::Capítulo 2::Cristopher

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Acordei de súbito com um baque estrondoso de algo maciço caindo no chão, e em seguida uma cortina sendo arrancada... Sabia que um ladrão ou um rebelde não poderia ser, porque tínhamos segurança demais que impediria isso de acontecer.

Olhei ao redor com os olhos ainda embaçados e encontrei, no chão, um corpo tentando se desvencilhar de uma cortina vermelha que segundos antes estava presa à minha cama de dossel. Percebi que a pessoa soltava gritinhos agudos e com certeza era uma garota. Resolvi ajudar ela porque aquilo demoraria mais um mês inteiro se eu não interviesse.
Eu desci da cama e puxei a cortina de cima da moça, ela conseguiu rolar para fora. Não vi seu rosto, mas pelo uniforme encardido deduzi ser uma criada, talvez minha nova criada de quarto. Ela mantinha constantemente a mão no ombro esquerdo enquanto se levantava do chão. Consegui ver seu rosto, era suave e doce como uma orquídea, mas ao mesmo tempo era determinado e persistente como um cacto no deserto.

-Você está bem? Se machucou? - Perguntei a ela. Ela me olhou como se eu fosse um fantasma, mas não me olhou nos olhos, pois havia uma regra ridícula que proibia os servos de olharem diretamente nos olhos de seus superiores. -Me desculpe alteza, eu escorreguei e caí, foi um acidente, mas eu vou pagar tudo e... - Ela começou a me explicar, atropelando as palavras.

- Não precisa, eu entendo que foi um acidente, e eu nem gostava dessa cortina. - Eu a interrompi.

Ela pareceu se acalmar um pouco.

-Como é o seu nome, se me permite saber?- Resolvi perguntar a ela.

-Eu me chamo Rebecca Bones, alteza.- Ela disse, se curvando para mim como se eu fosse um deus.

-Oh! Pelo amor do bom Deus, eu não sou ele para ter o direito de que as pessoas se curvem diante de mim. Por favor, se levante.- Eu lhe dei a sua primeira ordem, e era irônico por que a primeira ordem era não seguir uma antiga regra.

-No que desejar senhor, estarei ao seu dispor.- Assentiu, recolheu a bacia de roupas sujas e se levantou, ou pelo menos tentou.

-Ai! - Exclamou, levando a mão direita ao ombro esquerdo.

-Você está ferida. Me permite ajudar? - perguntei.

-Mas, senhor... Isso não iria contra as regras?- Perguntou, um tanto emcabulada.

-Acho que nunca foi contra as regras ajudar uma pessoa que necessita ajuda. - Eu lhe disse e fui ao meu banheiro pegar o unguento, a agulha e a seda.

Quando voltei ela estava tentando puxar o ombro do uniforme sem que doesse. Me ajoelhei ao seu lado, abri o unguento e esperei ela acabar. Quando acabou, eu apanhei um pouco do unguento em dois dos meus dedos e apliquei uma grossa camada em cima do corte profundo de quatro centímetros. Esperei secar um pouco e limpei o excesso. Coloquei na agulha a seda e em seguida Rebecca me perguntou:

- O senhor nunca teve uma infecção por conta da seda?

-Nunca, pois essa seda que uso é embebida em unguento e óleos com propriedades de cura. Acho que assim o corpo não as rejeita.- Respondi à ela. .

Ela sorriu simpaticamente. Eu comecei a sutura e ela evitou olhar para o ombro, mordendo o lábio inferior de dor. Quando acabei, apliquei mais uma camada grossa de unguento e deixei que ela puxasse o colarinho do uniforme para cima do ombro.

-Muito obrigada, alteza. Como posso retribuir?- Disse ela sinceramente.

- Não é necessário, apenas me prepare do meu banho matinal.- Respondi.

- Estou indo senhor, o que deseja que eu coloque na água?

-Coloque qualquer coisa, não fará diferença hoje.

Três outras criadas entraram no quarto trazendo recipientes com água quente para o banho, os deixaram no banheiro e foram embora.
Enquanto eu escolhia a roupa que usaria, conseguia ouvir o som confortável da água enchendo a banheira, dos óleos e essências despejados... Tudo me acalmava. Enquanto eu me banhava, conseguia pensar melhor nas situações da minha vida. Como o casamento arranjado com uma garota mimada e cruel, a confecção das roupas para o casamento, os presentes para a noiva, boas maneiras com a noiva, aula de dança com a noiva, ensaio do casamento com a noiva... Minha vida tinha se resumido a agradar uma noiva que não queria.

O Príncipe e a ServaOnde histórias criam vida. Descubra agora