Capítulo 15

64 5 4
                                    

Impaciente, fui à aplicação do banco no meu telemóvel para ver se a quantia do seguro de vida dos meus pais já lá estava, e sim. Estava. Não consegui evitar um riso. As minhas colegas de trabalho olharam para mim de uma forma estranha. Victoria, confusa, perguntou de imediato porque me estava a rir. Achei por bem não lhe contar o que se passou, pelo menos por enquanto. Disse-lhe apenas que me lembrei de uma piada.

*

Passei o dia inteiro a pensar na dádiva que me apareceu na manhã, sem me conseguir concentrar em mais nada que me apareceu à frente. Sinto que o universo se virou para o meu lado, depois de tantas coisas erradas terem acontecido na minha vida. Ao sair da redação, reparo que a minha irmã está parada com o seu Fiat à porta. Apesar de não termos combinado nada, dirigi-me ao carro porque calculei que estivesse à minha espera. Ao bater no vidro do carro, ela assusta-se. Vejo-a com um telemóvel que não me é familiar.

— Olá — digo-lhe com um ar zangado.

— Uh... que mau. Tem calma, é só um telefone.

— Não é que mau, Helen. É o descontrolo que tu tens por comprar coisas com dinheiro recém-chegado — digo ao sentar-me no lugar do acompanhante.

Não me reponde.

— Quanto custou? — pergunto, fixado nela.

— Mil dólares — diz, olhando para mim.

— Mil dólares? Oh, mas que maravilha. Já que vamos gastar o dinheiro todo, porque não comprar uma mansão em Paris? Não, melhor, vamos comprar a Torre Eiffel.

— Porque não os dois? Temos dinheiro para isso — diz, olhando para mim com um risinho malévolo.

— És impossível. Conduz — aponto para a estrada.

Prosseguimos pela Oitava Avenida para irmos beber um café a uma doce pastelaria no Central Park.

Enquanto estou em contacto com a natureza, consigo refletir sobre a minha vida atual: com a chegada do seguro, não vou ter que voltar a ser tão poupado com o dinheiro. Não vou ter que voltar a ter conversas como aquelas com a minha irmã. 20 biliões de dólares... É difícil de acreditar, mas não é impossível de acontecer.

— Olha, tive uma ideia — diz a minha irmã, apanhando-me tanto de surpresa que cuspi um bocado de cupcake que estava na minha boca.

— Credo mulher, não podias ser um bocadinho mais subtil? — digo, limpado o queixo — Vá, fala.

— E se... abríssemos o nosso próprio atlier? — pergunta a minha irmã, aproveitando-se mais uma vez do facto de termos recebido dinheiro.

— Helen, tu sabes que eu não percebo nada de moda.

— Oh, mas tu serias um ótimo sócio, tu sabes gerir o dinheiro, fazer negócios e isso tudo — fico lisonjeado com o comentário da minha irmã.

— Mesmo assim, para saber lidar mesmo bem com moda é preciso tirar um curso, e não estou com paciência para isso. Se quiseres, abres o teu atlier, e eu posso tratar da contabilidade — proponho.

— Ok, acho boa ideia — diz a minha irmã, sem ter muito por onde escolher.

— E depois, como eu vou estar tão perto de ti, se achar piada, posso me juntar a ti — continuo.

Do nada, ela estende-me a mão para um cumprimento.

— Será um prazer trabalhar consigo, Irmão — rio-me da sua pequena mas adorável idiotice, e estendo a mão para "fechar o negócio"

Levantamo-nos depois de pagarmos a conta, vamos a uma loja de mobília comprar umas coisas que se danificaram com o vandalismo.

*

Alugámos um camião para entregas ao domicílio, hoje não me apetecia nada andar a carregar pesos.

Quando os homens das entregas saíram do meu apartamento, a minha irmã fez-me o obséquio de retirar os plásticos que revestiam as novas cadeiras rústicas da sala. Apesar da decoração da sala ser contemporânea, as cadeiras ficam bastante bem enquadradas lá.

