::Capítulo 14:: Rebecca

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Eu estava comendo feito uma condenada, tenho de admitir, mas tive de parar quando Cristopher me fez a seguinte pergunta:

-Então... Vai me contar o que aconteceu?
Parei de comer e depositei meu pedaço de carne em cima de uma folha. Respirei fundo e comecei.

-Você não se lembra de nada mesmo?- Perguntei, antes de mais nada. Eu sabia que ele tinha batido a cabeça e provavelmente não se lembraria.

-Me lembro dos rebeldes invadindo meu quarto e de Amelia dizendo ser uma deles, me lembro também de sentir o cheiro de minhas essências de banho favoritas, mas pareciam distorcidas...

-Correto. Os rebeldes invadiram seu quarto e queriam nos matar, começamos a lutar com eles, você teve este ferimento e desmaiou. Então eu corri para o banheiro e derramei essência em tudo, sem que ninguém percebesse. Depois ateei fogo e deixei que o quarto queimasse, o que funcionou, já que os rebeldes fugiram. Em seguida, eu arrumei duas bolsas de emergência e fugi com você desacordado pela janela até aqui.
Percebi as suas feições e notei que ele estava confuso.

-E você me carregou até aqui?- Perguntou.

-Basicamente. Eu lhe enrolei nos lençóis e arrastei-o.- Respondi.
Ele pensou durante um longo período, talvez estivesse mentalizando a cena.

-Obrigada.- Disse de repente.- Você me salvou.
Eu cheguei para perto dele e aconcheguei a cabeça em seu ombro.

-Não é necessário agradecer. Eu não fiz mais do que a minha obrigação, a gente costuma salvar a vida de quem amamos, mesmo que isso signifique dar a nossa própria vida no processo.- Digo-lhe.
A penumbra começa a deslizar sobre as árvores a nossa volta e decidimos começar a montar o acampamento. Cristopher vai pegar lenha e algumas folhas de bananeira para fazer o coberto do nosso abrigo. Eu apanho lenha para alimentar a fogueira. Quando já está quase escuro, nós começamos a montar uma pequena área coberta para nos abrigarmos da chuva, caso ela viesse. Cobrimos também o chão com as folhas grandes de bananeira e espalhamos o cobertor de pele por cima.

Quando terminamos, o breu já estava começando a consumir a paisagem lentamente, aos poucos. A fogueira não apagara, e nos reforçamos ela para garantir que iria continuar assim mesmo. A fogueira era o único ponto de luz visível na floresta.

* * *

Acordamos e comemos as frutas que haviam restado do dia anterior, então, devidamente alimentados, partimos para o interior mais denso da floresta e conseguimos colher mais algumas frutas, encontramos até um cacho de bananas começando a amadurecer. Construímos uma cesta de madeira flexível para pegar alguns peixes, e com sorte conseguimos pescar dois bagres médios. Limpamos eles e enrolamos nas folhas de bananeira para assar em espetos por cima da fogueira. Comemos um peixe inteiro e guardamos o outro em uma das bolsas. Fervemos um pouco da água do riacho para reabastecer os espaços vazios das garrafas. Estava concentrada quando Cristopher perguntou:

-Mas... Você tem um objetivo?
Eu não entendo as entrelinhas da pergunta.

-Como assim um objetivo?- Pergunto.

-Você tem um lugar como destino ou vamos simplesmente vagar pela floresta até achar algum lugar seguro?- Ele responde.

Então eu narro a história sobre como meu pai havia dito que conhecera minha mãe e sobre a história do exército secreto.

-Parece loucura... mas ninguém pode saber ao certo, não é mesmo?- Ele começa a falar.- Afinal, esta floresta deve atravessar pelo menos quatro reinos!

-Aham...- Bocejo.- É por que temos que partir o quanto antes.

-Mas você sabe onde se localiza este Quartel General?
Paro de me espreguiçar rapidamente.

-Bem... meu pai dizia se encontrar no centro da floresta, um pouco ao leste.

-Mas como vamos saber onde estamos? E onde está o leste?

-Eu não sei.- Digo-lhe sinceramente, olhando em seus olhos.
Era óbvio que ele achava que eu era uma maluca, traçando uma missão suicida e tentando levar ele junto para a morte. Eu começo a chorar desesperadamente. Ele me abraça forte.

-Ei... Espere um minuto.- Ele diz e vai em direção às bolsas, de onde tira um pedaço de metal vagamente reto e pequeno, a argola de um chaveiro desentortada. Ele pega uma garrafa quase vazia, da qual bebemos água enquanto comíamos o peixe e a quebra em uma pedra.

-Ei!- Grito confusa.- O que está fazendo?
Então ele enche a parte inferior da garrafa quebrada com água, apanha uma pequena folha no chão e a coloca dentro para boiar. Depois apanha a argola desentortada e a esfrega freneticamente nos cabelos, é aí que me dou conta de seu plano brilhante. Ele estava construindo uma bússola rudimentar com um pedaço de metal imantado nos próprios cabelos! Era simplesmente genial. Ele deposita a argola que não era mais argola cuidadosamente em cima da folha. Esperamos.

-Cristopher! Que idéia ótima!- Grito.
Ele sorri para mim. Então o ponteiro de nossa bússola improvisada começa a indicar o norte.

-Estamos ao sul da floresta.- Constatou ele.- Precisamos caminhar para onde meu braço direito está.
Ele aponta a direção com o braço direito.
Recolhemos as coisas e eu fico encarregada de levar a bússola, enquanto Cristopher carregava as bolsas.

* * *

Durante a caminhada coletamos mais frutas e caçamos um esquilo para a viagem. Fizemos também uma parada para acendermos uma fogueira e ferver mais água, desta vez de um pequenino lago, a fim de repor a quantidade que já havíamos bebido.

De repente eu sinto uma dor muito forte no tornozelo direito e sem querer, despenco no chão.

-Oh! Rebecca, o que houve?- Cristopher fica alarmado e faz menção de se agachar perto de mim.

-Não! Não se abaixe!- Falo isso por que sei que o que causou a minha dor não foi embora ainda. Avisto uma serpente média, pronta para dar o bote novamente.

Me levanto o mais rapidamente possível e Cristopher faz o mesmo, de modo que a cobra abocanha somente o ar. Cristopher apanha uma pedra no chão e a joga na cabeça da cobra, esta fica presa e desorientada, então ele acalca com bastante pressão a pedra na cabeça no animal, com tanta pressão que chega a rasgar o pescoço. A cobra fora reduzida a uma cabeça amassada de um lado e um corpo inerte do outro.

Eu olho para o meu tornozelo e entro em pânico. Acabou. Era o fim. Eu não conseguiria mais caminhar e ia me tornar um peso para Cristopher. Eu ia finalmente morrer.

O Príncipe e a ServaOnde histórias criam vida. Descubra agora