CAPÍTULO 05 - PARTE 02

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KURT

O clarão da enorme lua em nossa frente, invadia as grandes janelas velhas do quarto. Um feixe de luz estava sobre meu abdômen. Lucy vestiu minha camisa que batia em suas coxas divinas. Aquilo só me fazia querê-la mais. Percebi quando ela tirou seu short jeans que envolvia suas longas pernas e colocou sobre a cadeira, provavelmente para secar até irmos embora. Não imaginei que ela o tirasse. Assim que me viu deitado ali, a garota esfregou suas mãos com tanta força que pareciam querer quebrá-las.

-Acho que vamos ter que dormir aqui. Não vai me deixar dormir no chão, vai? -eu disse dando leves batidas no lado vazio do colchão.

-É que...é...será que não tem outro colchão pra você? -ela olhava para suas mãos espremidas.

-Qual é lindinha? Essa cama aqui cabe nós dois e eu não mordo. -me sentei chegando mais perto dela -Eu não vou te tocar, se você não quiser é claro. Deita logo.

Lucy caminhou com um pouco de receio até mim. Meu Deus como ela pode ser assim? Eu cheguei um pouco para o lado enquanto a observava deitar. Minha camisa levantou um pouco em seu corpo deixando suas coxas à mostra. Lucy é pequena demais, minha camisa quase cobria seus joelhos. Ela me pegou a olhando e deixou seu olhar cair sobre meu peito. Droga, não faça isso!

-O que são essas cicatrizes? -eu não estava lembrando de tê-las ali, o que era estranho. Não havia um dia sequer que eu não me lembrasse de como as ganhei. Movi minha cabeça até conseguir olhá-la.

-Marcas de guerras. -sorri rapidamente.

-Dói? -eu vi quando sua pequena mão se levantou, mas logo se abaixou. Ela ia me tocar.

-Não mais. -seu olhar doce me olhou intensamente como se precisasse de uma resposta. -Você quer tocar?

Sua cabeça balançou no mesmo instante. Segurei uma de suas mãos e coloquei sobre a maior delas. Dia 23/07/2002.

-Eu tinha seis anos. -eu parei quando senti seu dedilhar sobre meu estômago. Minha respiração ficou pesada.

-Continue Kurt, por favor.

-Eu estava fazendo um sanduíche com sobras de pão da minha mãe, ela tinha acabado de dormir e eu estava com fome. -engoli seco quando percebi que ela olhava pra mim e ainda continuava explorando minha barriga -Senti um estralo nas minhas costas e virei. Ele tinha uma garrafa de cerveja em sua mão. Eu comecei a chorar como sempre fazia mas ele não se importou. Me fez sentar no chão e fincou a garrafa quebrada bem aí onde você está com a sua mãozinha. -ela tirou como se sentisse que estava me machucando.

-Oh Kurt! Eu sinto muito. Era o seu pai? -seus olhos estavam carregados de lágrimas. Eu nunca sequer tinha aberto minha porcaria de boca pra contar a alguém sobre isso. Por todos esses anos, eu nunca consegui contar a ninguém. Lewis sabia que ele me batia, mas não sabia de tudo. Balancei minha cabeça, confirmando -E todas essas outras?

-Posso te falar todas as datas, de cada uma.

Sua boca se abriu em um "o", ela estava arrasada. Eu não podia saber o que ela estava pensando, mas eu sabia que Lucy estava realmente triste por mim. Eu me abri pra ela, que merda está acontecendo comigo? Eu acabei de conhecê-la e já estava me abrindo pra ela.

-Por que ele fazia isso com você? Não acho que você era tão horrível ao ponto de merecer isto. -seu semblante doce e angelical tinha sido substituído por um triste e com um tanto de raiva que eu nunca pensei que conseguiria ver nela.

-Ele não era meu pai de verdade. Eu não tenho pai. Minha mãe foi estuprada e ficou grávida de mim. -eu tive que parar por um segundo e olhar para a primeira e única pessoa que iria saber toda a verdade sobre mim -Ele não sabia disso, mas quando eu nasci ela o contou. Eu tinha 4 dias quando ele me bateu pela primeira vez. Minha mãe me tirou antes mesmo que ele me matasse, então ele acabou batendo nela também. Dia após dia nós dois apanhávamos daquele monstro bêbado ordinário. Cada dia que passava, era pior. Eu apanhava por respirar. Ele não me deixava ir a escola. Sempre que ele saía, minha mãe dormia. Eu saía correndo de casa até meu velho vizinho Will. Ele era velho mas me tratava bem, eu o amava. Will me ensinou a ler, ele me deixava ver televisão mas eu nunca o contava sobre o que acontecia lá em casa.

-Eu não sei o que dizer. -droga! A menina estava chorando, eu não queria fazê-la chorar.

-Não chore, lindinha. Acho melhor você dormir um pouco. Quando a chuva passar, eu te acordo. -eu disse a olhando mais uma vez, ela é ainda mais linda chorando.

-Não, por favor. Me conta, eu preciso saber. -ela segurou minha mão a apertando firme. Maldição! Se ela me pedisse para pular em um abismo, eu pularia. Eu não negaria nada para aquela menina perfeita a minha frente.

-Minha mãe já não me tratava como antes, ela me odiava assim como ele. Ela me culpava por todas as vezes que ele nos batia. Foram vários dias sem comer, eu só bebia água. Com pouco mais de 7 anos, eu odiava tanto os dois que tinha vontade de me matar. Ele me deixava desacordado quase todas as vezes que me batia. Eu fui criando um ódio tão grande dentro de mim que não conseguia sentir mais nada. Eu já estava com a dor dentro de mim, não me importava mais se iria apanhar ou não. Eu só aceitava. -eu olhava Lucy com seus olhos presos a mim. Aquilo era tão simples mas tão tentador. Eu queria parar de falar e beijar aqueles lábios inchados -Ele morreu quando eu tinha 11 anos. Cirrose. Minha mãe foi embora com o primeiro cara que encontrou na rua e me deixou sozinho. Eu aprendi a me virar depois que o velho Will também se foi. Me criei na rua, fazendo o que eu queria e o que eu tinha vontade. Tive minha primeira mulher com 13 anos, assim que o velho se foi. Ela era mais velha, e eu gostei daquilo. Conheci Lewis, meu melhor amigo. Criamos uma turma e hoje eu já não me lembro daqueles vagabundos que fingiam ser meus pais.

-Você precisa perdoá-los. -Lucy limpou as lágrimas que insistiam em cair e encostou seu cotovelo no colchão macio.

-Por favor lindinha, não venha me dar um sermão de igreja. Acho que esse assunto já está encerrado. Vá dormir. -eu a olhei nos olhos esperando que ela se abrisse pra mim e enterrasse seu corpo no meu. Mas ela não o fez. Ficou imóvel me olhando. Desviei meu olhar e me aconcheguei no travesseiro. Droga de menina! Eu estou ficando louco.

-Kurt? -escutei sua voz macia me chamar, eu iria ouvi-la durante todo meu sonho essa noite.

-Sim? -eu disse sem me mover.

-Obrigada por me contar isso. -sua cabeça encostou no meu peito descoberto que agora levantava com dificuldade por causa da aproximação. Seus braços envolveram minha barriga e ela continuou ali, até adormecer.

(COMPLETO) LAKEWOOD - Entre o céu e o inferno Onde histórias criam vida. Descubra agora