Crème Glacée

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"Este drama múltiplo nunca,

nunca será esquecido!

Com seu Fantasma

sempre perseguindo

por uma multidão que não o alcança,

em um círculo que volta

sempre ao lugar inicial,

e muito de Loucura, e mais Pecado

e mais Horror – a alma da intriga"

Edgar Allan Poe

Vinte e um de janeiro de 1886, domingo (noite). Ilha de Wallasea, Essex, Inglaterra.

Corri em seu encalço até chegar ao subsolo, Dianna conhecia muitos caminhos secretos e atalhos que deixariam Christopher com os olhos brilhando, mas o que estou pensando? Eu vou mostrar esses caminhos a ele amanhã, se ele estiver bem, claro...

- Aqui. – Ela sussurrou abrindo a porta rapidamente. Passei correndo e me assustei com a cena.

Christopher estava acorrentado na banheira cheia, parecia estar dormindo, com os olhos cerrados e uma expressão neutra no rosto, desde quando ele está aqui? Caminho hesitante e encaro-o, seus lábios brancos e rachados, a pele mais pálida que o normal e uma fina linha roxa sobre as pálpebras claras cerradas.

- Christopher...? – Chamo e para minha surpresa as íris cinzentas se focam em meu rosto. – E-eu... E-eu estou tão...

- Chorão... – Sua voz estava áspera demais. – Saia daqui.

- O que...? – Indago deixando minha indignação transbordar.

- Não quero que você fique aqui.

- Por quê? Eu...

- A culpa é sua.

Calei-me e o encarei, espero que ele perceba o que está fazendo, ele passou dos limites, por que está agindo assim?

- A ideia do piano foi sua. – Declaro.

- NÃO É ISSO!!!

Ele se debate e vejo as bordas da banheira manchadas de vermelho, as correntes estão dilacerando seus pulsos finos, e com o súbito movimento voltaram a sangrar, ele cerra os dentes e desvia o olhar.

- O que foi? Acertaram sua cabeça e você ficou pior? – Disparo. – O que você tem?!

- Você me traiu...

Encaro seus olhos cinzentos marejados, eu o traí, como? Eu não fiz nada desde a noite de ontem, a não ser que dormir seja considerado uma traição. Ele gemeu encobrindo o sangue, mas a água da banheira já estava mudando de cor.

- Como, Christopher? – Sussurrei suplicante.

- Você não... Você... – Ele abaixou os olhos chorando. – Cain eu sou o pecador aqui, mas você...

- EU O QUE?! – Descontrolei-me e ele se debateu fazendo a água subir um pouco. – Primeiro você se mostra carinhoso comigo e fica fingindo ser meu amigo e agora mudou completamente! Você merece pagar por tudo isso!!!

Mordo o lábio ao perceber o real peso de minhas palavras. Nem ao menos sei o que ele queria me dizer e já fui me descontrolando, dificilmente voltaremos a ter o mesmo relacionamento de antes. Mas não vou voltar atrás agora, não pedirei desculpas por isso.

The Ripper - Saga Maurêveilles - Livro umOnde histórias criam vida. Descubra agora