ERA UMA NOITE DE SÁBADO quando ele me encontrou. Iria acontecer em algum momento, eu sabia. De um jeito ou de outro, eu acabaria em uma de suas armadilhas. Eu era a mocinha de um filme de faroeste norte-americano mal roteirizado que acaba amarrada nos trilhos ferroviários. Não havia nenhum herói para me salvar. A colisão com o trem era inevitável. Aquele era meu fim.
Não, não estou falando da Morte. Esse conto, esse ensaio, chame do que quiser, é sobre seu primo distante. É sobre o Amor.
Corra o quanto quiser! Ele também vai te encontrar no final, nos confins do mundo ou na porta de sua casa. Um dia, talvez na próxima semana. Assim que você virar a esquina e trombar com seu crush/@/paquera/Voldemort BUM você estará em uma viagem só de ida dentro do trem dos amores platônicos. Ah, pode ter certeza que ele vai estar do outro lado da rua com um sorriso presunçoso nos lábios.
Eu não sabia o que me aguardava quando mandei a primeira mensagem. Foi uma lenta progressão de sentimentos. Foi como cozinhar rãs, aumentando gradativamente a temperatura para que o animal não perceba. Céus!
Eu era a maldita rã.
Não percebi o momento em que passei a ansiar por aquela notificação de mensagem que sempre fazia meu coração acelerar. Não percebi quando meu rosto passou a corar apenas com uma menção do seu nome. Não percebi quando meus olhos se acostumaram a te procurar em meio a uma multidão. Não percebi quando você se tornou vital para minha vida, uma parcela da minha rotina. Não percebi o quão irremediavelmente eu estava apaixonada.
Pois então, o Amor vai passar por sua casa e, se as luzes estiverem apagadas, atormentará seus sonhos com as fantasias mais mirabolantes. E, assim, com um sussurrar em seus ouvidos, de repente você é a manager da sua banda favorita que tem um relacionamento secreto com seu bias. Você é a princesa de um reino distante atrelada a um casamento arranjado com o cara mais lindo que sua imaginação pode conceber. Você é a nerd que se apaixona pelo popular. Você é a garota inocente que acaba se envolvendo que o bad boy do seu colégio norte americano idealizado.
Seu maldito coração vai guardar todas essas promessas de amor encantado com se fosse seu tesouro mais precioso. Seu cérebro ficará infectado, intoxicado pela ilusão de um amor perfeito.
Você vai achar que o seu relacionamento com aquela pessoa durará para sempre e vocês serão felizes até o infinito e além cantando músicas da Disney.
Você vai achar que o amor é um mar de rosas.
Portanto, aqui vai um lembrete: rosas têm espinhos.
Amar foi como abrir a caixa de Pandora. Foi preciso abri-la para descobrir o misto agridoce de emoções que se escondem por trás da cobertura açucarada com a qual os filmes hollywoodianos decoram o amor. Amar foi uma pitada de esperança, duas colheres cheias de angústia, três xícaras de ansiedade e incerteza a gosto. Foi a porra de uma viagem de montanha russa. Subindo, descendo, subindo de novo, virando de cabeça para baixo, descendo, subindo, subindo...
O Amor vai seguir seu ônibus até o centro e ver quem está rondando por lá. Você vai se misturar a multidão e por um momento vai pensar que ele a perdeu. Ele realmente cometeu um deslize. Ah, mas não se engane. Não é tão fácil de livrar de um sentimento que não se pode controlar. O Amor vai te enganar e você vai pensar que finalmente não terá o risco de ter seu coração quebrado.
Ele vai pegar o arco e a aljava que roubou do cupido e vai vendar os próprios olhos. Afinal, como dizem: o amor é cego. É a pitada de dramaticidade que corre em suas veias e, talvez, ele sinta uma pitada de ciúmes da justiça. Ah, pode ter certeza que ele vai te encontrar no meio da multidão. A flecha perfurará certeira o seu coração e você vai perceber o quão fofo aquele seu amigo/a realmente é quando sorri em sua direção. Vai notar a música em sua risada, ver a poesia em suas palavras. Vai perceber sardas que salpicam seu nariz e o quão adorável fica com o cabelo levemente bagunçado. Porque, às vezes, essas realizações surgem subitamente e, no momento que tentar dizer a si que não está se apaixonando...
O Amor sorrirá triunfante.
O Amor vai entrar arrombando a porta do seu quarto em um dia qualquer e dizer toc, toc antes de te fazer se apaixonar por aquela pessoa no Instagram. Você vai passar dias a stalkeando, vai curtir uma foto de 2016 sem querer e vai querer morrer de vergonha por isso. Porque, às vezes, o Amor pode ser bobo e simples.
O Amor vai te acompanhar até o caixa do supermercado. Um pote de sorvete e chocolate entre os braços e vocês vão passar a tarde inteira vendo filmes de romance clichê. Porque, alguns dias, você só quer alguém para abraçar. Alguém para te dar o casaco quando estiver frio, para segurar a sua mão e te puxar para perto. Ter aquele amor juvenil, mesmo quando estiverem velhos.
Creio que o único arrependimento que eu tenho é não ter te dito que eu amava de volta. Eu estava desnorteada, desorientada, incerta. Aquele sentimento estranho que crescia em meu coração me era estranho, me assustou. Não estava preparada e, sinceramente, acho que ainda não estou. "Ame os outros como ama a ti mesmo", certo? Acho que preciso trabalhar um pouco nisso...
Enfim, o Amor vai andar pelo shopping. Ficar encostado na parede, onde pode ver tudo, e achar por quem você chama. E, quando menos você esperar, estará caindo. Não terá tempo para se agarrar a beirada do mundo. Então, respire fundo – ai vem à queda. Eu sei que é a sua primeira vez aqui, mas logo você vai se acostumar ao movimento; ao mergulho profundo em direção ao fundo. Apenas continue nadando. Você tem apenas uma chance de se apaixonar com seu coração ainda inteiro.
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[CONTOS] histórias engarrafadas
Short StoryUma série qualquer de contos independentes, que assim como o título diz são garrafas lançadas em um oceano feito de tantas outras histórias a serem descobertas no Wattpad. Histórias que esperam serem encontradas e feitas das palavras de um coração e...