechando as grandes portas atrás de si e a vi se encolhendo de arrepio. O lugar por mais bonito e luxuoso que fosse, era arrepiante pelo simples fato de sabermos quem morou ali. Acariciei o rosto de Alicia antes de me afastar. Não havia sido fácil tirá-la do castelo sem ninguém notar.Primeiro: porque a todo o momento havia alguém entrando para ver se havia mudado algo no estado dela; segundo: corríamos o risco de sair e sermos vistos, então para resolver isso nos transportei para a casa do Damen de onde partimos em direção ao castelo de Thales; terceiro: tínhamos que dar um jeito de disfarçar a falta da presença de Alicia enquanto estivéssemos fora – para resolver isso, Damen colocou um feitiço de ilusão sobre o quarto, fazendo parecer que Alicia ainda estava na cama, adormecida.Observei Damen puxar uma enorme mesa de mármore para o lado do divã onde Alicia estava deitada e me afastei dando-lhe espaço necessário. Ele pegou algumas coisas dentro da bolsa que carregava e as espalhou sobre a mesa. Ele acendeu quatro velas, uma vermelha, uma azul, uma preta e uma branca, cada uma em uma ponta da mesa.- Para que as velas? – perguntou Clara se aproximando por trás.- Cada uma tem seu significado. A vermelha representa o coração de Thales e a preta o lado da luz que ele está. A azul representa o coração de Alie e a branca o lado da luz que ela está. – explicou tirando um livro de dentro da bolsa e abrindo-o sobre a enorme mesa. – Vou precisar das cinzas, Clara.Olhei Clara se afastar um pouco hesitante em direção a enorme urna prateada que ela havia trazido consigo. No centro da enorme urna estava gravado em letras altas o nome de Thales. Damen tomou das mãos de Clara a urna antes que ela mudasse de ideia e fez sinal para nos afastarmos. Contornei o divã para ficar do lado oposto da mesa e próximo a Alicia, Clara fez o mesmo parando ao meu lado.Ficamos os dois parados, tensos, um do lado do outro enquanto Damen se preparava para trazer o corpo de Thales de volta. Ele espalhou as cinzas por cima da mesa de mármore com cuidado, evitando que qualquer partícula escapasse da superfície. Por fim, ele respirou fundo e agarrou o livro aberto com as mãos firmes.Damen começou a murmurar palavras em latim, era como um canto, enquanto ele murmurava o fogo das velas ia aumentando, o ar começou a ficar gelado e as partículas de cinza começaram a se mover lentamente sobre a mesa. Desviei meus olhos das cinzas para Alicia e pude ver que uma enorme mancha de sangue estava começando a tomar conta da sua roupa. Abaixei-me ao seu lado e segurei sua mão com força como se isso fosse fazê-la parar de sangrar.As cinzas começaram a se mover mais rápido enquanto Damen repetia as palavras cada vez mais forte. O ar estava frio demais e vi, pela visão periférica, Clara se abraçar em busca de calor. Parecia haver um vento fraco dentro da enorme sala, mas envolta de Damen e da mesa de mármore tudo estava agitado como se eles estivessem no meio de um furacão. As cinzas começaram a perder sua cor e se transformar cada vez mais rápido em algo. Fiquei fascinado observando enquanto as cinzas em tumulto começavam a dar forma ao corpo de Thales.Senti um arfar vindo da direção da Alicia e olhei na sua direção. Ela continuava apagada, o sangue corria cada vez mais forte pela sua roupa e começava a pingar em forma de poça no chão, mas eu senti um leve apertar da sua mão na minha. Damen murmurou mais duas palavras como se estivesse lutando contra o vento que o rodeava e então tudo se acalmou.Em cima da mesa de mármore estava um Thales como o que eu me lembrava. Os cabelos loiros caiam sobre sua testa e mesmo apagado ele parecia sorrir. Peguei a estaca que estava no meu bolso de trás e a girei entre os dedos. Eu adoraria poder cravar aquela estaca no peito dele e matá-lo outra vez. Ouvi os passos de Clara se afastando em direção a Damen e vi quando ela tocou o rosto de Thales como se estivesse com medo de algo dar errado. - Ele está mesmo aqui. – sussurrou como se aquilo não fosse real. - Apenas falta lhe dar vida. – disse Damen e começou a apagar as velas.Senti a mão de Alicia se apertar mais forte na minha e me virei para seu rosto a tempo de ver quando seus olhos verdes esmeralda abriram em um espanto e ela se sentou rapidamente parecendo não estar conseguindo respirar. Agarrei sua mão com força na minha e senti um sorriso começando a se formar no meu rosto. Ela havia acordado.Senti um vento passar por mim e desviei meus olhos por um instante para ver o que era. Quando percebi o que havia acontecido fiquei apavorado. Isso não podia estar acontecendo. Olhei outra vez para a mesa de mármore e ela estava vazia, era como se nunca houvesse tido um corpo ali. Levei meus olhos em direção a Damen que olhava com a mesma cara de pavor em direção a porta aberta do castelo e então dirigi meu olhar para Clara que estava branca como uma cera.- O que vocês fizeram? – ouvi a voz de a minha noiva perguntar e senti todo um tremor pelo meu corpo.- Thales desapareceu. – disse Clara como se precisássemos de uma confirmação em voz alta.Havíamos falhado. Continua...

Coração de Sangue - livro 2 da série Coração AzulOnde histórias criam vida. Descubra agora