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Depois de lhe fazer os curativos nos seus arranhões e preparar-me para virar e colocar a caixa de volta ao seu lugar, sinto dois braços envolverem-se na minha cintura e a cabeça do Harry encostar-se á minha barriga. Involuntariamente levo a minha mão até aos seus cabelos massajando e passando pelos seus caracóis como um pente.

-Isto vai soar estúpido mas... eu tenho medo. Não de quem me fez isto mas das consequências que pode haver na minha vida.

-Eu também tenho medo... toda a minha vida tive. Medo de no dia seguinte quando acordasse algo pior do que o dia anterior pudesse acontecer. Nunca admitia que tinha, nunca deixei que levassem a melhor de mim mas só eu sabia o que acontecia quando tudo ficava escuro ao meu redor. Havia noites em que era reconfortante... sentia-me bem em estar sozinha e imaginava que tudo tinha acabado... o sofrimento. Havia outras em que estava aterrorizada e que o único som presente era a minha respiração acelerada e os meus batimentos cardíacos a ecoarem pelo meu corpo. Ataques de pânico era o nome dado.

-Eu já vivi em cerca de 5 famílias... na primeira vez que me adotarem daquele orfanato sentia-me feliz... Iria finalmente ter amor verdadeiro de um pai e de uma mãe como nos desenhos animados que eu via todos os dias ás 16h00 no salão do estabelecimento. Na primeira semana em que lá estive tudo era perfeito... tinha carinho, mimos, comida caseira, uma cama confortável... tudo mudou de repente. Eles fartaram-se de mim. Nunca percebi o porquê... quando voltei para o sítio onde parti tudo o que sentia dentro de mim era dor, até a respirar me doía. Isto aconteceu mais 4 vezes e eu praticamente desisti de ter esperança. Foi aí que fui parar á casa da Anne. Receberam-me muito bem como todas as outras e só comecei a confiar neles um mês depois.

Encosto a sua cabeça mais a mim e abaixo-me deixando um beijo no topo da sua cabeça.

-E agora crescemos... conseguimos seguir em frente como sempre desejámos.

-Queres comer alguma coisa?- pergunto-lhe.

-Sim, pode ser.

-Consegues andar?- questiono-lhe enquanto me afasto dele.

-Vou tentar.- ele diz antes de se inclinar para a frente e fazer força nas pernas. Assim que se coloca de pé os seus joelhos quase que o fazem sentar-se de novo e eu apresso-me a colocar o seu braço por cima do meu ombro.

-Vá, vamos lá.- levo-o pelo corredor devagar com a sua ajuda pois não consigo com ele. Quando chegamos á sala pouso-o no sofá e estico as suas pernas neste. Coloco a manta por cima dele e dou-lhe um sorriso.

-Obrigado.- ele diz e dá-me um sorriso forçado ao mesmo tempo que fecha os olhos e eu rio-me com a sua aparência.

-Já te trago algo.- viro-me e vou em direção à cozinha com algo em mente para lhe preparar. Vou até ao frigorífico retirando fiambre e queijo para lhe fazer uma tosta. Quando me viro para retirar a tostadeira ouço o meu telefone a vibrar e corro até á minha bolsa.

-Estou?

-Olá meu amor.- lágrimas aparecem-me nos olhos. Não sei se são de alívio ou de saudades.

-Estou a morrer de saudades tuas.

-Eu também princesa. Tenho novidades.

-Conta-me.

-Bom, quando eu estava no avião estava-me a sentir mal como se precisasse de falar contigo. Tu estás bem não estás?- memórias do ataque que tive aparecem-me.

-S-sim agora estou.

-Mas passou-se alguma coisa? Eu senti que algo não estava bem.

-Bom eu... eu tive um ataque de pânico.- percebo que ele prendeu a respiração do outro lado da linha.

-Eu devia de ter estado ai.

-Mas já passou, a Sophia ajudou-me.

-Ainda bem senão eu não me perdoaria se algo te acontecesse.

-Não te preocupes já estou bem.- ouço-o suspirar.

-Continuando... o Ashton para me distrair deu-me três papéis com músicas e eu sem perceber comecei a cantar uma num ritmo e eles adoraram. Disseram para eu continuar e que seria assim a canção.

-yaaayyy!! Estou tão orgulhosa de ti!

-Eu sabia que ficarias.- ambos rimos.

-Onde é que estás agora?- pergunto-lhe.

-Num hotel no Canadá. Chegámos á 5 minutos e eu não pensei em mais nada senão em falar contigo.

-Sinto-me honrada.

-Tive de arranjar uma maneira para sair do aeroporto e adivinha como é que consegui?

-Saíste disfarçada.

-Como é que sabes?

-uhmm... eu vi os rumores.

-Oh...

-Mas não te preocupes estavas sexy na mesma. Nós vamos dar uma entrevista numa rádio daqui a uma hora achas que consegues ouvir?

-Sim claro é em que estação?

-Vai passar na FM.

-Já vou ligá-la.

-Assim que terminar volto a ligar-te.

-Está bem...

-Amo-te muito e estou cheio de saudades.- sinto o meu rosto queimar.

-Também te amo muito...

-Até logo.- ouço o bip do telefone e pouso na mesa. Levanto-me e continuo a fazer a comida para levar ao doente que está a habitar no meu sofá.



My Anchor ➸ n.hOnde histórias criam vida. Descubra agora