Capítulo 14 - O beijo

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— Te procurei em todos os corredores desse jornal, por onde a senhorita andava? — indagou Gui apreensivo e ofegante adentrando minha sala.

— Ué, se tivesse vindo na minha sala antes, teria me encontrado com mais rapidez, senhor gênio. O que quer? Não me amola, pois estou atolada de trabalho.

— Eu vim para resolver um mal entendido que tirou meu sono. Sei que falei que Rafa e Liv estavam se pegando e tal, mas ontem o primo me explicou toda a história e eu estou até sem jeito de admitir que foi tudo fruto da minha fértil imaginação.

— Eu já sei. Não precisa se preocupar em explicar... —  falei sem dá muita importância para o assunto.

—  Sabe? —  ele falou perplexo arregalando os olhos. —Como assim "saber"? Quem te falou?

—  Ontem estive com a Liv e ela me explicou tudo. —  satisfiz tamanha curiosidade.

—  Sendo assim fico aliviado... Já estava com a consciência pesada achando que tinham brigado por minha culpa. - ele respirou aliviado.

—  Briga não houve, mas uma mega declaração de Liv sim. Talvez eu preferisse a briga a ter que machuca-la com um " não ".

—  Mona, como assim? Para de girar o mundo que eu preciso entender. Me explica por favor? Não esqueça nem dos menores detalhes. — ele suplicou escandalosamente.

— Eu fui tirar satisfações sobre a história com o Rafael e ela disse que a única garota que ela deseja sou eu.

— Mona, mentiraaaaaaa! Braaaa que babado forte... E você, o que fez? - Gui se encontrava eufórico, arregalando os olhos a cada novo detalhe da história.

— Eu sai de lá perplexa, nem consegui dizer nada. No entanto, marcamos uma conversa para logo mais... Eu vou falar o que não tive coragem de dizer na noite passada.

— Estou curioso, me diz o que vai dizer? — indagou prontamente.

— Eu preciso falar com ela antes de qualquer coisa Gui... Eu te contarei sim, mas não agora. Ela precisa saber antes, é o minimo a se fazer.

— Okay minha linda, te entendo. Não vou negar que eu estava feliz quando pensei que Liv pudesse fazer meu primo feliz, mas se ela de fato te ama, eu só quero a felicidade das minhas duas melhores amigas. Um dia o primo vai encontrar sua cara metade também, sem que seja só na minha imaginação.  — rimos juntos.

— E você e o Rômulo, como estão? — interroguei mudando o assunto.

— Na verdade não estamos! Nossa relação se desgastou muito nesses últimos anos , resolvemos colocar um ponto final e salvar o pouco de respeito que ainda restava. Na noites de carências as vezes há remembre por pura saudade, mas nada mais. De fato nossa história acabou. Estou soltinho na pista!

— Senhor "soltinho das pistas" me deixa trabalhar agora, pois estou atolada de coisas para fazer e não tenho tempo para fofocas, depois a gente conversa mais.

— Okay, já que está me expulsando tão delicadamente, eu vou. Bom trabalho ai mona! — dramatizou Guilherme me deixando seguidamente em paz. É incrível como mesmo sendo um grande chato, eu o tenho como um irmão. Afinal, serem chatos e dramáticos fazem parte dos requisitos de irmãos. 

(...) Após cumprir todos os meus afazeres diários, eu finalmente estava livre para resolver a pendência que me tirou o sono na noite passada. Organizei algumas coisas para o dia seguinte e sai da sala indo em destino ao estacionamento, onde cruzei com uma colega de trabalho de nome Laura, que recentemente foi promovida. Conversamos um pouco sobre o trabalho, dei parabéns pela promoção e segui até meu carro. No fundo eu sabia que se meu rendimento como profissional não tivesse caído tanto, há essa altura eu seria a nova supervisora de notícias ao invés de Laura, mas ainda sim, eu estava feliz que a mesma conseguiu alcançado o que tanto almejava. Ela é alguém de muita garra e sua competência é notória, até para mim que não somos tão próximas. Sorri simpaticamente e entrei no carro dando partida em destino a casa de Lívia. Por todo o caminho procurei ensaiar a melhor forma de dizer o que se passava dentro de mim, mas acontece que meus sentimentos são confusos até para mim mesma, explica-los é um trabalho quase impossível.

