Hey Brother

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O cheiro de ovos e bacon fritos invadiu os seus sentidos antes mesmo que acordasse. Era um aroma tão incomum, bom e errado que por um tempo imaginou que ainda estivesse dormindo. Não ousou abrir os olhos.

Era um sonho, é claro. Estava em casa, deitado no seu antigo quarto e em alguns minutos ouviria as batidas secas do punho da sua mãe na porta. Na imensa mesa da sala de jantar, um café da manhã colossal preparado por Anthony, o cozinheiro da sua família de tantos anos, estaria a sua espera. Quase podia sentir o gosto na língua. Podia até mesmo imaginar sentando-se em frente à Astoria, seu pai na cabeceira da mesa lendo o jornal, o silêncio interrompido ocasionalmente apenas pelo barulho de talheres.

Abriu os olhos. O cheiro ainda estava ali. Tão presente e inoportuno quanto a os raios de sol matinal que entravam pelas cortinas abertas da janela. Mas era errado. Estava no seu quarto em Londres, não em Wiltshire. Aquele cheiro não se encaixava ali, não fazia parte do cenário.

Não era um sonho.

Confuso, levantou-se da cama e saiu do quarto. Sua cabeça latejava por causa dos drinks da noite anterior. Ainda bêbado de sono, sem conseguir raciocinar direito, seguiu o cheiro até se deparar com uma cena tão estranha que demorou um tempo para assimilar.

Ela estava ali. No meio da sua cozinha tão à vontade que era como se fizesse aquilo todas as manhãs. O cabelo ruivo preso no alto por um elástico, usando uma blusa xadrez comprida com as mangas puxadas até os cotovelos e tão distraída cantarolando uma música qualquer que ouvia nos fones de ouvido enquanto mexia em uma panela no fogão que não notou de imediato a presença de um Scorpius perplexo.

O cheiro bom acabou despertando o seu estômago vazio mais rápido do que a sua mente entorpecida. Viu café, leite e pães fresquinhos em cima da bacada com uma aparência convidativa e deliciosa. Sua barriga roncou alto, traindo-o.

Tinha algo muito errado ali. Nada daquilo era normal.

Lily virou-se de repente, com uma colher na mão, e o flagrou parado como uma estátua de pedra. Tirou os fones e um sorriso discreto e inseguro surgiu no rosto salpicado de sardas.

— Oi.

— O que você está fazendo? — ele perguntou sem conseguir disfarçar a surpresa.

— O café da manhã. — ela respondeu como se fosse evidente.

Encarou-a, sem saber o que dizer. Café da manhã? Não estava acostumado com isso. Não depois de tanto tempo sem aquele luxo em particular. Lily continuava a fitá-lo e aos poucos o sorriso pequeno diminuiu até sumir completamente. Um silêncio desconfortável se instalou entre os dois. Ela também não sabia o que dizer.

— Que cheiro delicioso!

Albus passou direto por Scorpius e olhou maravilhado para a refeição como se estivesse diante de uma miragem. Lily desviu o olhar de Scorpius e abriu um largo sorriso para o irmão, feliz por alguém apreciar os seus dotes de culinária.

— 'Tá querendo nos impressionar, baixinha? — Albus provocou enquanto pegava furtivamente um pedaço de bacon da panela.

— Só pensei que comida de verdade fosse melhor do que água e luz — ela rebateu — Sabe, eu não sou uma planta.

Os Potters pareciam ter uma sintonia só deles. Albus não estranhou nada daquilo. Era como se nada houvesse mudado. Era como se ela fizesse parte da vida dele desde sempre. Era como se o estranho na cozinha fosse Scorpius.

Não compreendia como eles agiam daquele jeito tão natural. Era filho único, nunca teve alguém para compartilhar aquela cumplicidade fraternal que os dois tinham. Albus era o mais perto de um irmão que conhecia. Mas mesmo morando juntos por dois anos, era evidente que Albus tinha muito mais familiaridade com Lily do que com ele.

InstintosWhere stories live. Discover now