Prólogo

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Prólogo

"Nada agora importa! O silêncio foi quebrado, o segredo repartido e sua vida entregue numa bandeja."

Ao ouvir, despediu-se em abraços calorosos, saiu do bar e foi caminhando para o alojamento. Bebera gim durante horas com um desconhecido. Ao chegar em seu destino, notara alguns ruídos de coisas a cair, e quando compôs a sua primeira sequência de passos no recinto, arregalou os olhos para a janela escancarada e com ventos a coordenarem os movimentos das cortinas. Pouca importância deu ao fenômeno, digno de Eolo, e num riso de ponta a ponta, porém pesado, caminhou para a outra dependência do imóvel a qual transformara em seu quarto. Deitou-se rispidamente sem importar-se com os trajes - um blease Hugo Boss cobrindo uma camisa de malha cor de gelo, sapatos sociais pretos com plataformas cheias de ranhuras, calça jeans azul marinho e meias molhadas de suor.

O seu olhar alucinado fixava o teto como a ver além do forro de madeira envernizada. Seu rosto, suas mãos, todo o seu corpo suara além do comum. Era como um rio correndo abrupto. Seu corpo estava em estado de semi – hibernação. Seus lábios degustavam o doce liquido que ao invés de prazer, aumentara ainda mais o seu estado de tormento. Suas emoções o traíam. Mudava de expressão o tempo todo, fora assim desde os nove anos de idade. "Um enigma", assim os vizinhos em Weimar o denominavam.

Já estava cansado de se esconder, cada minuto a mais naquele ambiente o deixava mais louco. A ponto de ter idéias suicidas. Duras críticas a si mesmo o faziam sair de órbita e viajar a lugares ímpares devassos. Tudo a erguer o totem da claustrofobia.

Deitado inquieto, numa cama velha dançante, repleta de fotografias espalhadas, coberta por lençóis estampados, em detalhe, um deles contendo imagens dos super-heróis HE MAN e SHE – HA, contra o degenerado vilão Esqueleto que, por astúcia do destino, semelha em partes à condição física do jovem que por aqui está jogado e distraído a curtir seus próprios devaneios.

O quarto é pequeno, um pouco rústico, tendo como móveis: A cama; uma cadeira de encosto suportando a vitrola; um armário de ferro já pertencente ao ambiente desde a sua chegada e, um centro improvisado para expor seus minúsculos pertences e livros mais admirados. Dentre os pertences estão: um diskman; uma pilha de cd's diversos gêneros, um porta-pincéis; um frasco de perfume Jean Paul Gaultier, fotos de família e entre elas, uma Bíblia cercada por um relógio de bolso de marca indecifrável. À sua esquerda uma cortina improvisada identifica o banheiro, e a sua direita, caixas e mais caixas repletas de livros diversos, dentre eles alguns raros.

Suas roupas são emaranhadas e recobertas por uma trouxa que deixa vazar a longa manga de um blusão a mostrar timidamente o emblema da Universidade Bauhaus. Em sua mente talvez tivesse planos para violar o armário e guardar com mais dignidade as suas vestes. Incomum é ele não ter feito isto ainda. Apesar dos pesares, se sentira seguro vivendo nas dependências de uma gráfica falida , mas famosa por ter editado um belo livro sobre o Centenário de Nietzsche, sua única publicação que foi além dos 800 exemplares, como de costume. O sucesso foi tanto, que o Sr. Natanael, teve que contratar mais funcionários para atingir a demanda máxima para o seu porte, de 32.000 volumes por ano. Mas isto foi há muito tempo. Tentou manter-se editando certas brochuras que agradavam, tão somente, os militares. Eisenach presenciou a sua queda.

Instalações elétricas mal sucedidas, mal conseguiam iluminar o quarto por completo. Fora preciso o jovem adquirir algumas velas para observar com mais clareza, o ambiente em que se alojara. Estava ali a mais de oito meses e, toda vez que resolvera visitar Weimar, sempre com certo receio, escolhendo as madrugadas como o melhor horário, trazia de lá algumas telas, livros, roupas e nunca móveis.

Transformara as paredes do alojamento nos lugares mais atraentes e organizados deste ambiente, definitivamente transformado num cárcere. Obras de arte feitas por ele mesmo tomam espaço em pontos estratégicos. Tentando interpretá-las, podia notar uma característica neo expressionista e, talvez, um jeito singular surrealista. O fato é que impressionava e transmitia a quem pudesse observar , a sensação de transcender a mundos ali sugeridos. Nas próprias telas continham mensagens criptografadas no alfabeto alquímico, a principio sugeria que se tratavam de códigos secretos, mas ao estudá-las com atenção e paciência, logo descobria que eram apenas adágios dos seus filósofos favoritos. Numa das telas está grifada a seguinte frase do já citado Nietzsche: "Quem erguerá a próxima imagem do homem?".

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