Nem bem entrei no condomínio onde o apartamento de Lív se encontrava e minhas pernas já começaram a ficar bambas. Bater em sua porta não me parecia uma missão nada fácil, (como seria há dois dias atrás) mas eu não podia recuar. Busquei coragem em mim  e dei duas batidas na porta. Quase que instantaneamente Lívia abriu, até parecia que estava de guarda ali por perto.

— Estou feliz que realmente veio. — falou ao abrir a porta e simpaticamente sorriu mostrando sua felicidade de forma estampada ao me ver.

— Eu prometi que vir... não foi? — ela já devia saber que cumpro meus firmamentos.

— Entre por favor? Sinta-se a vontade.   — Lívia nunca foi tão formal assim, em seu estado normal já estaria fazendo alguma brincadeira de moleca levada... Notoriamente ela estava intimidada com toda a situação tanto quando eu.

Caminhei a passos lentos para adentrar sua sala, por alguma razão eu teimava em lutar contra o tempo para retardar cada vez mais o assunto entre nós.

— Aceita algo para beber ou comer? Sei que veio do trabalho direito para cá, deve estar precisando se hidratar e repor as energias. — ela falava sem ao menos conseguir olhar  meus olhos.

— Vamos pular essas formalidades e vamos direto ao assunto que me trouxe até aqui. Ontem você me falou inesperadamente sobre sentimentos que eu jamais imaginei que pudessem existir. Sempre acreditei que você fosse hétero, mesmo levando em conta aquela vez que dormimos juntas, após  uma noitada de balada que eu te usei para causar ciúmes em Clara e você me usou para chatear seu namorado. Sabemos que naquela noite nada aconteceu e desde então, nesses últimos anos nos tratamos como amigas, quase irmãs. Não sei em exato quando e como esse sentimento por mim nasceu, o fato é que preciso entender com mais clareza o que esperas encontrar em mim: uma amiga ou companheira?

— Quero de você exatamente o que puder me oferecer. Se eu pudesse escolher e se tudo dependesse apenas de mim, eu continuaria sendo a amiga para quem você sempre correu nos momentos de medos e angústias, mas acrescentaria também nessa amiga uma parceria capaz de lutar em cada amanhecer por seu amor. Sei que só meus sentimentos não bastará para nós, mas eu sei também que sou capaz de fazer voltar a bater o coração que você julga incapaz de amar novamente. Eu não sou a garota mais bonita do mundo, mas sou aquela que moveria céus e terra para fazer do seu mundo o mais bonito. Eu quero ser sua parceira, amiga, companheira e tudo o mais que me permitir ser, eu só preciso que me deixe tentar.  — ela falava cada palavra com a emoção estampada no brilho dos seus olhos. Eu sentia sinceridade em cada virgula e ponto dito por Liv.

— Eu ainda amo a Clara e você sabe disso. Não seria justo entrar nessa relação escondendo isso de você. Sei que ela morreu e não voltará jamais, mas meu coração ainda não aceitou isso tão bem. Eu sei que já devo estar me tornando repetitiva ao falar isso, mas eu só não quero faltar com a verdade a ti.  — expliquei dando dois passos a frente e me aproximando um pouco mais.

— Eu não estou pedindo que esqueça um amor tão lindo quanto o que viveu com ela. Estou pedindo apenas que me deixe te mostrar que no seu coração há espaços para mim também, e para uma cor diferente do preto do abismo que a solidão vem deixando em ti. Eu quero colorir sua vida e mostrar que não tenho varinha mágica para te fazer feliz, mas tenho um pincel capaz de pouco a pouco te fazer voltar a enxergar o colorido da vida. Eu te amo e tudo que peço de ti é uma única chance para provar que você também é capaz de voltar a amar, dê uma chance ao seu coração para que ele possa bater feliz outra vez. — antes que ela pudesse continuar, calei o momento com um beijo.

Eu não sei se fiz certo, mas eu nunca saberia se não tentasse. O tempo vai mostrar se esse beijo foi a resposta certa a dar no momento. Ignorando meus devaneios, apenas fechei os olhos e me concentrei no momento. 






2 - Colorindo uma vida de tons cinzasOnde histórias criam vida. Descubra agora