(mixtape)

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Ele a encontrou, jogada no fundo da gaveta, ao procurar por uma caneta às pressas para anotar informações do cliente no outro lado do telefone. A velha fita cassete, onde estavam gravadas as músicas que foram trilha sonora das aventuras que vivera com os antigos amigos. Robert congelou e a respiração se tornou entrecortada. Um filme de memórias passou rapidamente em sua mente. A nostalgia lhe invadiu e ele desejou voltar para quando...

"Senhor Hale" a voz grave no telefone invadiu seus devaneios "Está me ouvindo?".

Ele balançou a cabeça, sabendo que ele não veria, e balbuciou algumas palavras de desculpa.

"Não estou me sentindo muito bem" Robert disse "Desculpe".

"Tudo bem. Podemos discutir sobre o assunto quando estiver melhor" o senhor resmungou com sua habitual seriedade, desligando sem esperar resposta.

Soltou um suspiro, deixando o celular de lado, e agarrou a fita entre os dedos da mão esquerda.

As letras cursivas espaçadas de Alessia davam as palavras Wild Things escritas à caneta hidrocor preta na frente, um ar nostálgico das reclamações da garota com a sua caligrafia. E os pequenos desenhos de estrelas, planetas, foguetes, e corações quebrados por todo o material vermelho, feitos por Zippy, recordavam-lhe dos resmungos mal-humorados de Chantel que sempre quisera desenhar com ele, no entanto era um desastre nas aulas de arte.

Pensara que havia perdido a velha recordação anos atrás, quando se mudara para Califórnia, contudo a fita cassete esquecida aparecera, quase como um lembrete do destino. Já fazia seis anos desde que eles se separaram. Sentiu o gosto da saudade no fundo da garganta.

...

As horas se arrastaram preguiçosamente durante o resto do dia. Robert não conseguiu se concentrar no que fazia. Por mais que tentasse, os olhos pareciam sempre voltar para a gaveta sob a mesa ou para o canto da tela do computador onde o relógio digital marcava 16h45min. Ainda lhe restavam alguns minutos e uma pilha de coisas para revisar, então finalmente estaria livre.

Assim que os malditos números sinalizaram 17h, ele deixou sua mesa às pressas, com os papéis soltos nos braços e a fita cassete em uma das mãos, enquanto as chaves fazia barulho por onde passava.

Ofegava quando, por fim, chegara ao elevador. Robert acenou para alguns conhecidos com a cabeça e apoiou-se contra a parede de metal. O ar era abafado e o silêncio denso no pequeno elevador. Ele pôde, então, sentir o coração disparado no peito, e os fios curtos do cabelo grudados na nuca pelo suor. Não se sentia assim desde quando correra juntamente aos amigos pelo estacionamento em carrinhos de supermercado. O fantasma de uma brisa soprou em seu rosto e a fita pareceu queimar em sua mão em reação a lembrança.

O suave ruído arrancou-o dos pensamentos. Havia chegado ao subsolo. As portas de metal logo se abriram, sendo recepcionado pela luz tênue das lâmpadas no teto e o "boa noite" de Jerry, o zelador do prédio.

Ele deslizou para o banco gasto do carro, com um suspiro. Fechou a porta com um baque surdo, girando a chave na ignição, logo em seguida. O motor engasgou-se em protesto, e ele sentiu a estrutura de metal tremer. Se fechasse os olhos poderia ouvir as risadas de Olívia no banco de trás, os berros de Zippy cantando as palavras erradas, as máscaras de animais aos pés de Chantel no banco ao seu lado e as fotos Polaroid espalhadas no colo de Alessia.

Sorriu com a saudade daqueles tempos adormecida no peito e colocou a velha fita cassete no rádio.

Nos primeiros minutos que se passaram tudo o que pôde ouvir fora a estática e o ruidoso som do motor ligado. Fechou os olhos. Eles ainda estavam aprendendo a manusear o velho gravador do pai de Olívia quando gravaram as fitas. Então, o murmúrio das vozes adolescentes aumentou. Lembrava-se da pequena discussão sobre quem falaria. Afinal aquela era uma mensagem para os seus eu do futuro. O barulho aumentou e logo a voz da Alessia de dezoito anos preencheu o pequeno espaço do carro.

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