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Três horas e meia de viajem e não tínhamos nem previsão de quando iríamos parar. Já havia comido seis barras de cereal e tomado duas garrafas de água. Aparentemente estávamos no meio do nada. Jake estava com uns óculos de grau com armação preta, lendo um livro que eu não conseguia ver o título desde que nos apresentamos. Às vezes ele olhava pra mim e sorria. A bateria do meu celular acabou meia hora antes eu estava brincando com os meus dedos tentando me manter calma. Abri minha mochila e tirei de lá uma manta que eu sempre carregava, estendendo ela sobre as minhas pernas logo após. Tirei meu celular do bolso e antes de poder guardá-lo, ele caiu no chão.

Merda.

- Você quer conversar um pouco?- Jake perguntou me entregando o celular- Não estou conseguindo ler.

Sorrindo, eu guardei o aparelho no bolso de fora da mochila antes de olhá-lo novamente.

- Adoraria!- Respondi enquanto ele guardava o livro- Você está com frio?

Ele assentiu e eu estendi a manta sobre suas pernas também. Jake se aproximou um pouco e assim conseguimos nos tapar até os ombros.

- Vamos começar com um clichê, tudo bem? Me fale um pouco de você, Katherine.

Eu sorri antes de começar. Contei a ele sobre ter nascido em um 29 de fevereiro. Sobre nunca ter tido um relacionamento sério. Sobre minhas músicas favoritas. Sobre a minha fobia de lagartixas. Sobre ser a única herdeira de uma família rica. Sobre nunca ter tido um animal de estimação. Sobre não ter ideia do que cursar na faculdade daqui a um ano. Sobre não gostar de pessoas grudentas ou que forçam amizade. E também sobre ter pintado o cabelo por gostar de dias cinza e tempestades.

- Tudo bem, Mortícia Addams. Minha vez- Ele debochou me fazendo rir- Sou Jake Morrison Davis, tenho dezessete anos e meio. Tive três namoradas e as três me deixaram. A primeira, Hilary, me traiu com um cantor de uma banda de merda desconhecido. A segunda, Natacha, era mais velha do que eu e quando foi pra faculdade disse que queria deixar tudo pra trás. E a terceira, Lea, me trocou por uma mexicana e se mandou. Apesar de precisar usar óculos pra ler, sou um ótimo jogador de Lacrosse. Tenho apenas um irmão, mas vários primos então a casa está sempre cheia. Eu nunca fui preso e nunca fumei. Não tenho medo de lagartixa, mas tenho pavor de aranhas e ganhei cinco vezes a feira de ciências da minha escola, mas das vezes que perdi foi totalmente injusto, só pra constar.

- Uma mexicana?- Eu perguntei quando ele parou de falar.

- Foi nisso que você se apegou? Sério?- Ele me olhou com os olhos estreitos e uma carinha triste- Sim, uma mexicana peituda e malhada. Ela veio pra organizar uma festa de natal e levou Lea como presente.

- Nossa!- Eu disse tentando me manter séria.

- Você pode rir se quiser, eu não ligo.

Ele disse rolando os olhos. Foi aí que minha gargalhada, nada discreta, transbordou no local. Ouvi alguns resmungos já que o ônibus estava silencioso e algumas pessoas já estavam sonolentas. Jake colocou a mão sobre a minha boca, pra abafar a risada, enquanto um sorriso largo preenchia o seu rosto. Senti minha barriga doer, e decidi que era hora de parar antes que acabasse vomitando. Respirando fundo, eu fiz sinal para que Jake tirasse a mão.

- Já acabou?

Fiz sinal de positivo e ele voltou a colocar as mãos no bolso do moletom que usava. Passei as mãos pelo rosto, tentando me livrar das lágrimas que eu nem sabia que estavam lá e fechei os olhos a fim de controlar minha respiração.

- Jesus!- Eu ri mais uma vez e vi seu rosto se contorcer em uma careta- Desculpa, mas é muito engraçada essa situação toda.

- Geralmente as pessoas me dizem um "sinto muito", e não riem na minha frente- Ele disse tentando ficar sério, mas acabou sorrindo- Pelo menos você é sincera.

Encolhendo os ombros, apoiei o braço na minha coxa e coloquei minha cabeça sobre a mão.

- Pra onde você está indo?- Jake perguntou depois de um tempo.

- Estou voltando pra casa, na verdade- Eu disse brincando com os meus dedos novamente- Coney Island, e você?

- Sério?- Ele perguntou com os olhos esbugalhados e eu concordei com a cabeça olhando pro seu rosto- Eu estou indo pra lá, indo pra casa também.

- Não acredito!- Eu ri- Como a gente não se conhece, então?

- A família da minha mãe sempre morou em Coney Island, então meus pais e meu irmão se mudaram pra lá no verão passado, e eu fiquei morando em Sacramento pra terminar um curso.

Ele sorriu coçando os olhos e eu achei aquilo muito fofo. Ele tirou o moletom, o que fez a sua blusa subir um pouco e consequentemente seu abdômen- muito, muito, muito definido, mas longe de ser exagerado- ficou a mostra. Olhei pra janela sorrindo internamente. Obrigada mãe e pai, por pagarem essa viajem pra mim. Obrigada Gia e sua lanchonete lotada, por fazer eu ter que gentilmente ceder uma cadeira pra ele. Obrigada ser humano que decidiu que as poltronas deveriam ser duplas e também a quem vendeu esses dois bilhetes.

- Você conhece a banda Islaney?- Ele perguntou se cobrindo com a manta de novo.

- Sim!- Eu sorri rolando os olhos- O vocalista é namorado da minha melhor amiga, ou seja, sou obrigada a comparecer até nos ensaios. Mas eles são ótimos, então isso não é ruim.

- O vocalista é o meu irmão- Ele disse tão incrédulo quanto eu fiquei ao ouvir aquilo- Na verdade nossos pais se casaram quando nós tínhamos oito anos, nós temos cinco meses de diferença então sempre nos demos bem- Ele fez uma pausa e com um sorriso ele continuou- Parece que vamos nos ver bastante, Katherine.

Obrigada Deus!

Sorri timidamente pegando uma garrafa de água da mochila. Bebi todo o líquido tentando me livrar do calor que se encontrava nas minhas bochechas. Fiz careta jogando a garrafa vazia na mochila. Eu nem sei o motivo de estar corada. Na verdade eu nunca coro. Quando eu voltei a olhar pra ele, Jake estava me olhando com o rosto escorado na poltrona e um pequeno sorriso no mesmo. Respirando, fundo eu mordi o interior da bochecha.

- Acha que vai demorar muito ainda?- Eu finalmente consegui abrir a boca.

- Acho que sim, infelizmente!- Ele disse cruzando os braços e eu concordei com a cabeça.

- Acho que vou dormir um pouco.

- Tudo bem, se pararmos em algum lugar eu te chamo.

Concordei novamente e sorri em agradecimento. Virei o corpo para o lado da janela, coloquei os pés em cima da poltrona e apoiei os braços nos joelhos flexionados, peguei dois casacos e fiz uma espécie de travesseiro o encostando com a cabeça no vidro. Olhei mais uma vez para o Jake e ele sorriu antes começar a ler o seu livro novamente. Fiquei olhando as paisagens que passavam pela janela até sentir meus olhos pesarem.

Highway || Gregg SulkinOnde histórias criam vida. Descubra agora