X

101 10 0
                                    

- Cunhadinha. Quem diria.

Ouço aquela voz masculina e todo o meu peito começa a apertar, não consigo respirar e sinto-me ridícula por me continuar a esconder, sou uma adulta, tenho o meu próprio negócio não me posso deixar afectar por um romance de adolescência. Recomponho-me, olho para os olhos azuis que me fitam pelo fundo de ecrã do telemóvel e sinto-me pronta para enfrentar o que me espera do lado de fora da porta. Aproximo-me deles na sala e o ambiente fica imediatamente pesado, sinto as faces ficarem ardentes e o meu corpo começa a parecer gelatina, ele continua igual. Cabelo escuro despenteado e olhos claros a olharem para mim com o mesmo intenso desejo que me olhavam antes. Mas numa fracção de segundos o desejo dá lugar a tristeza ou rancor, não consigo distinguir, só consigo abrir a boca e falar.

- Olá.

- Então era por isto que o meu irmão não queria que eu viesse a tua casa.

- A Francesca vai ficar aqui até ao casamento.

- Mas nós estamos bem. Não estamos Francesca? - olha para mim e sinto a ironia na sua voz. O desprezo com que me recebeu não me deixa responder como se nada me incomodasse, decido retribuir na mesma ironia.

- Claro que estamos. Porque não haveríamos de estar Colin?

Reparo que a Gina sai de casa assim que Tiago surge na porta de entrada. Eles querem nos dar espaço mas o que fazem é piorar a situação.

- Talvez porque me abandonaste.

- Tu fizeste isso sozinho muito tempo antes de eu ir embora.

- Podias ter dito um adeus Francesca, fiquei feito idiota no hospital à tua procura.

- O remorso incomodava muito? - Colin fica estático sem responder e eu sinto-me mal por levantar este assunto, não posso descer tão baixo. - Desculpa eu não queria dizer isto.

- Claro que querias. Sentes-te melhor por me atingires assim?

- Já não me afetas Colin, não me sinto melhor nem pior, a tua presença aqui é-me completamente indiferente. - passo por ele em direção à porta e saio para dar de caras com uma Gina furiosa e um Tiago impotente.

- Desculpem. Eu vou visitar os meus pais Gina.

- Volta quando quiseres Francesca. - já sei que assim que sair do corredor a minha amiga vai começar a discutir com o futuro cunhado e a ultima coisa que eu quero é que eles se zanguem a dias do casamento. A situação em que o Tiago se encontra não é das mais fáceis e eu não quero estar no meio deles. Faço uma visita rápida aos meus pais que como eu esperava recebem-me como se fosse uma obrigação para não parecer mal perante os empregados e com medo de que a notícia se espalha-se pelos jornais. Quando saio da casa deles decido enviar uma mensagem a Gina a pedir o número do Colin, preciso fazer uma trégua com ele se quero que o casamento dos meus amigos resulte, e acredito que ele queira o mesmo.

Estou sentada numa mesa perto da janela grande neste café concerto que um dia serviu como apoio às minhas dificuldades, "O Cantinho" deixou de existir um ano após eu ter fugido, o Sr. Gonçalves acabou por sofrer um enfarte e falecer. Agora é um café e eu não podia deixar de cá vir. As fotografias penduradas na parede do Colin mostram que ele é bastante idolatrado por aqui e deixa-me receosa de acabar a discutir com ele e estar em minoria. Assim que ele entra a porta um grupo de fãs junta-se a pedir autógrafos e fotografias. Admito que nunca imaginei que a fama dele fosse deste nível. Demora até se poder sentar comigo à mesa mas quando o faz os olhos não descolam dos meus e parece que tenho dezassete anos novamente.

- Não estava à espera de receber uma mensagem tua.

- Precisamos falar Colin. Eu não me comportei da melhor maneira contigo na casa da Gina e se não queremos que eles discutam por nossa causa temos de deixar o passado pra trás das costas. Pelo menos ate ao casamento.

- E depois do casamento?

- Depois do casamento eu já cá não vou estar Colin.

- Vais fugir outra vez?

- Desta vez não é fugir. É voltar pra minha vida.

- E que vida tens tu lá?

- Acho que não devíamos de fazer isto.

- Fazer o quê? Conversar?

- Sim Colin conversar, podemos tentar não discutir mas não vamos fingir que somos amigos.

- Podemos ser.

- Nunca fomos.

- Podemos tentar ser Francesca. Pelo meu irmão e a Gina.

- Isso é muito baixo, até mesmo pra ti.

- Mas resultou?

- Talvez.

Ele vai para responder quando mais um grupo de mini-fãs se aproximam dele a pedir autógrafos e fotografias. Não consigo deixar de sorrir ao ver a sua expressão atenciosa a falar com as crianças.

- Já tinha saudades desse teu sorriso.

A minha expressão desaparece imediatamente do eu rosto dando lugar a uma cara séria mas o olhar que ele me faz não deixa que esta atitude continue e desato a rir junto com ele.

- Quando foi que te tornaste um famoso?

- Experimenta levares uma equipa até à final e ganhares o campeonato intercidades.

- Vocês ganharam?

- Pois ganhamos e como marquei alguns dos golos é assim que me tratam.

- E não gostas nada desta atenção toda.

- Claro que não gosto, já me conheces.

- Por conhecer que não acredito mesmo nada nisso. Tu adoras ser idolatrado Colin.

- Como estás Francesca? - o tom animado desapareceu do seu rosto e a conversa acabou de se tornar mais séria e eu tenho de fugir a esta situação.

- Segui com a minha vida. E tu também.

- Não há maneira de ficares depois do casamento?

- Não. A minha vida já não é aqui, não me resta nada nesta cidade, venho ajudar a minha melhor amiga a casar e é isso que vou fazer.

- Então amanhã vou-te buscar a casa da Gina as oito para tratarmos da decoração.

- Ui desde quando sabes o que é preciso fazer para organizar um casamento.

- Desde que a minha futura cunhada me encostou à parede e disse tudo que temos que fazer, enfatizando a parte de o meu pénis não vai estragar o casamento deles.

- A Gina não mudou nada. Então atá amanhã.

- Eu levo-te.

- Deixa estar. Vem aí a tua fã número um.

Levanto-me e quando ele olha para a porta e vê que estou a falar da Penelope olhar para mim e tenta dizer alguma coisa mas eu não deixo e vou embora. Passando por ela como se nunca a tivesse visto na minha vida, para mim ela é uma completa desconhecida. Vejo através da janela eles a cumprimentarem-se com um beijo e sei que tomei a única decisão possível há dez anos atrás.

Eterno AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora