Senhor Herman era uma figura icônica. Seu extenso bigode loiro curvado apontava para os olhos azuis assegurados pelo rosto quadrado e de traços rudes daquele homem que aparentava ter uns 45 anos de idade. Cobriam-lhe a cabeça fios loiros acompanhados de alguns grisalhos. Nas suas sobrancelhas cabiam alguns fios brancos e cinzas fáceis de serem tirados com pinça. A sua barriga era delineada pela camisa de linho de cor azul. O paletó não cumpria a sua função com eficácia, pois não conseguia agir devido as dificuldades de se ajustar aquele corpo robusto que ocupava mais espaço que o necessário. Poltronas e mais poltronas foram descartadas nos primeiros meses em que assumiu a direção do Luterhaus. Depois de tanto prejuízo, resolvera solicitar um assento feito por materiais mais resistentes, pois não podia assentar-se aos móveis medievais. O seu birô era fiel ao termo "balburdia". Papéis, fotos em sépia que alimentavam a sua nostalgia, livros de filosofia e envelopes com algumas coleções de selos antigos. Uma lupa se escondia por entre as obras de Hegel e Goethe. Havia um copo ao alcance das mãos, mas não estava vazio, alguns selos foram mergulhados em três "dedos de água". Aos curiosos, ele sempre afirmava que aquilo era a sua técnica para retirar o excesso de cola pois se tratavam de usados. Explicava, também, que aquilo era apenas um dos processos, pois se utilizara de recursos como cotonetes e a paciência.
O sujeito não era adepto dos exercícios físicos, e sempre que podia, induzia os visitantes do museu a procurá-lo em sua sala que, orgulhosamente, possuía uma placa de metal com letras gravadas em relevo, anunciando: "Hermann Schmit – Diretor." Parecia conseguir gerenciar bem todas as situações, mas não escapava das visitas esporádicas do prefeito e outras atividades superiores. O seu vicio com charutos e cigarros provocavam alguns efeitos não muito agradáveis. A sua tosse era desenfreada e o cheiro dos fumos impregnava em suas vestes. Viúvo, ele não se importava com o aroma produzido, pois desde que a sua esposa partiu, mergulhou num mar de desleixo. Afastando qualquer possibilidade de existência à pretendentes. O seu olhar era melancólico tal qual uma criança órfã.
Todas as paredes do museu são brancas e atravessadas com detalhes em madeira na cor tabaco. Pelo lado de fora, podemos notar a beleza do casarão antigo reformado pós guerra, com janelas em contornos verdes, vidraças, e flores sutis que as embelezam. Presente numa esquina, a sua arquitetura data dos tempos do seu morador Lutero. Uma luminária suspensa por um floral aramado na altura da janela, é emparelhada com a porta de entrada indicando o museu. No interior, grandes salões com peças em exibição. Ao adentrar, avistamos uma escadaria contornada por um corrimão ornamental em madeira terebintinada. Em uma das salas, uma Bíblia Luterana descansava sobre uma mesa enquanto que, uma janela cumpria o seu papel de plano de fundo, dividida está em duas partes, ajustando as direções dos raios de sol que adentram naquele ambiente. Iluminando de forma natural a também iluminada tradução do Reformador do Novo Testamento. O sótão possui uma escrivaninha usada pelo seu ilustre morador e inspirador. Acima dela, uma cabeça de jumento é destaque. O teto branco é arqueado. Uma lousa participa da sua ambientação. O assoalho em taco é reformado, perdendo um pouco a essência do seu original. Janelas também se fazem presentes acompanhadas de suas inseparáveis vidraças. Duas jovens guiam os visitantes pelos corredores, adentram nos espaços, oferecem folders e broches com a foto do Martim. A abertura ao público começa às 10h e vai até às 17h.
Toc Toc. (o segurança do museu bate na porta.)
- Senhor Hermann?
- Só um minuto. Logo te atendo! (O Diretor o responde enquanto procura um envelope lacrado em sua mesa. Tratava-se do ordenado daquele bom rapaz.)
- Achei! Disse a si mesmo.
- Entre Carl!
- Senhor, eu vim...
(Corpo atlético, alto, cabelos pretos, olhos azuis claros, atraente, mostra-se um homem de fibra dentro do seu uniforme preto destinado ao profissional da segurança. Em outros tempos, fora um campeão nacional de atletismo, na modalidade dos 400m rasos, levando a cidade de Eisenach a ser muita grata com o seu sucesso. Sério e de poucas palavras, aparenta uma imagem intimista que provoca alvoroço nas mulheres que chegam ao museu como visitantes e cisma aos seus companheiros, poia trata-se de uma forte concorrência.)
Antes que termine a fala, o Diretor interrompe-o estendendo o braço direito, segurando firme o envelope diz:
- Tome! Pegue Carl! Fiz questão de fazer uns acréscimos, pois tem sido um excelente funcionário. Graças a sua prontidão e garra este museu não é mais o que era antes. É um homem de confiança. Tratarei para que esses acréscimos ao salário, seja um aumento permanente. Parabéns!
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O Numismático
Mystery / ThrillerUm crime no museu Luterhaus precisa ser desvendado. O que motivou tal barbárie e quem a praticou? Moedas, História, sangue, paixões e ambição são componentes para a atmosfera deste romance policial.