Demons

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O relógio mostrava que já era 3:54 da madrugada. O quarto estava escuro como breu. Tudo estava sob um manto pesado de silêncio e calmaria. Todos dormiam. Mas Lily se revirava na cama, sem conseguir cair no sono.

Estava ansiosa demais. Em poucas horas iria para a Universidade de Artes e seria, oficialmente, uma universitária. Quase não podia acreditar. Sonhou a vida inteira por aquele momento desde que começou a ter aulas de artes aos nove anos. Seria um grande dia! Ela podia sentir isso na pele, no ar, na alma. Estava tão nervosa que não conseguia nem mesmo fechar os olhos.

Quando o relógio marcou 4:30, desistiu de uma vez de dormir. Não adiantava, seu sono era pirracento. Quanto mais tentasse, mais ele se recusaria a aparecer e isso só deixaria mais angustiada. Decidiu levantar para beber um copo com água.

Afastou as cobertas e calçou as pantufas de leãozinho. Era um pouco patético ainda usar aquilo, com uma juba, um rabinho e tudo, mas Lily não se importava. Gostava das pantufas. Eram quentes e macias. E era o último presente que James lhe dera.

Ainda não estava familiarizada com o quarto e no escuro não conseguia ver por onde andava. Com os braços esticados à frente, tentou se guiar às cegas pelo cômodo e, sem querer, acabou chutando a quina da escrivaninha com força. A dor intensa fez Lily fechar os olhos e praguejar os piores nomes sujos que conhecia. Precisou de alguns segundos para se recuperar antes de abrir a porta e sair mancando do quarto, ainda xingando baixinho.

Pretendia ir para a cozinha, mas, no meio do caminho, foi surpreendida por uma leve e gelada brisa noturna. Olhou para a sala, confusa, e se deparou com algo que não esperava. Apoiado no batente da porta da varanda, Scorpius observava o céu, tão absorto no próprio mundo que não notou a presença dela. As luzes estavam apagadas e apenas a luminária de teto no canto da sala fornecia uma iluminação ambiente e fraca, mas o suficiente para Lily enxergar a figura virada de costas para ela.

Lily o estudou, interessada demais para conseguir evitar. O cabelo era uma bagunça de fios prateados e a camisa de mangas compridas não parecia ser o suficiente para a noite fria. Usava as mesmas calças moletom, mas, apesar do frio quase invernal, estava descalço. Quando se aproximou um pouco mais, com muito cuidado para não revelar a sua presença, percebeu que ele tinha um cigarro entre os dedos. Era surpreendente, quase hipnotizante, o quanto parecia talhado em pedra. O único movimento que fazia era o caminho que o braço fazia para levar o cigarro até a boca e voltar a posição inicial.

— O que está fazendo acordada a essa hora?

Estava tão concentrada em observá-lo que pergunta em voz baixa, surpreendeu-a de tal modo que quase deu um pulo, assustada. Lily se perguntou como ele sabia que era ela se nem sequer tinha virado o rosto.
Respirou fundo, como se estivesse reunindo coragem, deu um passo à frente e disse:

— Resolvi esperar o sol nascer para aplaudir.

Scorpius não respondeu. Lily imaginou que ele não tivesse entendido.

— É uma piada — ela esclareceu, em dúvida.

Ainda assim, ele não demonstrou qualquer sinal de ter captado o humor.

— Não é muito boa — disse por fim, com um dar de ombros despreocupado.

— Se você não fosse assim tão amargo talvez conseguisse ver graça nas coisas bobas. — ela soltou e se arrependeu imediatamente.

Não era um bom jeito de começar uma conversa. Às vezes a sua boca era mais rápida do que sua mente e falava as coisas sem pensar.

Scorpius virou o rosto de lado, mas não olhou diretamente para ela. Lily prendeu a respiração por alguns segundos. Olhando-o de perfil, ele adquiria um ar ainda mais sombrio e misterioso. Era como admirar a escultara de um grande artista. Não parecia sequer ser real. Ela soltou o ar devagar como se os seus pulmões estivessem com dificuldade de trabalhar direito. Ele parecia um anjo!

InstintosWhere stories live. Discover now