Welcome to hell.

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"A maldade do homem vive depois dele; a bondade é frequentemente enterrada com seus ossos."

Shakespeare.

Nove de janeiro de 1886, sábado (início de noite). Ilha de Wallasea, Essex, Inglaterra.

A carruagem sacoleja a passo que o corcel negro cruza as ruelas a trote largo. Balanço meus pés enquanto encaro a janela, a noite já cai e tudo se ilumina.

- Sinto incomodar. – Digo. – Mas meu pai, por que a nova mudança de internato?

Os olhos negros me fitam sem emoção, depois olham pela janela, deve ser a nossa característica não falar muito. Depois de um longo suspiro ele começa:

- Sabe sua tia Mariel me indicou esse internato, seu primo Raphael estava alojado lá.

- Mas meu pai, Raphael faleceu. – Sussurro.

Um sorriso surge em seus lábios, mas ele logo o afasta com um aceno de mão, algo como que dissesse: "Já sei, é comum." Desisto de um diálogo e volto a fitar a janela, agora enevoada. O cais deve estar longe. Espero chegar logo a ele...

- Tome, para você. Quero que leia.

Encaro o embrulho em meu colo e ergo as sobrancelhas, um presente? Mas meu décimo segundo aniversário está tão longe... Rasgo o papel pardo e leio as primeiras letras em dourado:

- Alice no país das Maravilhas...? Ora, meu pai. – Deslizo o livro e o estendo de volta. – Sabes que não gosto de ficções sem sentido ou livros que não sejam...

- Não estou pedindo para ler. Estou mandando, goste ou não.

Emudeço e encolho meus ombros recolocando o livro em meu colo, ele nunca me dá ordens tão explícitas assim, resmungo sozinho e ele volta a sorrir e diz:

- Não paguei quatro xelins nisso para você desperdiçar.

- Posso devolver o dinheiro, só não quero...

- Leia. – Ele acena novamente. – Vai ser útil em algum momento de sua vida, posso lhe garantir.

- Se o senhor diz. – Mas não sei quando um país das Maravilhas vai surgir em meu mundo...

- Lilith receberá um também, você nem a viu, certo?

- Não. – Sorrio. – Ela é irritante, prefiro manter distância.

- Isso é por que ela pode ficar em casa e você não? – Seu olhar me zomba, como se pudesse ver o quão explícito isso estava.

- Obviamente não. Ela é uma garota, gosta de fadas e outras coisas inexistentes. Irritante.

- Da próxima vez então lhe deixarei em um internato misto para se acostumar com garotas, bem, se houver uma próxima vez...

Conviver com a morte faz parte do nosso dia-a-dia, afinal nunca duramos muito, mas dessa vez há algo diferente em sua voz...

- Qual o nome do novo internato?

- St. Francis um belo local, lá você terá muito contato com a natureza e a religião, terá amigos também... Ou bem, ao menos tente ter amigos.

- Amigos são pesos mortos a se carregar, eu não preciso de pesos mortos em meus ombros.

- Tudo bem...

The Ripper - Saga Maurêveilles - Livro umOnde histórias criam vida. Descubra agora