Fevereiro começara e eu estava na estrada. Eram dois dias de viagem de Nova Iorque à Califórnia e ainda era o fim do primeiro dia.
Ver meus pais despedindo-se de mim com tanto orgulho que já nem cabia neles – por isso choravam – só me deu mais forças para realizar meu sonho de ser ator.
Às 20 horas, parei em uma pequena lanchonete na frente de um posto de gasolina. Havia muitos casais lá, todos também viajantes. Sentei a uma mesa com dois lugares, mesmo sabendo que ficaria sozinho.
O lugar tinha uma aparência agradável, apesar de não ser uma das lanchonetes mais bonitas. A comida tinha um cheiro tentador, deixando-me cada vez mais faminto. O ambiente era daqueles tradicionais: pisos quadriculados, pretos e brancos, decorações amarelas e vermelhas e uma velha toca discos que ficava ao canto, onde qualquer um poderia trocar a música.
Sempre gostei desses restaurantes estilo anos 50. Lembrava-me minha infância.
As estrelas brilhavam junto à Lua. Ao som de uma cantora brasileira que eu gostava, Elis Regina, admirava a beleza inigualável daquele céu estrelado.
Aneve caia suavemente pela janela no qual estava apoiado, perdi-me em meus próprios pensamentos e, quando me dei conta, estava lembrando de um dos dias em que dormi com Joshua.
Lembranças, inverno de 1973
— Josh, venha dormir, está tarde. — murmurei ainda com sono.
Ele, enquanto vinha em minha direção, disse: — A neve está caindo lá fora. Está tudo tão sereno. É a minha estação favorita, deixe-me aproveitá-la.
— Particularmente, acho o inverno chato. Por que gosta tanto desta estação?
— Porque o frio do inverno é uma ótima desculpa para eu ficar abraçado com você o tempo todo. — disse, fazendo-me corar de vergonha. — Se precisar de mim, estarei na sala, escrevendo. — e, antes de sair, deu-me um fraco beijo na testa, enquanto sussurava "boa noite".
Sou eternamente grato por ter uma pessoa como você. Espero nunca te perder, Josh, pensei, antes de cair no sono novamente.
Fim das lembranças
— "Espero nunca te perder, Josh." — pensei alto, enquanto dava uma fraca e triste risada.
— Perdoe-me. Não entendi. — uma atendente disse confusa, à minha frente.
— Estava perdido em meus pensamentos. Quem deve se desculpar sou eu.
— Tudo bem, deve estar exausto. É normal que sua mente cansada imagine coisas. Deseja pedir algo?
— A coisa mais barata que tiver aqui. Preciso que meu dinheiro dure até amanhã. — respondi rindo.
— Sua comida chegará daqui a pouco.
— Obrigado.
Minutos após minha comida chegar, um jovem entrou na lanchonete. Ele aparentava estar cansado, faminto. Àquela hora, o lugar já estava quase vazio, só havia eu e mais duas pessoas.
Logo pude perceber que o rapaz que entrara há pouco tempo definitivamente não era americano. Sentou-se a uma mesa ao lado da minha e, a todo momento, olhava para mim, deixando-me envergonhado.
Depois de uns três minutos, o atenderam. Ele falava com dificuldade o inglês, fazendo com que não conseguisse realizar seu pedido. Então, perguntei: — Você precisa de ajuda? — ele assentiu com a cabeça e levantei-me para ajudá-lo.
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1975: Trem Azul
Hayran KurguApós tantas perdas, decepções, ninguém é mais o mesmo. Quando Vernon perdeu seu namorado de forma tão trágica, tornou-se totalmente submisso ao medo de apaixonar-se e aquele inverno de terror de 1974 se repetir. Mudando-se para Califórnia no ano se...