Capítulo 8

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A rainha havia me prometido um momento só para retirar minhas perguntas. Já fazem quatro dias que estou aqui e só a vi no primeiro dia. O povo daqui come peixes estranhos sem cuidado nenhum com limpeza. Consegui arranjar algumas frutas, mas uma dieta à base de frutas não é para mim.

Meus dias se variaram entre ir a praia no nascer e no pôr do sol com Liliane e passar as tardes presa nesse cômodo estranho. Ainda bem que esses dias seguiram-se sem chuva, pois esse "quarto" é parcialmente sem teto. Sinto falta da minha casa, e até mesmo de meu quarto caindo aos pedaços. Acho um pouco engraçado como tem pessoas com medo de lugares fechados e pequenos. Eu amo lugares pequenos... talvez seja o costume.

A lua está já sumindo de um lado do horizonte, então Liliane vem me buscar em poucos instantes para ir à praia. Eu sou totalmente capaz de ir sozinha à praia. Mas "A rainha quer que a senhorita permaneça sempre acompanhada", disse Liliane, não sei quantas vezes após minhas insistentes tentativas de andar sozinha.

Não que eu não goste dela. Sei que é à base de ordens, mas a companhia dela dela me fez bem. Aliás, é a única companhia que tenho desde então. Mas o meu costume de andar sozinha e contemplar o sol nascendo ou se pondo, tornou-se uma atividade só minha. Minha mãe não gosta de ir ao mar, desde o acidente (que descobri que não foi bem um acidente) com meu pai. A companhia de Cristina... comecei à considerar desagradável desde que ela estragou minha vida na escola.

Até o segundo dia, o percurso até a praia era repleto de conversas com Liliane. Mas como ela resiste a me fornecer informações... também faço o possível para omitir minha vida pessoal. Então nossa caminhada é sempre em silêncio. Com certeza ela tem muitas informações sobre as perguntas que faço. Se retirar o momento que passa comigo, ela passa o dia inteiro com a rainha.

Batidas na porta me trazem à disposição realidade. Minhas noites mal dormidas são sempre tomadas por minhas teorias sobre o motivo de estar aqui, ou o que minha família está fazendo neste exato momento. As batidas na porta são desnecessárias, levando em conta o fato de que a porta não fecha, e que maior parte dela nem está mais junta à parede.

Levanto-me já certa de quem é. E literalmente arrasto a porta até que seja liberada a minha passagem. Liliane continua com a mesma aparência de sempre. Eu com certeza estou com a expressão cada vez mais cansada.

Ela chegou um pouco mais tarde que o normal hoje. Está mais claro do que nos outros dias que ela me leva até a praia. A terra úmida e o barulho dos animais está a toda a força hoje. A terra está praticamente como lama, e o som dos animais está desarmonioso e gritante.

O sol nascente já começou a aparecer e os últimos vestígios do luar se vão. O mar calmo me chama a atenção. Queria tanto nadar um pouco, andar na faixa de água rasa. Mas Liliane diz que "é perigoso demais". Do que ela tem tanto medo? Qualquer um que venha a avistar-nos, está fadado a morrer, não o contrário. Diferente dos outros dias, ela está cuidadosa em excesso. Eu diria que ela está inquieta. Já pediu inúmeras vezes para voltarmos, mas o sol mal apareceu.

-Vamos, por favor. - Ela está temerosa, mas por que? Ela não vai me contar o motivo, obviamente. Mas por mais que eu diga mentalmente  que vou dar o troco com à mesma moeda a ela, eu não consigo.

Eu digo à Liliane um "tudo bem" e vamos em direção à floresta, mas um figura em movimento no mar aberto me chama atenção. Liliane agarra meu braço com força, tentando me puxar para a direção da floresta, mas faço o possível para não sair do lugar. Aquela figura em mar aberto está me parecendo algo familiar. Tem velas com certeza... É um barco! Minha chance de voltar para casa está a tão perto. Não tão perto, admito... mas nunca esteve tão perto nos últimos quatro dias. Eles estão vindo em direção à ilha. Com certeza não é para me buscar, porque minha mãe não sabe para onde eu fui. Mas pode se tornar uma comitiva para me buscar. Sorrio com a possibilidade.

Acidentalmente, meu corpo cede aos puxões de Liliane e começo a acompanha-la floresta à dentro.

Entre Sereias - O Medalhão De Ares  [Livro I]Onde histórias criam vida. Descubra agora