.....Naquele dia eu voltei do colégio de carro. Minha mãe e a de Harry ficaram muito preocupadas conosco devido o assalto e começaram a nos vigiar. Ou seja, nós não poderíamos mais sair de casa sozinhos. O que foi uma grande merda, devido ser uma das nossas coisas favoritas. Agora precisávamos andar em lugares movimentados, estarmos acompanhados de alguém, e voltar antes das 20h. Esse assalto contribuiu para que as nossas mães criassem um elo malign- quero dizer, um elo de amizade a favor da nossa criação. Claro, é esse o sentido da amizade.
Respira fundo.
Eu fiquei pensando em Harry nessa situação. Acho que pelo fato de ser cego, todos queriam sempre estar à sua disposição para assistência-lo. E por isso ele ficava sozinho para lhe dar a sensação de independência. Eu o admirava por causa disso.
Meus pensamentos acabaram desviando a minha atenção do almoço ali na minha frente. Olhei para o prato de macarrão e dei uma pequena garfada. Desceu no meu estômago totalmente contra minha vontade. Meu irmãozinho olhava bem atento para a pequena televisão da sala de jantar, onde passava um desenho patético — que eu tinha certeza que o autor fumava alguns baseados antes de criar os episódios — chamado A Hora De Aventura. Minha mãe lavava os pratos na cozinha, e eu voltava a brincar com o macarrão no meu prato, me distraindo, completamente sem fome. Eu estava sem fome porque uma ansiedade atingia todo o meu corpo. Eu adoraria sair de casa. As imagens do rio Cypress Gardens passavam a todo momento em minha mente, e o que eu mais queria era ir lá novamente. Malditos sejam aqueles delinquentes que nos atacaram naquela noite e deixaram minha mãe preocupada. Malditos sejam eles que roubaram o meu único, e preferido, meio de locomoção, a minha querida bicicleta. Malditos sejam.
— Mãe? — a chamei. Minha mãe me encarou por cima do balcão, onde limpava-o. Ela me respondeu com um "hum" e esperou que eu prosseguisse. — Queria sair. — encostei meu queixo em minhas mãos e apoiei os cotovelos sobre a mesa. Tentei fazer aquela cara de cachorrinho que caiu da mudança, para tentar amolecer o coração dela, mas em resposta, minha mãe só franziu as sobrancelhas.
— Não posso te levar, Alene. Tenho que ir à padaria hoje, temos uma encomenda grande para entregar e eu não posso deixar Tracy tomando conta novamente. — ela disse, referindo-se a gerente de sua padaria.
— Eu poderia pegar um ônibus, ou ir a pé...— eu realmente não estava com trauma nenhum da noite anterior. Eu tinha saído viva. Eu não iria me privar das coisas boas que a vida, por causa de uma simples merda de violência. Violência tem em todo lugar. Se eu ficasse com medo sempre, nunca iria viver.
Olhei para o rosto de minha mãe e ela me encarava inconformada com minha resposta, até porque eu sabia das regras que ela havia imposto de não sair. Minha mãe abriu os lábios diversas vezes tentando falar algo, mas algo a impedia de continuar. Seu cenho se franziu novamente, e ela se virou para limpar o fogão, evitando minha cara de cachorrinho.
— Não. — Suspirou. — Quase te perdi ontem, não vou me arriscar em fazer de novo. — E ela voltou a limpar furiosamente o fogão, um hábito estranho de quando está nervosa.
Senti vontade de afundar minha cara no macarrão em meu prato. Não haveria sobrevivência em ficar em casa. É como estar presa em cativeiro. Estava me sentindo naqueles filmes de terror, quando a mocinha fica presa em um labirinto tentando achar a saída, e monstros correm atrás dela, e a mocinha acaba não encontrando a saída e morre. Nesse caso, não tem monstros me perseguindo — não mais porque eu descobri que o fantasma era Harry —, mas mesmo assim eu me sinto como a mocinha.
Olhei para o meu irmãozinho, que encarava a televisão com um sorriso enorme. Na tela, aparecia um cachorro que se esticava parecendo uma lombriga gigante, enquanto um garoto, tentando imitar o mickey com aquele capuz, cantava feito um idiota quando aparecia um arcoíris em cima de suas cabeças. Sinceramente, na minha infância os desenhos eram mais legais e com sentido. O sorriso de Valentim para o desenho era algo tão puro, que mesmo que fosse uma animação sem nexo, somente o rostinho angelical de meu irmão conseguiu provocar—me um sorriso. Fiquei imaginando, "E se fosse o meu irmão em meu lugar? E se fosse esse anjinho a receber uma ameaça com uma faca afiada nas costas?" Se isso acontecesse eu não me perdoaria pelos meus atos. Iria sentir vontade de mandar um assassino de aluguel matar os delinquentes. Os pesadelos se tornariam constantes todas as noites. Eu ficaria a andar em sua cola. E a vida dele se tornaria casa para escola e escola para casa.
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He Can't See Me • h.s
FanfictionHarry Styles é um jovem pintor que ama pássaros. Porém, não é um rapaz tão comum assim. Excêntrico é a palavra que o descreve. A menina ruiva, Alene, que adora pedalar, conhece o garoto de cabelos cacheados na Carolina do Sul. Ninguém imaginaria...