Unpack Your Heart

Encanto

Mabelle não compreendeu porque sua garganta de repente ficou seca. E sua expressão passou de um sorriso amigável para uma boca aberta em um grande O, em seguida rapidamente disfarçada por uma tosse, e mais um sorriso sem graça.
Ela já tinha visto diversos rapazes pelo percurso que fez. E achou, particularmente, quase todos iguais. Mesmo cabelo loiro,olhos claros, branco quase fantasma...
Qual o problema daquele cara?
Certo,ele era loiro. Mas alguns fios escorria por um lado do rosto devido ao suor. Suor. Mabelle afastou o pensamento nada ingênuo que lhe veio com a palavra.
Ele estava com roupa escura,e obviamente estava correndo também. Sua boca era apenas uma linha fina, quase sem lábio. Havia uma barba ralinha envolta do queixo. E seus olhos...
Oh, God!
Eram tão cativantes! Verdes, de uma beleza tão singela, com pequenas linhas de expressão em volta. E por falar em expressão...
Ele estava sorrindo pra ela! Seria possível uma covinha matar uma pessoa?
Deve ter parecido uma eternidade, mas não se passaram nem dez segundos nessa análise. Até Mabelle tossir outra vez, voltar a ficar sã e dizer:
"Pois é, desculpa aí, estava admirando a vista. " Ela não soube como essas palavras saíram de sua boca. Apenas observou enquanto o sorriso dele se transformava em uma gargalhada. Que fofo. Que fofo nada, ele estava rindo dela.
Mabelle fechou a cara. Só não sabia se pra risada ou pela beleza dele. E ele parou imediatamente.
"Me desculpe, senhorita. Mas não entendi nenhuma palavra do que você disse até agora! Você é daqui?." Sua voz era meio rouca, e as palavras pareciam frases eróticas passando por aquela boca. Mais uma vez se concentrou em procurar sentido real nas palavras dele.
Seria possível ser menos idiota? Esbarrar em alguém, e ainda falar português em solo alemão diante de um pedaço do céu?
"Ah, desculpe! Meu primeiro dia aqui... Sou do Brasil!" Deu um sorrisinho. E uma dancinha da vitória internamente por ter conseguido pronunciar tudo certo.
O sorriso dele desapareceu por um momento, mas voltou logo em seguida.
" Brasil? Muito bom!" Falou baixinho a olhando de cima a baixo. Parou ao encontar o olhar de Mabelle.
"Quer dizer, é um lugar muito lindo." Mabelle manteve a cabeça erguida, encarando aquelas águas verdes.
" Verdade, tem grandes encantos. Impossível não se apaixonar! " Essas foram as palavras de Mabelle.
Ela não se reconhecia. Flertando com um estranho em seu primeiro dia na cidade. Quem diria...
"Acredito em você. E espero um dia ter o prazer de conhecer essa maravilha que Deus criou."
Ele passou a mão no cabelo retirando os fios que quase chegavam à seus olhos. E seu celular tocou. E ela reconheceu a música de imediato.
E começou a rir escandalosamente. Wannabe. Era uma de suas preferidas
do karaokê. Ele puxou o aparelho do bolso e a música parou. Olhou sério pra Mabelle e ela cessou o riso.
Ele parecia dividido entre ficar bravo ou rir também.

Por fim, a gargalhada venceu. E era bem possível ela ter um ataque cardíaco naquele momento. Ele estava rindo, meio engasgado, um certo brilho nos olhos, enquanto buscava por fôlego. Ele era ainda mais lindo fazendo isso.

" Eu. Posso. Explicar.", disse,ainda buscando o ar e finalizando a sessão de risos. Sua gargalhada era estranha e fofa ao mesmo tempo. Como um som de um pássaro exótico.

" Tenho certeza que pode. Gosto não se discute..." . Mabelle zombou.

"Não é isso,é que o Auba...", ele se deteu no meio da frase. " Um amigo meu, fez isso. Pagamento de uma aposta boba."

"E aposto que era esse amigo te ligando, não é?" Brincou novamente.

" E o que você ganha se estiver certa?" Nesse momento, seus olhos se fixaram. E os dele brilhavam maliciosamente. Mabelle estava completamente desarmada,mas conseguiu responder baixinho:

" Só o seu nome."

" Marco Re... " E mais uma vez parou.
" Só Marco.

Mabelle ainda estava hipnotizada. Mas sabia que também tinha que quebrar o encanto. Não estava ali pra isso. Dar um piti de adolescente quando via um homem bonito. Mesmo ele sendo mais que isso.

"OK. Sr. Só Marco. Até algum dia..."
Afastou o rosto, e deu meia volta, seguindo caminho pra sua casa. Não esperou sua resposta.
Não viu sua cara embasbacada.
Nem sua mão estendida em  sua direção.
E também não viu o brilho de seus olhos aumentar ao vê - la partir enquanto o pôr do sol a iluminava.

E o encanto tinha apenas começado.