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Após subir um lance interminável de escadas, cheguei ao terraço da Torre Baixa. Era como se todos os empregados estivessem ali. Eles pareciam ouvir a explicação de alguém.

Sinceramente, o terraço nem estava tão sujo assim. Assim que abri a portinhola e me juntei ao pessoal, os olhares caíram sobre mim.

– Eu vim no lugar de Nathalie – falei, sem um pingo de insegurança na voz. Já tinha superado o medo de multidão há muito tempo. É um pouco inevitável quando sempre tem uma te observando.

Todos se calaram quando um rapaz alto de olhos bem escuros se aproximou de mim e deu um sorrisinho de canto:

– Ei, Substituta! Eu sou Kales. Eu sou meio quem dá as ordens por aqui. – Ele diz em um tom de brincadeira.

–É um prazer Kales, sou Melissa. – Quase fiz uma reverencia, mas lembrei que não estávamos em uma ocasião formal e eu definitivamente NÃO era uma princesa. – Acho que Acândia não deve ter dito nada mas... Eu meio que não sei limpar.

Eu ouvi uns comentários percorrerem pelas pessoas. Kales ficou levemente constrangido pela mudança de comportamento dos empregados e mandou eles serem mais discretos, o que fez todos calarem a boca.

Kales estavam prestes a abrir a boca novamente, quando alguém veio e cochichou algo na orelha dele. Ele bufou e se voltou para mim:

– Peço perdão, senhorita – desculpou-se. – Mas estou meio ocupado agora. No entanto, te deixarei em boas mãos.– Sorri para ele. Kales se virou para trás e berrou: – Mary Kime, ela é toda sua!

Ele se afastou e agora uma garota com os cabelos incrivelmente azuis estava na minha frente. Me vi olhando os cachos caindo do coque mal feito dela.

Que cabelo lindo!

– Seu cabelo é muito lindo! – E hidratado!

Foi a primeira coisa que me veio na cabeça. Juro que escapou sem querer.

– Obrigada. – Mary Kime sorriu, como se já esperasse o elogio e fez sinal para eu segui-la.

– Quem cuida do seu cabelo? – quis saber.

– Eu. Eu uso um creme que eu criei. Não foi tão difícil de fazer, na verdade.

Em pouco tempo, nós estávamos falando sobre cabelos e maquiagem. Mary Kime é uma ótima adversária para Rennê. Às vezes, entre uma explicação e outra da limpeza, fazíamos algum comentário envolvendo creme, foi uma conversa engraçada.

Eu estava limpando o parapeito do terraço quando Mary me pediu que buscasse um esfregão no armazém da Torre. Desci as escadas até lá embaixo, mas a porta estava trancada. Suspirei e voltei, um pouco impaciente por ter subido as escadas novamente.

Gritei o nome de Mary e fui até ela correndo, mas no caminho acabei escorregando numa parte molhada e caí de bunda no chão. Meu tornozelo doía.

Muita gente me rodeou rapidamente e começaram a fazer perguntas intermináveis que eu não conseguia responder pela velocidade em que se atropelavam.

Foi então que Kales falou para que todos dessem espaço para mim e eles obedeceram. Gosto do ar de liderança que ele esbanja – parece um pouco com o meu.

– Eu estou bem... – falei, finalmente.

– Melhor levá-la até a enfermaria, só para termos certeza. – Mary insistiu. Sorri para ela, agradecendo com uma troca de olhares que estava satisfeita pela preocupação.

Kales me levantou em seu colo e uma exclamação coletiva foi solta. Meu tornozelo formigava. Ele desceu o lance de escadas e seguiu pelos corredores.

Decidi começar uma conversa ali:

– Uau! Você não sente cansaço? Eu não sou tão leve assim.

– Você é bem leve, na verdade. – Ele me balançou nos braços, brincando. – Mas é um pouco cansativo mesmo. Só não mostro que estou cansado perto das senhoritas. – Ele deu uma piscadinha pra mim.

Fiz uma careta.

Vi Allen fazendo sua rota e quando ele me viu no colo de Kales, franziu a sobrancelha, surpreso. Dei um tchauzinho pra ele que sorriu com o gesto. Gostava do sorriso do Allen. Era como se uma explosão de emoções pudessem ser demonstradas com apenas aquele sorriso.

Alguma coisa em mim se agitou quando ele disse para Kales ficar onde estava. Ele andou na nossa direção e falou, com um sorriso: 

– Acho que você está meio ocupado com todas as obrigações do terraço, Kai. Deixe isso comigo, prometo entregá-la em boas mãos. – Ele dizia aquilo como se eu fosse uma carta importantíssima e estivéssemos em um cenário de guerra.

Kales relutou para me entregar ao Allen, mas acabou cedendo. Quando Kales já estava bem longe, me ajeitei no peito de Allen. 

– Estou literalmente passando de mão em mão hoje! – brinquei.

Ele revirou os olhos e riu, ajeitando-me contra seu corpo. 

Minha palma encostou em seu peito, e pude ouvir as batidas fortes de seu coração sob ela.

– Então, o que a senhorita andou fazendo para precisar ser carregada?

– Torci meu tornozelo. – Fiz uma expressão dramática. – É um passatempo dos guardas cuidar de todos os que estão em volta deles?

– Esse é o trabalho deles. – Allen fixou os seus olhos verdes em mim por alguns segundos. – Mas acho que nenhum deles é tão dedicado quanto eu. – Por um instante, pensei que ele estivesse se referindo a qualquer outra coisa. Perdi o fôlego.

Os olhos deles brilharam, ele parecia se divertir com minha expressão.

Minha nossa que olhos lindos!

– Seu tornozelo dói? – perguntou, de modo jovial, como se não tivesse reparado minhas bochechas avermelhadas.

Eu estava tão perdida na expressão dele que quando ele falou aquilo tive de formular o que ele havia dito.

– Um pouco, mas parece mais um formigamento do que uma dor de verdade. Eles queriam me levar até a enfermaria só para conferir.

Me peguei pensando se era o momento adequado para convidar ele para sair, porque parecia ser.

Sem que eu me desse conta, já estávamos na enfermaria e ele me sentava na maca.

– Você quer que eu saia?– quis saber ele.  – Não é como se você tivesse quebrado uma perna ou algo do tipo, mas se precisar de ajuda, eu vou estar lá fora esperando, está bem?

Fiz que sim e agradeci mais uma vez.

Ele estava quase saindo quando lembrei de algo:

– Allen – chamei, sentindo o coração martelar contras as costelas.

Ele voltou e eu fiz sinal para se sentar ao meu lado. Allen me encarou, na expectativa.

Mordi os lábios. Por onde começar? Eu deveria ter treinado isso, né? Resolvi soltar tudo de uma vez:

– Allen, você quer sair comigo amanhã? – Ele parecia surpreso com o pedido.

Refletiu por alguns segundos e apenas fitou meu rosto. Com os olhos bem magnéticos que ele tinha, quase esqueci a minha pergunta. Parecia que aqueles segundos estavam demorando uma eternidade. Logo, ele abriu o famigerado sorriso que fazia meu estomago se enrolar e minhas mãos quererem se enroscar nas deles e disse:

– A que horas eu te pego, Mel?

Realeza OcultaOnde histórias criam vida. Descubra agora