Capítulo 1 - Depois

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Quando li pela primeira vez achei meio confuso, mais no decorrer do livro me encantei com a história. Espero que aconteça o mesmo com vocês!!!!

BOA LEITURA!!!

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Estava procurando por Lauren há meio século quando a encontrei diante da máquina de raspadinha na loja de conveniência da Rodovia Federal, observando pelo vidro o líquido congelado de cor neon se revirar, como se esperasse que os mistérios do universo fossem revelados lá de dentro.

Pensando bem, talvez esperasse mesmo.

Paro. Encaro. Preciso de chiclete, refrigerante e uma caixa de biscoitos com formato de animais para Sofia, mas já sei que vou sair daqui de mãos vazias. Preciso estar na aula idiota de contabilidade em quinze minutos. A água da tempestade lá fora pinga da minha trança prática e cai no piso de linóleo fosco; uma poça minúscula se forma ao redor de meus pés.

-Oi Camila- Do nada, como sempre, sou surpreendida. Ela está tampando com cuidado o copo de plástico, mas ninguém jamais se aproximou de Lauren Jauregui sem ser notado, e, quando ela se vira para me olhar, não se mostra nem um pouco surpresa. O cabelo esta quase na cintura.

-Oi, Lauren- digo, e minha mente se enche de ruídos como o de ondas e rugidos. Passo o indicador pelo chaveiro e aperto; o metal frio belisca a pele da palma da minha mão enquanto me ocorre como é injusto que, depois de todo esse tempo sabe Deus onde, ela apareça bronzeada e alegre e me veja parecendo um lixo. Não estou maquiada. Meus jeans tem buracos enormes nos dois joelhos. Estou pelo menos cinco quilos mais gorda do que a ultima vez que nos vimos, mas, antes que eu me sinta devidamente humilhada, Lauren já passou pelos salgadinhos de milho e pela carne seca e esta me abraçando apertado. Como se fosse algo que fizéssemos muito.

Ela tem o mesmo cheiro, é a primeira coisa que noto, de sabonete e coisas que crescem na terra. Hesito.

-Não sabia- começo, sem ter muita certeza de que ignorância especifica vou confessar: todas, talvez; dezoito anos de verdades universais que todos foram inteligentes o bastante para entender, exceto eu.

-Voltei ontem- diz ela- ainda não fui ao restaurante- Lauren abre um daqueles sorrisos lentos dela, torto, do tipo que venho tentando esquecer desde o sexto ano- acho que talvez eu esteja surpreendendo muita gente.

-Acha mesmo?- disparo antes de conseguir me controlar.

Lauren para de rir.

-Eu...é- responde ela- acho.

-Certo- Não consigo pensar em nada melhor para dizer. Não consigo pensar em nada, e sempre foi assim com Lauren, embora fosse de se esperar que eu já tivesse superado, pelo menos, parte disso a esta altura. Quando costumávamos trabalhar no mesmo turno no Sônia's, eu sempre deixava pratos caírem e esquecia quais pedidos iam para onde, misturando as contas. Uma noite, quando tinha quinze anos e ela estava no bar, uma mulher em uma das mesas pediu um Sex on the Beach, e levei tanto tempo até criar coragem para dizer as palavras a Lauren que ela reclamou com meu pai do serviço lento e precisei limpar a cozinha depois que fechamos.

-Minha mãe me contou- diz Lauren agora, deixando a voz sumir e tentando de novo- sobre...

Penso em deixa-la ali, reticente, pendurada, mas no fim sou eu quem cede primeiro.

-Sofia- preencho o silencio, imaginando o que mais a mãe dela contou. Não consigo parar de encara-la- O nome dela é Sofia.

-É. Quero dizer- Lauren parece desconfortável, como se esperasse, talvez: Bem-Vinda de volta, como foi a viagem, tivemos um bebe, mas mantenho o maxilar bem travado. Deixe que ela pondere dessa vez, penso com malícia. Deixe que ela sue pela resposta, para variar. A raspadinha é verde-fluorescente, como um alienígena espacial. Minha trança deixou uma mancha úmida na camiseta. Lauren muda de posição, desconfortável- Ela contou.