Apesar de ser muito contra, a minha irmã convenceu-me a ir jantar ao restaurante mais caro da cidade (que tivesse vagas).

Para nossa surpresa, o primeiro restaurante para o qual ela ligou, é o mais chique (e o mais caro) da cidade, e tinha vagas, para aquelas pessoas que o merecessem. As pessoas são todas iguais. A minha irmã fez-me uma carinha de cachorrinho ao repetir a frase do homem que estava ao telefone. Espero que a refeição não passe dos 300 dólares.

— Percebes que se gastares o teu dinheiro todo em coisas desnecessárias eu não te vou emprestar nenhum — digo, depois de ela ter desligado o telefone.

— Sim, sim. Vá, vamos preparar-nos para o jantar, hoje vou vestir o meu melhor vestido. Vemo-nos daqui a 1 hora, depois volto para te vir buscar — diz a minha irmã apressando-se a agarrar todas as suas coisas.

— OK, vai lá — digo, a caminho da porta.

— Adoro-te — diz, ao mesmo tempo que fecha a porta.

Não sei muito bem o que vestir. O meu roupeiro é terrível. Tenho um terço da roupa que lá caberia. Aposto que aquele seria o roupeiro de sonho para muita gente, mas não é o meu. Depois de um banho relaxante, estou com a toalha na cintura, a escolher que calças vestir. Enquanto decido, o meu companheiro de casa entra no roupeiro, e senta-se à porta, como se tivesse feito alguma coisa de mal e agora estivesse a tentar disfarçar.

— Olá amigo — digo, fixado numas calças que estou a segurar. Depois, ele boceja.

Pronto. Quando acabo de vestir o smoking que vesti no casamento da minha tia Anne no ano passado, olho-me no espelho e acho que estou com um ar super sensual. Será demasiado? Vou pedir a opinião ao Puki. Ele ladra uma vez, mas quase ladra uma segunda, normalmente quer dizer "estás bem, mas podias estar melhor". Puxo um pouco pela cabeça para decidir o que fazer. Será que tiro o laço, ou simplesmente deixo o casaco aberto? Decido fazê-lo. Depois de desabotoar os botões do casaco, olho para o Puki e ele ladra uma vez. Baixo-me e beijo a cabeça peluda daquele maluco. Adoro o meu cão.

45 minutos depois de ter saído, a minha irmã está de volta a minha casa, deve estar mesmo entusiasmada.

Como tem a chave, não preciso de me deslocar até à porta. Entra no meu quarto depois de bater à porta. Quando entra, os meus olhos arregalaram-se. Estava com um delicioso vestido justo branco, que não tinha mangas e que ficava uns 20 centímetros a cima dos joelhos. Trazia uns sapatos de salto altíssimos pretos, com uma bolsa à estilo envelope preta e com uma boa, mas não demasiada maquilhagem: está linda.

— Uau— digo, sem tirar os olhos dela.

— O que foi? Achas demasiado? — pergunta, preocupada. É incrível, num vestido daqueles, uma mulher vulgar ficava com uma barriga evidente, mas como a minha irmã pratica exercício regular, não se nota de todo uma barriga.

— Não, estás linda. Só que quem estiver a olhar para nós dois pensa que nos estamos a casar — digo entre risos — Só falta um bouquet.

— Puki, o que achas? — diz ela, dando voltinhas para o cão a admirar.

Puki ladra três vezes. Nunca percebi o que isso significava, deve estar com ciúmes.

Sentamo-nos no carro da minha irmã para nos dirigirmos ao restaurante.

A receção daquele restaurante é-me invulgar, chegou montes de gente ao pé de mim a perguntar "posso levar o seu casaco, senhor?" só pensava "larguem-me, o casaco faz parte da toilette". Quando nos sentámos pensei que finalmente estava a salvo daqueles vândalos. A minha irmã está mais que habituada a estas situações. Ela vem jantar regularmente com John, quando cá está, claro, daí que ela esteja tão habituada a gastar dinheiro.



A Vida (Não) É BelaOnde histórias criam vida. Descubra agora