Juba ruiva

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Foi ideia de Percy ir ao orfanato. Ou, talvez, ideia de alguém que deu a ideia para ele.

Bom, segundo Percy, seria bom para Annabeth ver crianças que não conseguiam pais, assim como eles não conseguiam filhos. Assim, quem sabe, a esperança e um tanto de alegria surgisse para ela.

Talvez ela tivesse uma ideia genial, como era de seu feitio, para conseguir o que queria.

-Percy, sabe que aqui, provavelmente, vamos encontrar semideuses, não sabe? –Annabeth perguntou, mordendo o lábio quando chegaram na porta de uma casa de abrigo para crianças.

Percy franziu a testa, refletindo sobre o que ela quisera dizer.

-Annabeth, não somos obrigados a levar uma criança só porque viemos aqui – Ele disse, ainda de testa franzida – vamos só olhar como são as coisas.

Annabeth ergueu as sobrancelhas, encarando-o.

-Quem o convenceu a fazer isso? – Ela perguntou convicta de seus pensamentos acerca disso.

Percy tentou esconder um sorrisinho que salientava no canto do lábio.

-Vamos – ele disse depois de um tempo, então segurou sua mão a incentivando a continuar.

A primeira sensação que tiveram ao abrir a porta é que aquele lugar estava tão abarrotado que não caberia mais criança alguma. Nem meia criança, se isso fosse possível.

As instalações não eram de todo horríveis, a pintura que descascava da parede era de uma cor até mesmo meiga, contanto que não tentasse decifrar qual era. Haviam brinquedos quebrados espalhados tanto quanto haviam crianças pequenas.

Percy lembra de ter sentido medo de pisar e quebrar alguma criança. “Fodam-se os brinquedos” ele pensou ao quase pisar em um, afinal, não pisando em uma criança estava bom.

Havia muito poucas crianças com mais de quatro anos ali. Talvez fossem para outro lugar quando cresciam, não era possível que as pessoas adotassem apenas os maiores, ouve-se dizer que é o contrário.

-Di immortales, Percy... – Annabeth sussurrou, visivelmente espantada – Quanta criança sem família...

-Muitas, não é mesmo? – Foi o que Percy conseguiu murmurar sem se desconcentrar de sua missão de não pisar em ninguém.

-Hmmmm! –Um chorinho chegou aos ouvidos e pernas de Annabeth.

Ela olhou para baixo.

Uma juba ruiva estava grudada em suas pernas e em um cobertor azul. Fora aquela juba que emitira o choro, ou melhor, o que estava dentro da juba.

Annabeth abaixou-se, nervosa e sem jeito e pegou a criança. A menininha sardenta tinha olhos tão azuis que deveria ser filha de Zeus, olhos tão intensos que assustara Annabeth.

-Hey, o que há? – Percy perguntou para a menininha, mas ela permaneceu com o dedo na boca e os olhos arregalados de espanto.

Annabeth segurou-a mais perto do peito e a sentiu abraçar seu pescoço.

-Oh, queridos – Uma mulher disse em tom doce – Se vocês pegam um, eles grudam em você que não conseguem mais desgrudar.

O tom da mulher não fora nada gentil. Seu rosto possuía um sorriso brilhante e enigmático que não os convencia, os olhos e cabelos eram negros, o último sendo muito bem penteado e preso em um coque firme na cabeça como se tivesse marcado o lugar com um compasso e usava roupas em tons claros de rosa como se quisesse parecer uma mamãe executiva doce e amorosa.

-Hm – fizera Percy, olhando desconfortável da mulher para Annabeth e a menina.

-Acho que ela só está assustada –Annabeth murmurou, passando as mãos nos cabelos ruivos e cheios da criança.

A mulher riu.

-Prazer, Anastásia – A mulher disse apertando a mão de Percy e a de Annabeth em seguida – sou responsável por todos esses pirralhinhos aqui.

-Annabeth.

-Percy.

A mulher piscou uma vez, seus sorriso não modificara um milímetro desde que surgira. Anastásia estendeu os braços para pegar a criança.

-Vamos, Scarlett –Ela chamou – Não se deve agarrar as pessoas, sabe disso.

Anastásia segurou a garotinha, mas, sobre o choro dela, Annabeth a segurou mais firme e a afastou.

-Está tudo bem – a loira afirmou tentando olhar firme para a mulher. Não conseguia entender suas feições.

-Bu! –A criança fizera no ouvido de Annabeth – mau...

A ruivinha não devia ter dois anos, talvez por isso Annabeth sentira necessidade de protegê-la.

-Bem... – Anastásia disse em tom de desaprovação, porém sem modificar seu sorriso enigmático – Vou lhes apresentar o lugar, me acompanhem.

Annabeth não queria acompanhar e sentia que Scarlett, em seu abraço, também não, mas seguiu a mulher a contragosto.

Percy achou o som dos passos de Anastásia familiar e zoado, de modo que seu primeiro pensamento foi fazer uma piada, mas um frio na espinha o contrariou.

-Hm, aonde vamos primeiro? – Percy perguntou, desconfortável.

-Oh, vamos ao lugar onde tudo é feito, queridos – Anastásia disse, o que fez Percy supor ser o escritório dela.

-Nós só viemos ver as crianças, senhora – Annabeth se apressou em dizer.

-Não se preocupem... – ela disse sem parar de sorrir. Caramba, que sorrisinho chato! – Entrem.

Percy e Annabeth – Com Scarlett choramingando nos braços – entraram e imediatamente se arrependeram.

O fedor era horrível. Pensando na coisa mais fedorenta que um nariz pode ter o desprazer de cheirar e multiplicando esse odor por “que coisa horrível!” um milhão de vezes, o resultado sai bastante parecido ao que tinha naquela sala.

Era o cheiro da morte, mas não a Morte com “m” maiúscula, porque Percy já o conhecera e o cara era até cheirosinho.

-É aqui, semideuses, que as coisas acontecem. –Anastásia grunhiu.

Espera... grunhiu?

Opa, sempre que algum ser aparentemente desconhecido reconhece o sangue dos deuses correndo em suas veias, digamos que não é nada bom. Nada mesmo.

O casal se virou, vendo Anastásia, finalmente, com novos olhos através da névoa.

De “Mamãe executiva doce e amorosa”, Anastásia passou a Empousai.

Annabeth suspirou, como se estivesse  realmente muito cansada, então comentou enquanto colocava uma Scarlett assustada no chão em um canto mais afastado:

-Acho que vamos nos atrasar um pouco para o jantar, querido –Annabeth disse antes de puxar sua espada de osso e atacar a empousa com uma expressão feroz no rosto.

-Eu amo essa mulher! – Percy exclamou com um sorriso enorme no rosto,  piscando para Scarlett antes de puxar a caneta do bolso, a  destampar e saltar para a briga ao lado de Annabeth..

LullabyOnde histórias criam vida. Descubra agora