Ficamos de pé ali. Respiramos. Consigo ouvir os murmúrios e o tagarelar do mercado ao nosso redor, tudo frio e iluminado pelos refrigeradores. Há uma enorme e chamativo pôster de pretzels acima do ombro esquerdo dela. Imaginei isso de outra forma.

-Bem- digo depois de um minuto, tentando parecer casual, mais errando por muito, como a distancia entre aqui e o outro lado do mundo- foi legal encontrar você. É melhor eu pegar o que vim comprar, ou, tipo...- Paro, tiro uma mecha de cabelo rebelde da testa, olho para as lâmpadas fluorescente que zumbem no teto- Lauren, preciso mesmo ir.

O maxilar dela se contrai infimamente, o tipo de coisa que alguém não perceberia a não ser que tivesse passado a adolescência inteira olhando para o maxilar dela.

-Camila...

-Ah, amiga, por favor, não...- Não quero facilitar para ela. Não sou obrigada. Afinal, foi ela quem desapareceu, deu o fora sem nem dizer tchau, até mais tarde, amo você. Foi ela que simplesmente, partiu- Olha, seja lá o que pretende dizer, não se preocupe. Esta tudo bem, certo?

-Não, não esta- Lauren me olha e me lembro com tanta clareza de como ela era quando tinha oito anos, quando tinha onze, quando tinha dezessete. Lauren e eu só ficamos juntas por alguns meses antes de ela partir, mas ela foi minha paixão por tanto tempo que teria levado meu coração junto, mesmo que jamais tivéssemos sido um casal.

Dou de ombros e olho ao redor para o sorvete, para os mostruários de tabaco mastigável e batatas fritas. Balanço a cabeça.

-Claro que esta.

-Por favor, Camila- Lauren se balança sobre os pés como se eu a tivesse empurrado- não me deixe na mão aqui.

-Não deixar você na mão?- Sai mais alto do que pretendo, e me odeio por mostrar a Lauren que ainda penso nela, que a carrego dentro de mim- todos achavam que você estava morta, jogada em um lugar qualquer, Lauren. Eu achei que você estava morta, jogada em um lugar qualquer. Então, talvez eu não seja a melhor pessoa com quem falar sobre '' deixar na mão ''.

Soa tão antipático e contido que, por um segundo, minha incrível e mágica Lauren parece tão indefesa, tão completamente arrependida, que quase parte meu coração de novo.

-Não faça isso- digo baixinho- não é justo.

-Não estou fazendo nada- diz ela, sacudindo a cabeça, recuperando-se- não estou.

Reviro os olhos.

-Lauren, só...

-Você esta muito bonita, Camila.

E assim, do nada, ela voltou a domar leões; essa coisa toda é tão surreal que quase sorrio.

-Cala a boca- digo, tentando parecer seria.

-O que? Esta mesmo- Como se tivesse algum sexto sentido para quase me desestabilizar, Lauren sorri- nos vemos por ai?

-Você vai estar por ai?

-É- Lauren assente- acho que sim.

-Bem- dou de ombros como se minhas mãos não estivessem trêmulas, como se não tivesse a garganta apertada. Eu tinha acabado de me acostumar com a ausência dela- moro aqui.

-Quero conhecer aquele seu bebe.

-Bem, ela mora aqui também- Estou ciente de que há outras pessoas no corredor, clientes normais de uma loja de conveniência que não passaram por nada forte e inesperado hoje. Um deles me cutuca para que eu saia do caminho até os Cheetos. Do lado de fora, ainda chove canivetes, como se talvez o fim do mundo estivesse chegando. Respiro com máximo de equilíbrio que consigo.

-Tchau, Lauren.

-Até mais, Camila- diz ela, e, se eu não a conhecesse melhor, acharia que era uma promessa.

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Até a próxima!!!

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