Flores

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Acordei com dor de cabeça  o teto parecia girar , estiquei o braço até o criado mudo servindo me com água . Arrastei me até a pia lavando o rosto , por alguns segundos olhei aquele reflexo cansado do espelho,  não tinha mais o corado das bochechas , o brilho dos olhos da pele e do cabelo , apenas um rosto magro  , pálido ,  opaco , sem expressão como uma boneca de cera empoeirada .
         Desci para o café vagarosamente,  minha família estava toda assentada a mesa como alguns anos atrás. 
- Bom Dia meus amores ! - Disse beijando a testa de Valerie e Dave . - Dormiram bem ? - Perguntei.
- Bom Dia mamãe.  - Dave me abraçou.
- Quero ir para casa . - Reclamou minha filha .
- Você está em casa . - Respondi. - Crianças não são adaptáveis a mudanças . - Resmunguei.
- Talvez o tempo resolva não é mesmo minha querida?  - Sorriu minha mãe acariciando Valerie. 
- Gosto de Hale , há amigos para brincar!  - Dave era compreensível. 
- Verdade ? Fico feliz por isso meu filho . - Comentei enquanto servia um pouco de suco para mim .
- Na sua antiga casa não havia crianças nas redondezas para brincar? - Lisa perguntou , e eu encarei Dave .
- Não.  - Ele foi monossilábico. 
- Eu e meu marido  éramos preocupados com a educação de ambos e seletivos , achamos apropriado educa los afastados de qualquer influência que venha prejudicar a moral deles . Foram e serão educados para servir como base e pilar um do outro... Vai saber se ficam órfãos , precisam se virar . - Expliquei.
- Curioso querida , mas precisam de uma criação para o mundo convivendo com outras pessoas e não isolados.  - Meu pai parecia não entender.
- Claro , claro que estamos os criando para o mundo . A nossa maneira . - Eu ri , encarando meus bebês.
       Depois do café , sair para tomar sol com as crianças no jardim dos fundos , eles corriam enquanto eu tomava uma chá gelado lendo o jornal local. 
      " O EMBAIXADOR STEFAN CORBUSIER ESTÁ DESAPARECIDO "

      Respirei fundo virando a página tomando um gole do chá , comoção social me causava tédio , aquela altura já havia desaguado no mar e virado comida de peixe ou encalhado em qualquer beirada perdida .
    
- Crianças não vão para longe , apenas aqui.  - Gritei para Dave e Valerie que corriam para o bosque , continuei a folhear o jornal entediada. 
      "PROCURA SE VENDEDOR ( A ) PARA A FLORICULTURA MERCEDES"
Tratar com a Sra. Colono até o final da semana. 
         Nunca havia trabalhado na vida , mas seria interessante ocupar a mente com algo e algo que eu gostava,  flores .
- Crianças entrem ! Por hoje chega.  - Gritei novamente. 
        Levantei decidida a ficar com este emprego,  eu mesma iria falar com a proprietária .
          Escolhi um vestido claro e prendi meu cabelo no alto da cabeça em um coque. 

- Lilian onde vai ? - Peter perguntou enquanto organizava papéis na sala de estar .
- Conseguir um emprego talvez . - Sorri .
        A Mercedes não ficava longe da minha casa , eu caminhava com animação em busca de alguma ocupação.  Não sei onde estava com a cabeça mas ...
- Cuidado moça!  - Berrou uma voz entrando em choque com meu corpo. 
- Desculpe.  - Fui dura ajeitando o vestido. 
- Está machucada?  - A voz perguntou. 
- Não . - Respondi. 
- Posso acompanhar você?  - Era insistente . Olhei para cima e um homem alto de pele bronzeada ,  sorriso radiante e cabelos claros olhava pra mim .
- Obrigada mas não precisa . - Dispensei. 
- Me chamo Jack ! E a senhorita?  - Seu tom era sereno.
- Lilian . - Fui fria .
- Prazer Lilian!  - Jack era simpático. 
- Olha me desculpe mas estou indisposta para conversas , atrasada demais ! - Falei sem hesitação , saindo das vistas daquele estranho .
        Lucius havia plantando em mim medo de estranhos , medo era um sentimento comum , me plantou muitas coisas , muitos sentimentos como se eu fosse um barro fresco e suas mãos me moldassem a seu gosto . Admito minha fraqueza em relação aquele homem , mas ao mesmo tempo não poderia culpa lo por aquilo que me tornei , nunca fui obrigada a nada , influenciada talvez ,  Lucius nunca me impôs nada mas me despertou um sentimento de necessidade que me obrigava a ter atitudes horrorosas. 
     Respirei fundo e entrei na floricultura modesta , uma senhora de cabelos grisalhos , roliça e enrugada estava atrás do balcão. 
- Posso ajudar?  - Ela perguntou. 
- Mercedes não é?  - Sorri .
- Sim ! Algo que posso fazer por você menina?  - Ela era doce. 
- Sou Lilian Brandon!  Vi o anúncio no jornal e fiquei bastante interessada!  - Contei .
- Já teve experiência com flores ? - Mercedes Perguntou .
- Sim eu mesma cuidava do meu jardim!  Nunca vendi mas posso aprender.  - Persisti .
- Gosta de flores ? - Ela era curiosa.
- São como amigas!  - Eu ri .
- Ninguém até agora apareceu , pode ficar se for assim então.  - O tom era despreocupado. 
- Verdade ? Nossa é uma honra senhora!  - Sorri animada .
- Das 8 às 4 , pode começar amanhã!  - Avisou .
- Serei excelente florista!  - Disse decidida. 
        Sai da floricultura saltitante,  meus pais gostaram da idéia embora não fosse preciso , mas infelizmente qualquer tipo de felicidade era passageira pra mim era questão de tempo para as lágrimas começarem a brotar na minha solidão , naquela noite meus soluços ecoavam como sussurros de tristeza , limpei as lágrimas e caminhei até o quarto onde Valerie e Dave dormiam tranquilamente me aproximando de Valerie , tocando seu rosto e a cobrindo. 
- Você foi o que me sobrou , meu Lucius pequeno , se soubesse o quanto é amada por seu pai me odiaria para sempre por ter a trazido embora . Eu também te amo . - Sorri sussurrando. - E você meu pequeno homem , você que eu amo como se houvesse saindo do meu ventre  meu filho pródigo , nunca vai me odiar . - Acariciei o rosto claro de Dave .
        Meus dois passarinhos não tinham culpa dos pais que a vida os deu , eu como mãe desejava o melhor que eu e Lucius não poderíamos ser , uma vida normal , uma felicidade plena . Dos poucos pecados que seríamos absorvidos , talvez seria o amor por nossos filhos . Lembrei dos momentos de outono nossa casa quando saíamos para brincar com folhas secas no jardim , ou tomar suco de blueberry no parque quando parecíamos uma família normal .
        Um sorriso até escapou enquanto lembrava de tais momentos felizes que passei nesse tempo todo ao lado de Lucius. 

Em Londres...

       

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