História do Lobisomem

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Espero que não tenha sido uma omissão de minha parte eu não ter falado sobre mim mesmo. Me chamo Marcos. Profissão: Alquimista. Ah, e eu sou um lobisomem, então, não fica muito difícil de se chegar à conclusão de que eu não vivo minha ideia de uma vida normal.

Imagino que o resto das outras raças se pergunte o porquê de nós, lobisomens, muitas vezes lutarmos em nossa forma humana, sendo que nossas formas lupinas talvez sejam a coisa mais forte dentre tudo o que pensa, à exceção dos deuses. Bem, deixa eu te explicar: a prata não apenas é a única coisa capaz de nos matar, como ela nos mata com uma facilidade absurda. Em nossa forma lupina, um arranhão provocado pela prata pode virar uma coisa nojenta e gigante, com uma cor horrível, e nos matar de infecção. Porém, em nossa forma humana, somos (obviamente) iguais aos humanos, tanto com relação à nossas forças quanto em relação à nossas fraquezas, e humanos não morrem ao mero toque da prata. Está explicada a vantagem de lutar na forma humana: surpreender idiotas metidos à espertos que achavam que teriam uma vitória fácil só por estarem levando prata junto consigo.

E o mais interessante é que, sim, esse tipo de coisa passa pela sua cabeça enquanto você está correndo em meio à uma chuva de flechas de prata, disparando línguas de fogo em árvores, no alto das quais estão os elfos responsáveis pela chuva de flechas de prata. O Rei Elfo havia enviado alguns poucos, mas bons, arqueiros, para acabar com a divisão do Exército dos Lobisomens da qual o Regente fazia parte. Eles não tinham plano nenhum, senão tentar nos matar durante a noite da lua cheia, período no qual eles tinham certeza que todos nós estaríamos transformados. Seu engano foi só mais uma em uma pequena série de desvantagens: eram poucos arqueiros, cada um com poucas flechas, simplesmente porque prata é um material caro demais para que sejam feitos milhares e milhares de flechas de prata. Eu inclusive duvidava que eles tinham flechas suficientes para matar à todos nós, mesmo que eles acertassem todas e cada um de nós morresse com uma. E eles ainda se dizem a raça mais inteligente de todas.

Acho que vale a pena abrir um parêntese aqui para explicar sobre esse papo de Regente. É que o Rei dos Lobisomens, Tiago IV, tem oitenta e poucos anos de idade, por mais inacreditável que soe alguém conseguir chegar à uma idade tão avançada. Porém, é óbvio que, sendo tão velho assim, ele tem tudo quanto é doença que a ciência conhece, e mais um bocado que esta desconhece (sem mentira nenhuma, descobriram uma nova doença tratando do velho), e vive de cama e cheio de médicos à sua volta, sendo que ele já está assim à alguns anos. Como não tem como alguém nesse estado se sentar num trono, desde que ele finalmente admitiu que já não tinha forças para governar (porque, sim, durante um bom tempo, ele tentou governar, mesmo velho e doente... a força de vontade é a mais forte de todas as forças), quem vem governando desde então é seu irmão mais novo (mas que também já está mais para lá do que para cá), Yan, o Regente. O Rei Tiago IV até tem um filho (Tiago V), mas este é muito novo para ascender ao trono (o rei se casara com uma mulher com pouco mais de um quarto de sua idade, para manter o sangue azul e não sujar a família real com genes plebeus... sabe como é), então, quem está governando em seu lugar até que seu filho tenha idade é o segundo mais velho da família de seis irmãos – todos homes, para a alegria do falecido Tiago III. Fecha o parêntese.

Saquei minha espada e fui ao encontro de um dos poucos elfos que tiveram coragem e velocidade o suficiente para saltar do alto de sua árvore antes que as chamas o ancançassem. Não me surpreendeu nem um pouco ele puxar uma espada de prata curta e leve, afinal, arqueiro que não carrega uma espada consigo está, entre muitas outras coisas, fora de moda. Minha espada podia ser de um metal mais vil e barato, mas tinha quase o dobro do comprimento da dele, e isso fez toda a diferença – isso e o fato de que o elfo era um arqueiro, e arqueiros podiam até tentar, mas não haviam sido feitos para brandir espadas. O que eu posso dizer é que, definitivamente, o intestino delgado dele nunca mais seria o mesmo.

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